Segundo uma das fábulas do grande escritor francês Jean de La Fontaine, um grupo de ratinhos se reuniu para analisar os riscos que estavam vivenciando há muito tempo. Não aguentavam mais as surpresas e os sustos, sempre que um gato que habitava a região aparecia para atacar um dos componentes do grupo. Era uma grande correria, desespero e alívio, quando conseguiam fugir, mas tristeza quando um dos ratinhos da turma era alcançado pelo conhecido gato.
Depois de muitas reuniões, debates e análises, surgiu uma proposta que tinha tudo para dar certo. Um dos ratinhos subiu num lugar de destaque e anunciou seu plano infalível: “Vamos colocar um guizo (um tipo de sino), no pescoço do gato. Assim, sempre que ele estiver se aproximando, vamos escutar e teremos tempo para fugir e nos esconder”.
Imagino que houve uma festa. Aplausos, gritos e pulos, demonstrando que havia uma solução. Tudo estava resolvido, até que outro ratinho perguntou: quem vai colocar o guizo no pescoço do gato? Em resumo: quem vai cumprir a função fundamental para garantir que o plano funcione? O guizo era uma grande solução, porém, se não fosse colocado no pescoço do gato, se transformaria apenas numa grande intenção.
Nesta semana, tomamos conhecimento do resultado de um grande trabalho, empreendido por técnicos e representantes de várias esferas do poder público e da iniciativa privada. Um trabalho que merece elogios, tanto pelos enfoques técnicos quanto pelas efetivas propostas apresentadas.
A imprensa noticiou que representantes do CREA, da Codesp, das prefeituras, do Governo do Estado, dos Bombeiros e de representantes de empresas, durante um bom tempo, se dedicaram à análise dos recentes acidentes que ocorreram nas atividades portuárias de nossa região, na busca de apresentar propostas que busquem evitar e, principalmente, controlar riscos futuros.
Recebi um resumo dos trabalhos, que aponta soluções objetivas que, certamente, podem e devem ser buscadas. Todos sabemos que vivemos numa região com atividades portuárias e industriais que envolvem consequentes riscos, logicamente conhecidos, mas que podem (e devem) ser controlados.
A grande maioria das empresas do segmento portuário e industrial de nossa região atua de forma segura e responsável, demonstrando que os riscos são controláveis. São empresas que investem nas melhores tecnologias, utilizam equipamentos com segurança e cumprem os adequados procedimentos. Estas não precisam de guizos.
Porém, e infelizmente, temos vivenciado problemas em tempos recentes que nos impulsionam para a adoção de procedimentos antecipatórios, e também que objetivem controlar e mitigar as consequências dos possíveis incidentes. Para estas situações, precisamos de guizos. Temos propostas, apresentadas por técnicos e instituições de proeminência reconhecidas. Porém, precisamos garantir que estas medidas sejam efetivamente aplicadas.
Justamente por isso, cabe a pergunta: quem ou qual instituição vai garantir que os planos sejam transformados em ações efetivas? Quem vai conseguir colocar o guizo?
Temos muitas instituições e profissionais compromissados. Porém, precisamos definir quem pode concentrar ou coordenar as ações propostas! Este é mais um momento onde se demonstra a barbaridade que o governo federal praticou ao praticamente extinguir a possibilidade de atuação efetiva do Conselho de Autoridade Portuária (CAP). Certamente, ele seria um grande instrumento para ajudar a colocar este guizo.
Uma coisa, entretanto, precisa ser apontada. A missão de colocar este guizo não é individual. coletiva e a sociedade pode (e deve!) atuar. A sociedade é a única que pode colocar o guizo.