O mundo de João Ubaldo Ribeiro
De tudo já se fez no mundo. Esta constatação também atravessa a literatura: de uma forma ou de outra, sobre tudo já se escreveu. De fato, o leitor atento perceberá que, invariavelmente, os livros conversam entre si. A grande quimera de todo escritor é produzir um texto com vigor original. Esta pretensão, tão distante para tantos, sempre foi algo natural para João Ubaldo Ribeiro: eis um dos escritores mais originais deste país.
O sorriso do lagarto é um excelente exemplo da potencialidade engenhosa de Ubaldo. A trama se passa na Ilha de Itaparica, cenário no qual convivem o simples povo pesqueiro e a elite dominante cuja vida é uma festa. Entre a vida de trabalho no mar e as extravagâncias da nobreza local, João Pedroso – biólogo de formação e pescador por opção – se envolve com a esposa de um influente político local e se vê envolvido em sérios debates éticos sobre experiências científicas que ameaçam a própria evolução humana.
O que mais impressiona no livro é a habilidade de, no mesmo enredo, conectar uma pluralidade de temas (amor, traição, mistérios, dilemas ético-científicos, colonialismo, corrupção, [anti]patriotismo) sem nunca perder o fio de meada. Lançado em 1989, o livro não perdeu um pingo de atualidade. É genial.
Motivos para ler:
1- Não é a primeira vez que comentamos a obra do baiano João Ubaldo Ribeiro (1941-2014). Dele já abordamos o monumental Viva o povo brasileiro, o sombrio Vila Real e o divertido e aterrorizante Diário do farol. Todos brilhantes. O sorriso do lagarto foi adaptado para a TV, gerando uma minissérie muito elogiada nos anos 1990 – época de ouro das grandes novelas brasileiras;
2- Disse Ubaldo que, ao escrever O sorriso do lagarto, pretendia “fazer um romance sobre o Mal, o Mal genérico, o Mal político, o Mal social. O Mal transparente na atitude de uma grande parte da classe dominante brasileira.” Valeu o esforço. O romance é sobre isso e muito mais;
3– Ler um livro de João Ubaldo Ribeiro é mais do que ler um excelente romance. É um convite a entrar no mundo fantástico de Ubaldo, a mergulhar no caldo de cultura muito próprio desse enorme prosador brasileiro. Experimente.
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