
Dona Helena chegou ao consultório com os olhos marejados e a alma inquieta. Viúva há dois anos, mãe de três filhos e avó de cinco netos, carregava uma dor antiga, daquelas que parecem nascer antes mesmo de nós. “Eu vim porque não aguento mais esse silêncio entre mim e minha filha. Ela me evita, e eu… não sei mais o que fazer.” A terapeuta escutou com atenção e sugeriu algo que Helena nunca havia considerado: a constelação sistêmica ou, como muitos conhecem: constelação familiar.
A proposta despertou desconfiança. “Mas isso é tipo astrologia?”, perguntou, tentando entender. A terapeuta sorriu e explicou com calma: a constelação familiar, desenvolvida por Bert Hellinger, é uma abordagem terapêutica que parte do princípio de que pertencemos a sistemas—especialmente o familiar—e que muitos conflitos da vida adulta se originam em padrões inconscientes herdados. “A constelação pode ser feita em cima de qualquer tema ou problema. Não precisa ser só sobre família”, esclareceu Karina Arantes, consteladora experiente.
Ao longo da conversa, Dona Helena começou a perceber que o silêncio entre ela e sua filha não era um problema isolado. Ele se conectava ao medo de envelhecer sozinha, à culpa por decisões do passado e até à forma como, na infância, foi ensinada a reprimir sentimentos. Como Karina reforçou, a constelação não se limita à família; ela pode abordar questões relacionadas ao trabalho, dinheiro, saúde, amor—qualquer tema que peça um novo olhar. E que seja uma dor para a pessoa.
Na semana seguinte, ainda hesitante, Helena decidiu experimentar. Descobriu que a constelação poderia ser feita de forma individual, sem a necessidade de um grupo. “Eu achava que seria tipo uma roda, com todo mundo vendo minha vida”, comentou. A terapeuta explicou que, embora existam dinâmicas coletivas, também é possível constelar individualmente, utilizando recursos terapêuticos como bonecos, âncoras no chão e imagens mentais. A essência é a mesma: dar forma ao que está oculto.
Foi um processo intenso. Em um momento da sessão, seu pai ausente foi representado por um dos elementos na sala. Helena chorou ao dizer “sinto sua falta” para um objeto inanimado que, naquele instante, parecia ganhar vida. Sua filha também foi simbolizada. E ali as emoções puderam finalmente emergir.
Observando casos como esse, terapeuta Karina Arantes reforça: “A constelação pode ser feita em cima de qualquer tema ou problema.” O tema de Helena era o silêncio. O problema, talvez, fosse nunca ter se sentido vista.
Ao sair, os olhos inchados contrastavam com um peito mais leve. “Eu nunca tinha pensado que minhas dores vinham de tão longe”, admitiu. “Acho que agora consigo conversar com minha filha.” A constelação sistêmica não é uma solução mágica, mas um convite para enxergar padrões invisíveis e ressignificar histórias antes congeladas no tempo.
Dona Helena voltou outras vezes. Constelou seu medo de envelhecer, a culpa por não ter terminado os estudos e até dificuldades financeiras que pareciam inexplicáveis. A cada sessão, os nós foram se desfazendo, não de uma só vez, mas aos poucos, permitindo que sua alma reaprendesse a respirar.
Porque, no fundo, constelar é isso: alinhar os fios invisíveis da vida para que o tecido da existência volte a fazer sentido. Como Karina bem diz, “a constelação pode ser feita em cima de qualquer tema ou problema.”
Afinal, tudo pode ser sobre amor—mesmo quando ele se esconde atrás da dor.
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