Os dez dias de arrependimento são os santos dos santos do tempo judaico. Eles começam com Rosh Hashaná, o Ano Novo Judaico, e culminam 10 dias depois com o Yom Kipur, nosso Dia da Expiação. Em nenhum outro momento me sinto tão perto de Deus, e suspeito que o mesmo seja verdade para a maioria dos judeus.
Estes dias constituem um drama no tribunal como nenhum outro. O juiz é o próprio Deus, e estamos em julgamento por nossas vidas. Começa em Rosh Hashaná, com o toque do shofar, a chifre do carneiro, anunciando que a corte está em sessão. O Livro da Vida, no qual nosso destino será inscrito, agora está aberto. Como dizemos em oração: “Em Rosh Hashaná está escrito, e em Yom Kipur está selado, quem viverá e quem morrerá”.
Em Yom Kipur, a atmosfera atinge um pico de intensidade em um dia de jejum e oração. Repetidamente confessamos nossos pecados, em litanias alfabéticas inteiras deles, incluindo aqueles que provavelmente não tínhamos tempo nem imaginação para cometer. Nós nos lançamos à mercê da corte, ou seja, do próprio Deus. Escreva-nos, dizemos, no Livro da Vida.
E no final de um dia longo e doloroso, terminamos como começamos 10 dias antes, com o som do chifre do carneiro – desta vez não com lágrimas e medos, mas com uma esperança cautelosa, mas confiante. Admitimos o pior de nós mesmos e sobrevivemos.
Os judeus vieram ver o mundo de uma maneira completamente diferente. O livro de Gênesis abre com Deus fazendo os seres humanos “à sua imagem e semelhança”. Essa frase se tornou tão familiar para nós que esquecemos o quão paradoxal é, pois, para a Bíblia Hebraica, Deus não tem imagem nem semelhança. Como a narrativa rapidamente esclarece, o que os humanos têm em comum com Deus é liberdade e responsabilidade O drama judaico é menos sobre caráter e destino e mais sobre vontade e escolha.
Isso levanta um dilema teológico agudo. Como devemos reconciliar as grandes esperanças de Deus para a humanidade com nosso registro moral gasto e puído? A resposta curta é o perdão.
Deus escreveu perdão no script. Ele sempre nos dá uma segunda chance. Tudo o que temos a fazer é reconhecer nossos erros, pedir desculpas, fazer as pazes e resolver nos comportar melhor, e Deus perdoa. Permite-nos manter simultaneamente as mais altas aspirações morais, enquanto admitimos honestamente nossas falhas morais mais profundas. Esse é o drama dos Iamim Ha Noraim.
O significado não vem dos sistemas de pensamento, mas das histórias, e a história judaica está entre as mais incomuns de todas. Diz-nos que Deus procurou nos tornar Seus parceiros na obra da criação, mas nós o desapontamos repetidamente. No entanto, ele nunca desiste. Ele nos perdoa uma e outra vez. O verdadeiro mistério religioso do judaísmo não é a nossa fé em Deus, mas a fé de Deus em nós.
O judaísmo é o chamado de Deus à responsabilidade humana, para criar um mundo que seja um lar digno para sua presença.
Extraído de um artigo do Rabbi Lord Jonathan Sacks
Gmar Chatimá Tová
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