Clara Monforte

Olhos nos olhos com Daniel Filho

04/07/2015
Olhos nos olhos com Daniel Filho | Jornal da Orla
O diretor Daniel Filho está à frente de alguns dos maiores momentos do cinema e da TV no Brasil. Na Rede Globo, dirigiu clássicos da teledramaturgia, como as novelas “Irmãos Coragem”, “Pecado Capital”,”Dancin’ Days” e as séries “Malu Mulher”, “Plantão de Polícia” e “A Vida Como Ela É”. No cinema, assinou 15 filmes, entre eles sucessos como “A Partilha”, “Chico Xavier” e “Se Eu Fosse Você 1 e 2”. Em 2015, voltou à direção na comédia “Sorria – Você Está Sendo Filmado”, um remake de um filme sérvio que fala sobre uma questão para lá de contemporânea: estamos todos sendo observados… o tempo todo! 
 
O filme trata da constante vigilância pelas câmeras e nossas reações diante delas. Qual foi o seu objetivo?
Quando se pensa em um filme, primeiro vem a ideia e depois o tema. Esse tema não pode vir antes da história. Quando se está criando ou dirigindo, você não coloca em primeiro lugar o que gostaria de dizer, mas articula uma história que gostaria de contar e, só depois que o filme já está pronto, é que vê a mensagem que passou. Eu sou contra fazer um texto de situação, crítico ou político, mas é claro que isso acaba acontecendo, porque somos seres humanos políticos, críticos e engraçados.  Eu sabia que este filme tinha a maior parte de sua graça na mudança do comportamento das pessoas ao se descobrirem gravadas.
 
“Sorria…” é um remake de um filme sérvio…
O “Sorria” brasileiro, assim como o original sérvio, é único, mas poderia ser gravado em qualquer parte do mundo e sempre seria uma experiência diferente, pois refletiria a cultura local. Poderia ser feito no Japão, Argentina, etc…
 
Quais as principais diferenças entre o filme brasileiro e o sérvio?
Na hora de adaptar o roteiro, mudaram os principais pontos do filme. O país, a cultura, a língua e a piada. No original, o personagem que dá ensejo à trama é um pianista clássico. Veja você, só aí já é uma diferença enorme! A televisão deles é diferente da nossa, lá é algo mais cultural. Mas os dois filmes trabalham com o mesmo nível de classe social, embora a nossa seja muito mais engraçada. No filme, tem uma discussão que eu gosto entre o síndico, o porteiro e o ajudante do porteiro. Essa condição hierárquica é colocada na lógica do “Você sabe com quem está falando?”, que é algo muito presente na cultura brasileira.
 
Como foi a escolha do elenco? O filme traz grandes estrelas, mas não há exatamente um protagonista…
A escolha do elenco é um longo processo. O primeiro ator que pensei para o filme foi o Lázaro Ramos. Queria ele no papel do porteiro, pois o acho um ótimo comediante. A Susana Vieira também foi um dos primeiros nomes que pensei, ela é fantástica. Já o policial não era o Juliano Cazarré inicialmente. Ele estava escalado para outro papel, o qual ele já tinha até topado, mas na leitura do texto eu percebi que ele seria um ótimo policial. Por acaso, nessa mesma época, eu estava gravando o último episódio de “A Grande Família” e vi que o Lucio Mauro Filho faria um ótimo agente funerário. 
 
Você regularmente visita o humor em seus trabalhos. Como é sua relação com ele? 
O humor realmente é um ponto na minha vida. Eu sou bem-humorado, talvez pela minha criação, pelo circo e Teatro de Revista, mas isso sempre teve a ver comigo, com o que eu fiz na vida. Fiz muito humor e uma das melhores coisas que fiz na vida foi porque segui o que o autor dizia, mesmo quando ninguém entendia. Quando eu fiz Nelson Rodrigues, eu fiz o que ele dizia: “Isso é uma comédia”. Ele colocou humor em “A Vida Como ela É”, sem perder o drama. A nossa vida é engraçada. Se você não rir, faz da sua vida um peso. Por exemplo, nada é mais triste do que um velório, mas esse é um dos lugares onde as pessoas mais riem. A vida é trágica, mas é uma grande comédia.
 
O que  acha que é preciso num filme de humor para conquistar o público?
O que é necessário em um filme de humor é que os espectadores se identifiquem com o que estão assistindo. Eles precisam se sentir representados na tela de alguma maneira, reconhecer as situações e os sentimentos dos personagens. O pai do humor cinematográfico é o Charles Chaplin. Se você pensar naquela figura fantástica, ele é sempre um pobre miserável com dignidade. E quem de nós não tem este sentimento dentro da gente? No “Sorria”, você reconhece diversos personagens do seu cotidiano.