“Temos muito pouco tempo!”. A frase sai quase como um suspiro enquanto ele vê a imensidão azul à sua volta. “Precisamos aproveitar momentos preciosos como esse. E fazer a nossa parte, para que cada um dos que virão possam conhecer isso também”, completa.
Cantor e compositor consagrado por fãs das mais diversas idades e admirado por outros músicos, Lenine esteve esta semana na região para conhecer projetos de preservação ambiental patrocinados pela Petrobras e também fez uma visita ao Parque Estadual da Laje de Santos, um santuário localizado a cerca de 40 quilômetros da costa que abriga centenas de espécies marinhas e dezenas de aves. Pela quantidade e variedade de animais e boa visibilidade, é um dos melhores lugares do Brasil para a prática de mergulho.
Entusiasmo- Antes de embarcar na viagem de 1h30 à Laje, Lenine acompanhou a apresentação de 9 projetos ambientais. Entre eles, o que busca proteger albatrozes, o de defesa da arraias-mantas e até mesmo o que defende o desenvolvimento sustentável do palmito juçara.
Lenine diz que fica admirado com o entusiasmo de cada um dos envolvidos nestes projetos. “Acho muito importantes estes encontros. São inspiradores. O que conta é a experiência humana, a divisão de conhecimentos, a troca de sabedorias, o reconhecimento de um no outro. Apesar de áreas de atuação distintas, tudo termina sendo pela melhoria do ser humano”, diz.
O artista disse que se sentia completamente confortável no convívio com os ambientalistas, porque este tema sempre esteve muito presente em sua vida. “Ao longo dos anos, estes temas sempre estiveram presentes nas minhas canções. Eu tenho amigos comuns que, não por acaso, mas por uma conspiração a favor, são do universo socioambiental. Sou amigo de pessoas do Projeto Tamar desde que eu tinha 9 anos. A gente divide o mesmo tipo de conceito de vida. Então, me sinto à vontade dentro deste universo de sociólogos, biólogos, botânicos. E acho que, se eu não estivesse no universo da música, eu estaria envolvido com algum projeto neste sentido”.
Tirando onda- Já na viagem a bordo da lancha, enquanto alguns jornalistas sentiam os efeitos do balançar do mar, Lenine não se intimidou e ficou em pé no deck lateral da embarcação, simulando estar surfando e gritando quase sem parar: “U-hu!!”. Explicou, depois, que era uma maneira de driblar o enjoo. “Quando está embarcado, você não pode ficar parado, e tem que mirar o horizonte, um ponto fixo fora do barco. Senão bota tudo pra fora, mesmo”, ensinou.
No percurso, Lenine ficou impressionado com a quantidade de navios ancorados, esperando para entrar no porto. “Realmente, é uma porta de entrada do país. Por aqui passa tudo”.
Ao chegar à Laje, a lancha deu uma volta completa no costão rochoso, que era sobrevoado por centenas de aves. Um albatroz com uma envergadura de cerca de três metros flana bem em cima da embarcação e fica parado por alguns instantes. “Está nos dando as boas-vindas”, diz Lenine.
Quando o barco chegou a uma das extremidades da laje, o piloto disparou: “Lenine, não é só você que canta, não. As pedras daqui também”, referindo-se ao barulho das ondas batendo nas encostas. O músico completou: “E peidam!”.
Numa primeira vista, a Laje de Santos não impressiona muito: trata-se de um costão rochoso com o formato de uma baleia, com 550 metros de comprimento e 185 de largura, praticamente sem vegetação. O lugar mostra toda sua beleza embaixo da água, onde desfilam milhares de peixes, tartarugas, arraias e outras espécies marinhas. Devido à boa visibilidade, que pode chegar a 30 metros, é um paraíso para os mergulhadores.
Assim que a lancha ancorou, Lenine foi um dos primeiros a lançar-se ao mar para o mergulho. “Não vão rir dos meus pés-de-pato”, avisou, ao exibir as nadadeiras verde-caneta-marca-texto.
Mundo abissal- Após um passeio submarino de aproximadamente meia hora, o músico voltou com a satisfação estampada no rosto. “Esta é minha segunda vez aqui na Laje, mas desta vez vi muito mais peixes. É um espetáculo deslumbrante”, resumiu.
Depois, sentou-se no teto da embarcação, acendeu um charuto e ficou contemplando a paisagem. “A Laje vai ter que me aturar muitas vezes. Eu sou um ser marinho, só não tenho guelra. Eu preciso salgar o corpo temporariamente, molhar o corpo, dar um mergulho. Eu fico feliz de ter uma profissão tão envolvida com o meu prazer”.
Lenine disse que experiências como esta na laje são fundamentais na sua vida. “Na verdade, eu faço um monte de shows e tenho muitos compromissos justamente para arrumar um jeito de conhecer lugares como esse. É fundamental até para fazer o que eu faço. Não só renovar as energias. A música é muito generosa comigo, porque ela me leva a muitos lugares, que eu quero conhecer de todo jeito”.
Entretenimento e educação- Na viagem de volta, Lenine sentou-se na proa, e compartilhou algumas reflexões. Ponderou que ainda falta muito para o brasileiro ter uma consciência ambiental. “Falta educação, mesmo. E isso é uma coisa que nós já sabemos. O que falta mesmo é vontade política, um mutirão mesmo para que isso realmente aconteça de uma maneira que a gente espera. Falta educação de uma maneira geral. Isso passa pela formação, na escola, passa pela formação da cidadania”.
Perguntei se não faltava também o engajamento de outros artistas nas questões ambientais. “Não!”, respondeu, taxativo. “Existem coisas e coisas. O fato de eu me envolver com estas causas é por acreditar que meu trabalho vai além do entretenimento. Mas isso não exclui o entretenimento pelo entretenimento. Acho que todo artista faz sua arte. Agora, sua arte deve ser um reflexo do que ele vive. Neste sentido, eu me sinto um cronista, um repórter. Aí sim, eu faço mesmo. Eu uso minha música como ferramenta”.
Instigado, Lenine completou: “existe a música de entretenimento e a música de educação. Eu me considero um professor, um cronista, um repórter. Isso faz parte de mim. Agora, você não pode esperar uma música de educação de uma pessoa que faz cirurgia plástica no nariz ou clareamento nos dentes. No raso, ela sabe que a sua carreira tem um prazo de validade”.
Lenine não vê problema em haver um tipo de música mais despretensioso, apenas de entretenimento. “Eu também gosto. Para dançar, é muito bom. Agora, é uma música com prazo de validade, daqui a pouco passa a moda e todo mundo esquece”.
Na chegada do passeio, já no píer, um gaiato se aproxima do artista e brinca: “Lenine, vou te dar o prazer de sair numa foto comigo”. E ele devolve: “Claro, o prazer é todo seu!”.
MAIS: Veja vídeo e galeria de fotos do passeio.