O visitante desavisado que descer as curvas das estradas de Santos neste domingo (29) certamente vai se surpreender com as disputas acirradas no segundo turno das eleições municipais de São Vicente e Praia Grande — as duas únicas cidades da Baixada Santista onde os pleitos não foram decididos no primeiro turno.
Em São Vicente, Solange Freitas (PSDB) enfrenta Kayo Amado (Podemos) e em Praia Grande o embate é entre Rachel Chini (PSDB) e Danilo Morgado (PSL). É imprevisível o comportamento dos eleitores que, primeiro turno, escolheram outros candidatos, anularam, votaram em branco ou simplesmente não compareceram às urnas. Mas são eles que vão decidir as eleições.
Adversário inesperado
A percepção geral era de que, no primeiro turno, Solange Freitas e Kayo Amado disputavam para definir quem iria enfrentar o atual prefeito, Pedro Gouvêa (MDB) no segundo turno. Como Gouvêa acabou em terceiro, com 18,86% dos votos válidos, Solange e Kayo passaram alguns dias desorientados, quanto a qual estratégia seguir. Mas a trégua durou pouco: ambos subiram o tom e passaram a trocar farpas — no horário eleitoral gratuito, na internet, nos debates e entrevistas.
Kayo Amado afirma estar mais preparado, pois ficou quatro anos construindo um plano de governo para a cidade, e classifica a adversária como inexperiente, pois nunca teve nenhuma experiência em gestão pública nem disputou outra eleição antes.
Solange contra-ataca, dizendo que o oponente vive fora da realidade, “no fantástico mundo de Bobby”, e as propostas dele são inexequíveis. Também afirma que sua proximidade com o governador João Doria, que é do mesmo partido que ela, vai facilitar investimentos estaduais no município.
A disputa está aberta: a dúvida é como se comportará o eleitor de Pedro Gouvêa, que teve 30.717 votos. Em transmissão ao vivo pela internet, Pedro Gouvêa anunciou que não apoiará nenhum dos dois candidatos — comportamento mais do que previsível, já que havia sofrido duras críticas de Kayo e Solange. “A vontade do povo é soberana, a gente aceita e respeita”, disse. Ele assegurou que a transição será feita com tranquilidade e transparência. No entanto, o atual prefeito não deixou de manifestar que considerou o resultado injusto, pois quando assumiu “a cidade estava de cabeça para baixo”.
Triste destino
O caso de Pedro Gouvêa segue o que vem se tornando regra em São Vicente. O grupo político no governo municipal não consegue permanecer no poder. Em 2012, Caio França (PSB), filho de Márcio França e apoiado pelo então prefeito Tercio Garcia, foi derrotado já no primeiro turno por Luís Cláudio Bili, que teve 51,4% dos votos válidos.
Após uma gestão extremamente tumultuada (as contas dos quatro anos de governo rejeitadas e denúncias que o fizeram parar nas páginas policiais), Bili nem ao menos disputou a reeleição, em 2016.
Ascensão meteórica
Em Praia Grande, a situação é ainda mais delicada e incerta. Apesar de ter sido a mais votada no primeiro turno, Rachel Chini (PSDB), a candidata escolhida pelo atual prefeito, Alberto Mourão, vem perdendo espaço para seu adversário no segundo turno, Danilo Morgado (PSL). Pesquisa divulgada na quarta-feira (25) pelo Instituto Paraná indica um dramático empate técnico, com ligeira vantagem para Danilo: 42,9% a 42,6% — mais 7% de brancos ou nulos e 7,5% de indecisos. Pesquisa do Instituto de Pesquisas A Tribuna (IPAT), divulgada na sexta-feira (27), indica cenário semelhante: 36,8% para Danilo Morgado, 34,8% para Raquel Chini, 18,8% de indecisos e 9,6% de brancos ou nulos.
Morgado teve uma ascensão surpreendente e meteórica, superando candidaturas mais consolidadas como a do ex-prefeito Alexandre Cunha (que terminou em terceiro, com 8,49% dos votos) e a vereadora Janaína Balllaris (que ficou em quarto, com 8,17% dos votos).
Praticamente desconhecido da maior parte do eleitor praiagrandense há poucos meses, ele conseguiu 35,6% dos votos, apenas 4.887 votos a menos que Chini. Evangélico, Danilo Marco Morgado era assessor parlamentar do senador Major Olímpio. O que até agora ninguém entende ao certo é como Morgado conseguiu catalisar toda a insatisfação com o grupo político liderado por Mourão, apesar de haver outras candidaturas de oposição consolidadas como as de Alexandre Cunha (Rep), Janaína Ballaris (PL) e até mesmo Delegado Comin (Pode).
Fadiga de material
O que parece estar acontecendo em Praia Grande é o que os cientistas políticos classificam como “fadiga de material”, termo emprestado da Física: um objeto acaba ficando frágil após muito tempo exposto às intempéries.
Será a terceira vez que o prefeito Alberto Mourão indica uma pessoa com pouca expressão eleitoral para sucedê-lo. Antes, foram Ricardo Yamauti, eleito em 1996, e Roberto Francisco, em 2008. Apesar de sua incontestável liderança local e cinco gestões (1993-1996, 2001-2004, 2005-2008, 2013-2016 e 2017-2020) muito bem avaliadas, cresce na cidade a ideia de que Mourão “não pode fazer o que bem entende” ou, como dizem os adversários, “eleger outro poste”.
Raquel Chini refuta com veemência esta insinuação, argumentando que faz parte de um grupo político que vem promovendo transformações profundas e positivas no município nas últimas décadas. Acrescenta que possui experiência em administração pública, por ter ocupado cargos de extrema importância nos governos municipais, e tem personalidade forte o suficiente para exercer sua marca pessoal à frente da Prefeitura de Praia Grande. Diz que Mourão será “um grande conselheiro”.