Sala de Ideias

Porque o bolsonarismo-raiz produz comportamentos bizarros

03/11/2022
Porque o bolsonarismo-raiz produz comportamentos bizarros | Jornal da Orla

Gisela Monteiro

Freud já alertava para comportamentos bizarros devido ao comprometimento da capacidade crítica

As manifestações de grupos bolsonaristas raiz que estamos assistindo nos últimos dias são assustadoras e constrangedoras. As pessoas se recusam a assimilar a realidade da derrota nas urnas. Como protesto, há gente marchando, rezando ajoelhada no chão para um pneu, comemorando mentiras plantadas, como a prisão do Xandão, sempre debaixo de chuva e enroladas na bandeira do Brasil.

A pior cena é a de um grupo cantando o hino nacional fazendo saudação nazista. Além de criminosa, provoca náusea e asco. Parece ter saído de um filme do grupo inglês Monty Python, que faz críticas sociais geniais de forma sarcástica com estética grotesca.

Bolsonaristas fazem saudação nazista

O que choca é que esses grupos são compostos por pessoas de todos os matizes sociais, muitos com formação acadêmica universitária. Não se trata, portanto, de incapacidade crítica.

O que explica esses comportamentos? Freud, em seu texto “Psicologia das Massas e Análise do Eu”, de 1921, aponta para o fenômeno da massa que se manifesta de forma regredida e infantilizada por efeito de um contágio emocional. Em nome de um ideal ou princípio comum, as pessoas se identificam criando um forte laço que as fazem obedecer a sugestões sejam quais forem, pelo comprometimento da capacidade crítica.

Sozinhas, muito provavelmente não se colocariam na frente de caminhões ou fariam “Heil Hitler!”. Na massa, essas bizarrices são praticadas porque o grupo as autoriza através da sensação de pertencimento e perda da responsabilidade individual.

Outro aspecto são os algoritmos das redes sociais que vão isolando e restringindo àquelas informações passadas nos grupos ideológicos, disseminando as mentiras convenientes e não as verdades indesejáveis. O resultado é o uso de argumentos estapafúrdios, como o risco da volta do comunismo e o pedido de intervenção militar e preservação da liberdade, ao mesmo tempo.

Isso tudo vem sendo alimentado há anos por um governo armamentista, negacionista, preconceituoso e isolado internacionalmente. Grande parte dos brasileiros e o mundo estão vibrando com o resultado da eleição. O dólar caiu e a bolsa subiu. Voltamos a respirar um pouco aliviados, não totalmente. Há um longo caminho a percorrer.

Os grupos sociais devem conversar e não se matar. A fúria e o ressentimento não produzem espaço para argumentos. Os bolsonaristas raiz representam no máximo 1% dos que votaram no Bolsonaro. Os demais estão com os pés na realidade, vivendo a dor natural da perda. Aos vencedores cabe respeitar o tempo do luto e tentar o diálogo.

Para finalizar, um pedido a quem tem filhos. Expliquem o que foi o nazismo e não os deixem pensar que exterminar o adversário é uma possibilidade. Além de ser inaceitável, dá cadeia!

* Gisela Monteiro é doutora em Psicologia Social, coordenadora do curso de Psicologia da Universidade Santa Cecília (Unisanta)

Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete a linha editorial e ideológica do Jornal da Orla. O jornal não se responsabiliza pelas colunas publicadas neste espaço.