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Cotas raciais são racistas e deveriam ser extintas esse ano

20/01/2022
Cotas raciais são racistas e deveriam ser extintas esse ano | Jornal da Orla

Fernando Holiday

Sou negro e sou contra as cotas raciais. Acredito no sucesso alcançado pelas próprias forças como a melhor fórmula de se combater o racismo

Esse ano, de 2022, o Congresso Nacional revisará as cotas raciais no Brasil, especialmente aquelas destinadas para as vagas nas universidades federais. Nesse sistema uma parte das vagas disputadas no Enem são reservadas para alunos negros que concorrerão entre si, como uma forma de incluir a população negra em locais de destaque do meio acadêmico. A ideia parece ótima à primeira vista, seria uma maneira de tentar recompensar todo o estrago que a escravidão causou aos negros, cujos prejuízos têm grandes reflexos até hoje através do racismo tão presente em nossa sociedade.

Contudo, o sistema de cotas raciais é uma grande ilusão e, pior, institui um método racista de selecionar alunos para as universidades. Além de racista, institui um método absolutamente cruel que julga as pessoas pela cor de sua pele e não pela sua capacidade ou caráter.

O grande problema desse sistema é que precisamos definir quem é negro e quem não é, caso contrário, teremos inúmeras fraudes como já ocorreu de alunos se bronzeando ou se maquiando para se passarem por cotistas negros. E para resolver esse problema, as universidades criaram verdadeiros tribunais raciais. Os alunos selecionados por meio do sistema são colocados diante de uma banca de avaliadores que, com base na sua aparência, dirá se aquele cidadão ou cidadã é realmente daquela cor. Entretanto, a avaliação é altamente subjetiva, especialmente quando se trata de pardos, a avaliação sobre a cor é uma questão de opinião. Tanto é verdade que quando a UnB (Universidade de Brasília) instituiu as cotas raciais ficou famosa a capa da revista Veja que trazia dois irmãos gêmeos de mesma cor: um aceito pelo sistema de cota racial e o outro rejeitado.

Sendo assim, em 2016, o Instituto Federal do Pará teve “uma grande ideia” para solucionar essa subjetividade da avaliação da aparência: colocaram em um edital as “características típicas de uma pessoa negra”. Foi um terror. O edital falava do tamanho e formato de nariz adequado, qual deveria ser a textura do cabelo ou a grossura ideal dos lábios, além do tamanho do crânio. Não parecia um edital, mas sim um catálogo de venda de escravos disponíveis aos seus potenciais compradores. Isso chocou a muitos e o Instituto voltou atrás, mas aquilo nada mais era do que colocar no papel o que acontece no Brasil desde que as cotas raciais se tornaram políticas públicas. É a transformação do negro em objeto ou animal sob o pretexto de incluir ou realizar políticas sociais.

É evidente que precisamos incluir mais pessoas negras em locais de destaque e as cotas raciais fizeram isso, não há como negar. Mas podemos nos questionar se essa é a melhor forma de inclusão. O ideal seria que nós, negros, tivéssemos uma educação de qualidade, capacitação profissional e condições de alcançar o sucesso pelos próprios méritos, essa seria a melhor receita contra o racismo e a exclusão. Entretanto, enquanto isso não acontece, o mais recomendável é que excluíssemos as cotas raciais e ampliássemos o sistema de cotas sociais.

Com as cotas sociais temos um critério objetivo: a renda da família e local onde o aluno estudou e se formou no ensino básico. Dessa forma, conseguiríamos incluir com muito mais qualidade os alunos negros, pois a maioria que se encontra nessas condições, segundo o IBGE, faz parte da população negra. Mas por meio das cotas sociais essa inclusão não se dá por meio do julgamento da aparência ou da divisão da nossa população em cores. Além disso, as cotas sociais, quando usam como critério a renda familiar e o estudo em escola pública, ela denúncia o verdadeiro problema que é a falta de qualidade no ensino público obrigando os governantes a enxergarem o fracasso de suas políticas educacionais todos os dias. E a falta dessa qualidade atinge igual mente os pobres, sejam eles negros ou brancos.

Sou negro e sou contras as cotas raciais. Acredito no sucesso alcançado pelas próprias forças como a melhor fórmula de se combater o racismo e suas consequências tão nefastas. Mas também sei que para isso é preciso o mínimo de condições e essas condições não se encontram em um sistema que nos marca como gados e nos julga por aquilo que aparentamos ser.

Fernando Holiday é vereador em São Paulo (Novo)

 

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