O último espetáculo circense em Brasília terminou com um final já esperado por todos os brasileiros minimamente informados: O STF mudou o entendimento vigente e, por 6 votos contra 5, decidiu proibir a prisão após a condenação em segunda instância. Cerca de 5 mil condenados (ricos e poderosos) serão libertados nos próximos dias. Como era esperado o ex-presidente Lula da Silva, condenado em três instâncias por corrupção e lavagem de dinheiro, foi o primeiro a ser libertado. Junto com Lula vão ganhar liberdade mais de uma dúzia de bandidos de colarinho branco presos pela Operação Lava Jato por assaltar os cofres públicos, um dos quais condenado a 123 anos de prisão.
A tese que obteve maioria no STF é a de que ninguém pode ser considerado culpado e, portanto, preso sem se esgotarem todos os recursos. Ou seja, com um bom advogado, o bandido rico jamais irá para a cadeia. Isso porque, conforme lembrou o ministro Luís Roberto Barroso, voto vencido, os recursos não terminam nunca – só Lula apresentou mais de 140 -, e um julgamento final pode demorar até 40 anos.
Único no mundo
Com a vergonhosa decisão proferida pelo STF, o Brasil será o único país democrático do mundo onde um criminoso pode esperar até 40 anos antes de ter sua sentença definitiva. Na maioria dos países civilizados, a prisão ocorre já após condenação em primeira instância (como nos EUA), ou, após segunda instância.
No Brasil a prisão após condenação em segunda instância era prática comum até 2009, quando surgiram condenações a partir do escândalo do chamado mensalão. O STF passou a impedir as prisões após condenação em segunda instância. Com isso, muitos ladrões de colarinho branco escaparam do xilindró, mas, em 2016, o STF voltou a admitir prisão após condenação em segunda instância.
A partir da prisão de Lula, de outros políticos importantes e de grandes empresários, o STF começou a receber pressão para mudar seu entendimento. E no dia 7 de novembro de 2019, como já era esperado, por 6 votos a 5, alterou a lei mais uma vez.
Cármen Lúcia e Luís Roberto Barroso, em votos memoráveis, destacaram o mal que a mudança provocará ao país, frisando que apenas os ladrões poderosos serão beneficiados. Em vão. Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que em 2016 defendiam a prisão após segunda instância, mudaram de opinião e garantiram a vitória da impunidade para os poderosos.
Aos brasileiros que acreditam em Deus, resta o consolo de que os canalhas que assaltaram e vão continuar assaltando os cofres públicos, roubando de hospitais e escolas, terão de enfrentar a Justiça Divina. Isso nem Dias Toffoli nem Gilmar Mendes conseguirão impedir…
Decisão pode mudar quadro eleitoral
O contorcionismo realizado por alguns ministros do STF para proibir a prisão após condenação em segunda instância pode ter reflexos nas próximas eleições. Isso porque condenados em segunda instância são considerados “ fichas sujas” e, portanto, não podem participar do processo eleitoral. A lei foi assinada pelo então presidente Lula e está em vigor.
Mas a mudança de entendimento do STF abre brecha para outra questão jurídica: se a Justiça brasileira decidiu que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado (quarta instância), fica evidente que, por analogia, também não pode ser impedido de participar de uma eleição.
Se vale a presunção da inocência para evitar que seja preso é evidente que o mesmo critério terá de ser adotado quando se fala em eleições.
Enfim, ao mudar o entendimento sobre a prisão em segunda instância, apenas três anos após a última discussão sobre o tema, o STF não apenas contribui para restaurar a certeza de que o Brasil é o país da impunidade, mas, também, cria insegurança jurídica e abre brecha para uma nova confusão no campo eleitoral.
Desastre completo.
Foto Gibran Mendes/CUT Paraná