Dores e distensão abdominal, diarreia, inchaço, náuseas e vômitos podem sinalizar intolerância à lactose, que é uma deficiência ou redução da enzima lactase, produzida no intestino delgado e responsável por digerir a lactose, que é o açúcar do leite e derivados. Segundo o médico nutrólogo Marcio Marques Amaral, o problema, que atinge cada vez mais pessoas, impõe limitações na alimentação e, quando a dieta não é seguida à risca, os sintomas aparecem.
Entre os pacientes, a quantidade dessa enzima pode variar. “Em alguns casos, ela é completamente nula, o que resulta em diversos graus de intolerância. Quanto menos lactase for sintetizada, mais intensos serão os sintomas frente ao consumo do açúcar do leite”, alerta o médico, acrescentando que as causas variam de acordo com o tipo de intolerância, que pode ser:
Primária – durante a infância, o corpo produz muita enzima lactase, pois o leite é a fonte primária de nutrição após o nascimento. Geralmente, o organismo tende a diminuir a quantidade de lactase produzida conforme a pessoa vai envelhecendo e sua dieta se diversificando, com o acréscimo de novos tipos de alimentos. Esse declínio na produção de lactase, pode levar a um quadro de intolerância à lactose.
Secundária – pode resultar em várias condições gastrointestinais, que geram danos à superfície de absorção do intestino delgado, incluindo doença celíaca (intolerância ao glúten), doença de Crohn (inflamação no aparelho digestivo), supercrescimento bacteriano do intestino delgado, infecções intestinais e enterite por radiação/quimioterapia.
Congênita – é a que o bebê já nasce com intolerância à lactose por causa da deficiência total de lactase no organismo. Essa condição é conhecida como herança autossômica recessiva e é passada de geração para geração. Isso significa que tanto o pai quanto a mãe precisam transmitir o gene da intolerância à lactose para o filho para que ele apresente o problema.
Conforme o nutrólogo Marcio Amaral, a diarreia é um dos sintomas mais comuns na intolerância à lactose. A explicação detalhada é a seguinte: “Devido à deficiência na enzima que digere esse açúcar, ele não é quebrado em glicose e galactose, como deveria ocorrer normalmente, e chega intacto no intestino. Nesse órgão, as diversas bactérias que compõem a flora intestinal fermentam a lactose, transformando-a em ácido lático, que agride as paredes internas do intestino e, como uma reação fisiológica, o corpo induz à diarreia para eliminar mais rapidamente as substâncias que estão fazendo mal ao organismo”.
Além disso, o médico explica que a lactose é uma substância osmótica, ou seja, ela atrai água e contribui para a formação das fezes amolecidas. Esses sintomas gastrointestinais são desencadeados de 30 minutos a duas horas após o intolerante consumir alimentos ou bebidas que contenham lactose.
Entre os fatores de risco estão:
Idade – conforme os anos vão passando, a chance de desenvolver o problema aumenta.
Etnia – é mais comum em negros, asiáticos, hispânicos e indígenas.
Nascimento prematuro – bebês que nascem antes da hora possuem menos lactase no organismo, já que a produção desta enzima aumenta somente no final do terceiro trimestre da gravidez.
Patologias – algumas doenças que afetam o intestino delgado podem alterar a produção da enzima lactase, levando à intolerância à lactose, como a doença de Crohn.
O diagnóstico é feito após um teste clínico, ou seja, retirando todos os alimentos com lactose da dieta e constatando que os sintomas desaparecem em dias ou semanas, ou por meio do teste de tolerância à lactose. “Nesse caso, são feitas coletas de amostras de sangue após a ingestão de uma carga de 50 gramas de lactose. A digestão da lactose determina a elevação da glicose no sangue. Já ausência de tal aumento indica falha na absorção da lactose”, explica o especialista.
Um aumento da glicose sanguínea de pelo menos 20mg/dl a partir dos valores basais indica digestão adequada da lactose e absorção dos monossacarídeos individualmente. Nos pacientes com deficiência de lactase, a glicose permanece inalterada ou até diminui, o que indica que o açúcar não foi digerido.
Também existe o teste respiratório de hidrogênio, que é um método simples e não invasivo de avaliação da má absorção de lactose. “Administra-se 25 gramas de lactose, seguido da medição da excreção de hidrogênio na respiração por 3 a 4 horas. “O resultado é positivo para a má digestão quando a excreção de hidrogênio na respiração excede 20 partes por milhão, resultante da fermentação bacteriana intraluminal de lactose não absorvida e não digerida. Desta forma, associando os sintomas de intolerância à lac tose com a análise laboratorial, o médico pode fechar um diagnóstico e orientar o paciente quanto à dieta e os cuidados necessários para conviver com esse problema.
Quando se suspeita de intolerância primária ou congênita à lactose é possível avaliação genética para detectar a presença de mutações que proporcionam a característica de persistência da produção de lactase e tolerância à lactose. O tratamento consiste na redução da ingestão da substância presente em laticínios. Ela pode ser controlada com uma dieta orientada por um médico ou nutricionista.
Quanto ao leite sem lactose, disponível atualmente nas gôndolas de supermercado, é importante destacar que a lactose não é retirada do leite. “O que acontece é que a indústria adiciona uma enzima denominada lactase (ou beta-D-galactosidase), que, em três ou quatro horas, quebra a lactose apor meio da ação da solução em dois componentes: glicose e galactose”.
O médico Marcio Amaral destaca que existem outras formas de realizar esse processo, porém, a adição da lactase ainda é o método mais viável e barato. “Essa tecnologia não modifica nenhuma propriedade ou composição do leite, exceto a lactose. O produto mantém o mesmo valor calórico, fornecimento de nutrientes, aminoácidos e vitaminas essenciais, não sendo prejudicial à saúde. Contudo, por se tratar de um processo de produção mais caro, o preço final do produto torna-se mais alto”.
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