Justiça

Operação fracasso

16/02/2024
Alex Fernades / GOVSP

A palavra fracasso é pesada. Mas ela está claramente subentendida, implícita, na correção feita pelo secretário estadual de Segurança, Guilherme Derrite, no nome da Operação Escudo. Ao instalar o gabinete da Secretaria em Santos, no dia 7/2, ele fez questão de batizar a nova mobilização policial, idêntica em tudo à Escudo do ano passado, de “terceira fase da Operação Verão”.

A correção é muito significativa. No ano passado, “haveria uma Operação Escudo sempre que um policial sofresse um ataque”. Palavras do próprio secretário. Foram 43 fases no Estado. Mas no dia 7, depois da terceira morte de policial militar na Baixada Santista em duas semanas, Derrite fazia questão de rejeitar a palavra Escudo.

A Operação Escudo na Baixada Santista foi acionada depois da morte do policial militar Patrick Reis, em Guarujá, no dia 27 de julho do ano passado e de mais dois atentados a tiros contra policiais, um em Santos e outro também em Guarujá, no início de agosto. Contabilizou 28 mortes e 958 prisões. Também colecionou denúncias de arbitrariedades e execuções.

É importante deixar bem claro que uma ação policial especial é plenamente justificada. É absolutamente inaceitável que policiais se transformem em alvos para as armas de criminosos.

Mas aí se apresenta uma pergunta essencial: qual deve ser o formato da operação? E uma segunda pergunta: a Escudo funcionou?

Se o objetivo era o de inibir atentados a policiais, a resposta é clara: não funcionou. Tanto que seis meses depois mais três policiais foram covardemente assassinados por bandidos na nossa região, um em Cubatão e dois em Santos. Talvez o reconhecimento desse fracasso tenha provocado a rejeição, pelo secretário, do nome Escudo na nova operação.

Se foi um fracasso, cabe então descobrir porque isso aconteceu. E talvez não seja tão difícil.

Em que consistia a Operação Escudo, na definição do secretário Derrite? “Na saturação de tropas especializadas, aumento do efetivo, saturação de área e em paralelo a ação da polícia civil: investigação, identificação, qualificação e pedido de prisão.”

As saturações foram realizadas. O efetivo foi bem aumentado. Igualzinho ao que está sendo realizado na “terceira fase da Operação Verão”, deflagrada depois da morte dos três policiais neste ano e que já contabilizava 22 mortes na sexta-feira, 16/2.

E “a ação da Polícia Civil”? Aqui a falha. Aqui o problema. A Polícia Civil de São Paulo está completamente desarticulada. Lógico que o governo Tarcísio não pode ser responsabilizado por esse desmonte de décadas. Mas já deveria ter percebido e agido.

Se a Operação Escudo realmente naufragou, foi porque não teve a inteligência policial: “investigação, identificação, qualificação e pedido de prisão” acompanhando as ações ostensivas da Polícia Militar.

O Defasômetro do Sindicato dos Delegados de Polícia de Sâo Paulo traduz esse desmonte da Polícia Civil em números. Dos 3463 cargos de delegado existentes, só 2452 estavam ocupados em 31/12 do ano passado. Dos 8912 cargos de escrivão, só 4863. Entre os investigadores, a carência é ainda mais dramática e aguda: dos 11957 previstos só 7669 estão contratados. Faltam mais de 4 mil investigadores para que o quadro esteja completo.

O resultado disso é que a Polícia Civil, com muito sacrifício, mal consegue dar conta do dia a dia das delegacias. Como então “investigar, identificar, qualificar e depois pedir a prisão?”

O secretário Derrite é policial militar. O governador Tarcísio é engenheiro militar. Talvez por isso a ênfase na “saturação das tropas especializadas” na Operação Escudo e na Terceira Fase da Operação Verão.

Talvez o Delegado Osvaldo Nico, secretário-executivo da Segurança Pública, o número 2 da pasta, possa chamar a atenção dos dois para a  importância da recuperação da estrutura da Polícia Civil.

Para “sufocar o crime organizado na Baixada Santista”, como o governador quer e acha que está fazendo, ou pelo menos para evitar as mortes de policiais por bandidos, é urgente reaparelhar a Polícia Civil e assim equilibrar as ações ostensivas com as investigativas.

Ou seja: é preciso menos truculência e mais inteligência.