Gisela Monteiro
Freud já alertava para comportamentos bizarros devido ao comprometimento da capacidade crítica
As manifestações de grupos bolsonaristas raiz que estamos assistindo nos últimos dias são assustadoras e constrangedoras. As pessoas se recusam a assimilar a realidade da derrota nas urnas. Como protesto, há gente marchando, rezando ajoelhada no chão para um pneu, comemorando mentiras plantadas, como a prisão do Xandão, sempre debaixo de chuva e enroladas na bandeira do Brasil.
A pior cena é a de um grupo cantando o hino nacional fazendo saudação nazista. Além de criminosa, provoca náusea e asco. Parece ter saído de um filme do grupo inglês Monty Python, que faz críticas sociais geniais de forma sarcástica com estética grotesca.
O que choca é que esses grupos são compostos por pessoas de todos os matizes sociais, muitos com formação acadêmica universitária. Não se trata, portanto, de incapacidade crítica.
O que explica esses comportamentos? Freud, em seu texto “Psicologia das Massas e Análise do Eu”, de 1921, aponta para o fenômeno da massa que se manifesta de forma regredida e infantilizada por efeito de um contágio emocional. Em nome de um ideal ou princípio comum, as pessoas se identificam criando um forte laço que as fazem obedecer a sugestões sejam quais forem, pelo comprometimento da capacidade crítica.
Sozinhas, muito provavelmente não se colocariam na frente de caminhões ou fariam “Heil Hitler!”. Na massa, essas bizarrices são praticadas porque o grupo as autoriza através da sensação de pertencimento e perda da responsabilidade individual.
Outro aspecto são os algoritmos das redes sociais que vão isolando e restringindo àquelas informações passadas nos grupos ideológicos, disseminando as mentiras convenientes e não as verdades indesejáveis. O resultado é o uso de argumentos estapafúrdios, como o risco da volta do comunismo e o pedido de intervenção militar e preservação da liberdade, ao mesmo tempo.
Isso tudo vem sendo alimentado há anos por um governo armamentista, negacionista, preconceituoso e isolado internacionalmente. Grande parte dos brasileiros e o mundo estão vibrando com o resultado da eleição. O dólar caiu e a bolsa subiu. Voltamos a respirar um pouco aliviados, não totalmente. Há um longo caminho a percorrer.
Os grupos sociais devem conversar e não se matar. A fúria e o ressentimento não produzem espaço para argumentos. Os bolsonaristas raiz representam no máximo 1% dos que votaram no Bolsonaro. Os demais estão com os pés na realidade, vivendo a dor natural da perda. Aos vencedores cabe respeitar o tempo do luto e tentar o diálogo.
Para finalizar, um pedido a quem tem filhos. Expliquem o que foi o nazismo e não os deixem pensar que exterminar o adversário é uma possibilidade. Além de ser inaceitável, dá cadeia!
* Gisela Monteiro é doutora em Psicologia Social, coordenadora do curso de Psicologia da Universidade Santa Cecília (Unisanta)
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