Saúde

Comer muita pipoca de micro-ondas pode causar Alzheimer, mostra estudo da USP

04/04/2022
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Presente na casa de milhões de pessoas em todo mundo, a pipoca de micro-ondas é um dos mais lembrados na hora de assistir séries e filmes. No entanto, o que talvez nem todos saibam, é que seu consumo em excesso pode gerar graves problemas para a saúde. Em estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Química de São Carlos, da USP, os cientistas identificaram moléculas associadas ao Alzheimer no cérebro de ratos que consumiram durante 90 dias seguidos o diacetil, composto responsável por dar o aroma e o gosto amanteigado à pipoca de micro-ondas. O resultado da pesquisa reforça a tese de que o consumo regular e em altas concentrações da substância pode gerar danos cerebrais.

“Nós observamos que realmente existe essa tendência do diacetil causar danos ao cérebro. De 48 proteínas cerebrais que avaliamos após a exposição dos animais ao produto, 46 sofreram algum tipo de desregulação ou modificação em sua estrutura por conta do consumo prolongado do composto. Durante as análises, nós identificamos o aumento da concentração de proteínas beta-amiloides, que normalmente são encontradas em pacientes com Alzheimer. Além disso, outras alterações proteicas verificadas no cérebro dos ratos também podem estar relacionadas ao surgimento de demência e câncer”, explica Lucas Ximenes, doutorando do IQSC e autor da pesquisa.

Segundo o cientista, o diacetil afetou tanto os cérebros de ratos machos como os de fêmeas, sendo que algumas regiões do órgão foram mais comprometidas, como o hipotálamo. “Até então, não se sabia exatamente quais os possíveis efeitos e modificações que o composto poderia gerar no cérebro de organismos vivos, existem poucos estudos nesse sentido, ainda é um universo pouco explorado. Além disso, alguns trabalhos utilizam quantidades absurdas do composto, até 50 vezes maiores que a nossa, o que facilita o aparecimento de problemas. O que nós fizemos foi utilizar concentrações de diacetil mais próximas do que seria um consumo diário normal”, revela Lucas, que é orientado pelo professor Emanuel Carrilho.

Os cérebros dos ratos foram avaliados com a ajuda de dois equipamentos. Um deles, chamado espectrômetro de massas, faz a leitura e gera mapas de calor dos órgãos, formando uma espécie de impressão digital dos cérebros. Com isso, é possível observar como e em quais regiões certas proteínas e o diacetil estão distribuídos. Em uma segunda etapa, outro aparelho, chamado cromatógrafo, ajuda a determinar se essas proteínas sofreram alterações, como o aumento de sua concentração ou alguma mudança estrutural preocupante. Os testes foram realizados com um total de 12 ratos, sendo que metade foi o grupo controle (que tomou placebo) e a outra metade ingeriu o diacetil.

Amplamente empregado nos mais variados ramos da indústria, o diacetil ganhou destaque no setor alimentício, principalmente por seu uso como conservante e flavorizante (substância que confere sabor e aroma). Podendo ser encontrado naturalmente na composição de cafés, cervejas, chocolates, leites e iogurtes, o diacetil é utilizado na pipoca de micro-ondas como um aditivo, em concentrações maiores. Apesar de seu consumo ser aprovado pelas agências reguladoras, a exposição prolongada ao produto pode ser prejudicial à saúde e, por estar presente no cotidiano da população, diferentes estudos buscam compreender a influência do composto em organismos vivos e como ele pode alterar funções biológicas.

Segundo Lucas, algumas pesquisas já demonstraram que o diacetil é capaz de causar problemas pulmonares, como a bronquite obliterante. A enfermidade, inclusive, ganhou o nome de “doença da pipoca de micro-ondas” e, se não for tratada, pode até levar à morte. “Sua causa foi relacionada justamente a essa alta exposição ao diacetil. Ela surgiu após alguns pesquisadores acompanharem idosos que viviam comendo pipoca de micro-ondas e acabaram desenvolvendo a doença por conta do consumo em excesso”, conta o cientista da USP.

Nos próximos passos do estudo, os pesquisadores pretendem realizar novos testes com um número maior de animais, visando ampliar o entendimento a respeito dos resultados obtidos até o momento.

“A principal mensagem que nosso trabalho deixa é que precisamos tomar cuidado e nos preocupar cada vez mais com a qualidade da nossa alimentação. Claro que comer esporadicamente certos alimentos não tem problema, mas alguns prazeres em excesso podem fazer mal. Além disso, outro grande foco de nosso trabalho é fazer um alerta para o pessoal que trabalha nas fábricas de pipoca. Por mais que a gente coma o produto, nós temos muito menos contato com o diacetil do que os trabalhadores que lidam ou até inalam diariamente o composto”, finaliza o doutorando.

O estudo contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).