Fronteiras da Ciência

Desafortunados

02/02/2024
depositphotos

Você passou por mim com simpatia, mas quando viu meus olhos parados, indagou em silêncio porque vagueio pelas ruas.

Talvez por isso apressou o passo e, ainda que eu quisesse chamar, a palavra desfaleceu na boca.

É possível que você suponha que eu desisti do trabalho, no entanto, ainda hoje, bati de porta em porta, em vão…

Muitos disseram que ultrapassei a idade para ganhar o pão, como se a madureza do corpo fosse condenação à inutilidade.

Outros, desconhecendo que vendi minha melhor roupa, para aliviar a esposa enferma, me despediram apressados, crendo que fosse eu um vagabundo sem profissão.

Não sei se você notou quando o guarda me arrancou da frente da vitrine, a gritar palavras duras, como se eu fosse um malfeitor vulgar.

Contudo, acredite, nem me passou pela mente a ideia de furto. Apenas admirava os bolos expostos, recordando os filhinhos a me abraçar com fome, quando retorno à casa.

Talvez tenha observado as pessoas que me endereçavam gracejos, imaginando que eu fosse um bêbado, porque eu tremia, apoiado ao poste.

Afastaram-se todos com manifesto desprezo, mas não tive coragem de explicar que não tomo qualquer alimentação há três dias.

A você, todavia, que me olhou sem medo, ouso rogar apoio e cooperação.

Agradeço a dádiva que me ofereça, em nome do Criador, que dizemos amar, e peço para que me restitua a esperança, a fim de que eu possa honrar com alegria o dom de viver.

Para isso, basta que se aproxime de mim sem asco, para que eu saiba, apesar de todo meu infortúnio, que ainda sou seu irmão.

[com base em psicografia de Chico Xavier e na Red. do Momento Espírita]

Essa é a mensagem de um homem triste, como tantos que vemos perambulando pelas ruas.

É bem verdade que alguns são de fato pessoas que se comprazem na ociosidade.

Todavia, há os desafortunados que, apesar de trabalhar a vida toda, não puderam ajuntar moedas para o sustento próprio e da família e que, chegada a madureza, as dificuldades aumentaram.

É comum observarmos homens e mulheres puxando um carrinho de papéis e outros objetos recicláveis, para prover o próprio sustento, trabalhando com dignidade.

Muitos de nós, no entanto, nos enfadamos com essas criaturas que atrapalham o trânsito com seus carrinhos indesejáveis.

O que não nos damos conta é que, além do peso do carrinho, têm ainda que carregar sobre os ombros o peso da humilhação e do desprezo impostos por uma sociedade indiferente.