Sala de Ideias

Bolsonaro não quer se reeleger!

18/01/2022
Carolina Antunes/Presidência da República

Gisela Monteiro

Ele quer ganhar e perder ao mesmo tempo, concorrer e desistir, ser aplaudido e se desmaterializar para não ser preso

O presida não quer se reeleger. Ele já disse, em várias oportunidades, que o cargo é difícil e que não está gostando das cobranças. A labuta é insuportável. Seu histórico como vereador e deputado fala por si. Sua agenda presidencial também. Ele quer se divertir, comer pastel, andar de jet-ski e fazer piada grosseira.

Por isso estamos vendo esse comportamento errático, contraditório, inexplicável dos últimos dias, caso ele quisesse permanecer no palácio do Planalto. Voltou a atacar o STF, a colocar em dúvida sua eleição, aquele bla bla bla de sempre.

A situação econômica do país, com inflação e desemprego altos, a péssima gestão da pandemia, negando vacina para crianças, a devastação ambiental e a pauta retrógrada de costumes entre outras tantas coisas, estão nos levando ladeira abaixo.

Seria natural uma tentativa de virar o jogo, pelo menos aparentar algum esforço nesta direção para viabilizar sua reeleição. Seus ministros e assessores que pedem moderação informam que ele não ouve ninguém, só vomita o que pensa, quase literalmente. Bolsonaro fica entre a cruz e a espada. Não pode assumir que não quer continuar para não trair a confiança dos 25% que seguem fiéis, e nem mostrar algum esforço que possa melhorar seu desempenho nas urnas.

Assim, como ele não pode assumir seus desejos, cria uma série de circunstâncias para não chegar ao primeiro turno, na esperança de que alguma delas funcione e ele escape dos debates e das propostas para um segundo mandato.

Comprometer a própria saúde ao não seguir as recomendações médicas e arrumar confusão com o partido pelo qual é candidato e que acabou de entrar são duas opções possíveis para não entrar no ringue. Já sinalizou que não fica no país caso o Lula ganhe. Certamente não passará a faixa presidencial como seu ídolo americano fez.

Para assumir seus desejos ele teria que reconhecer suas limitações e enfrentar as consequências da sua escolha. Bolsonaro foi eleito por uma conjuntura que lhe foi favorável por eleitores ressentidos e desconectados da realidade política do país. Iludiu-se com os votos obtidos achando que teria apoio incondicional. Cometeu uma série de crimes que foram caracterizados e sofre processos para os quais tem imunidade enquanto estiver com a faixa. Ver o sol nascer quadrado também é uma possibilidade, caso perca a reeleição ou não concorra e perca o foro privilegiado.

As pesquisas têm mostrado um cenário ruim para ele. Há estabilidade nos índices dos candidatos e não existe terceira via. O primeiro colocado é seu inimigo figadal. Se ainda fosse o calça apertada não seria tão dramático, mas perder para o comunista não dá! Ele quer ganhar e perder ao mesmo tempo, concorrer e desistir, ser aplaudido e se desmaterializar para não ser preso. A vida mental é assim, contraditória, complexa e por vezes cindida e delirante.

Gisela Monteiro é doutora em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do curso de Psicologia da Universidade Santa Cecília (Unisanta).

 

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