Clara Monforte

Olhos nos olhos com Ana Paula Padrão

12/09/2014
Olhos nos olhos com Ana Paula Padrão | Jornal da Orla
Você é filha de radialista…
Filha de uma radialista e de um advogado. Mas, na verdade, eu nunca vi minha mãe trabalhando. Ela é mineira, já trabalhava em rádio no interior de Minas Gerais, foi pra  Rádio Nacional, em Brasília, e, um pouquinho antes de eu nascer, ela parou. Naquela época as mulheres deixavam de trabalhar para cuidar dos filhos. 
 
É verdade que ela disse: “filha, não dependa de marido”?
Era um mantra! Eu acho que muitas mulheres da minha geração ouviram esse mesmo mantra: “não dependa de marido… Tenha uma profissão… Tenha o seu dinheiro… Não vá depender de homem…”… Eu fiz exatamente o que mamãe mandou (risos)! Eu sou uma representante da minha geração. 
 
Por que você afirma isso?
Sou de uma geração de mulheres que trabalhou muito, loucamente, botou o trabalho em primeiro lugar na vida, talvez por terem vindo destas mães que pararam de trabalhar, talvez porque era o momento da nossa afirmação. No Brasil, a mulher entrou maciçamente no mercado de trabalho no período em que eu também comecei, nos anos 80, então fiz o que a minha geração inteira fez, não sou diferente destas mulheres.
 
E aquele protótipo de mulher que se parecia com homem?
É… a gente não tinha um modelo feminino para copiar. Então, a gente copiou os homens. Era mais ou menos assim: “olha, você nem vai ver que eu saí de casa, mas eu vou ficar que nem você na empresa. Eu vou colocar um terno, usar ombreira, falar em um tom mais grave, ser mais masculina, não vou chorar no trabalho, não vou reclamar que vou ter que levar meu filho não sei aonde…”. A gente incorporou muito o modelo masculino. 
 
Essa sua vocação começou desde cedo?
Na minha infância, Brasília praticamente não existia, foi uma cidade inventada. Em 1960, quando foi inaugurada, tinha meia dúzia de prédios. Eu sou de 65, então peguei uma Brasília começando. Eu ficava ali, naquele tédio, com aquela terra vermelha e aquele cerrado, pensando: “o que será que tem além disso?”. Então, eu sabia que queria sair de lá, conhecer o mundo e contar histórias. E depois eu descobri que isso era ser jornalista. 
 
O fato de nascer em Brasília favoreceu a se tornar especialista em política?
Certamente. Brasília é uma grande escola de jornalismo, porque a notícia no estado bruto está lá. Tanto a econômica quanto a política. E, no momento em que eu estava ascendendo no jornalismo, Brasília era fonte inesgotável de informação porque a gente estava no meio dos planos econômicos. Então, o país não tinha uma vida normal econômica, a gente vivia altos e baixos, hiperinflação, congelamento de preços, tentativas de estabilizar a moeda… e eu vivi tudo isso.
 
Que conselhos daria a uma pessoa que está começando a carreira agora?
Eu acho que o jornalista muito novinho confunde “celebridade” com trabalho de “repórter em televisão”. São coisas muito distintas e você tem que saber que é uma profissão que não dá final de semana, não dá vida pessoal, que não tem feriado, não tem Natal com a família. É uma profissão de muito, muito, sacrifício. Não tem nada de glamour. É muito sanduíche de queijo à meia-noite num hotel fedorento. São anos e anos de muito sacrifício, até poder dizer assim: “eu não quero mais fazer plantão em final de semana” e começar a assinar contratos. Mas quantos anos de profissão para chegar a isso?
 
Por que  saiu da Globo, a maior do Brasil e uma das maiores do mundo?
Porque era o meu momento. Eu acho esta pergunta muito curiosa, porque para mim é sobre mudar de emprego. Quanta gente não muda? É que quando a gente se torna um pouquinho mais público, e sai de uma emissora muito grande, isso vira um fato meio inédito, é estranho… Não acho que tenha sido diferente de qualquer pessoa. Você muda de emprego porque não está satisfeito com a empresa, o que nem era o meu caso, fui muito feliz durante todo o tempo que  estive na Globo. Eu não queria mais trabalhar de madrugada, não queria mais que o trabalho me definisse… 
 
O que você queria?
Eu queria fazer outras coisas, empreender, ter o meu próprio portal, investir na internet, o que na Globo não cabia naquela época, Queria ter experiência em outras áreas da televisão. A oportunidade apresentada pelo SBT foi a de remontar o departamento de jornalismo e, portanto, passar a entender de várias outras áreas da TV. Eu estava passando por um momento pessoal muito importante, pela primeira vez em uma relação estável, que me dava prazer emocional, coisa que eu não tinha vivido. E eu não estava vivendo isso, porque eu só trabalhava… definitivamente eu precisava mudar a minha vida para ser quem eu sou hoje. Uma empreendedora, entendendo mais de várias áreas da TV, fazendo um produto  que é da área do entretenimento… 
 
E por que o estranhamento?
As pessoas fazem essa pergunta porque pensam: “largar um emprego como a Globo?”. Depois da Globo, eu tive trabalhos muito legais e ganhei muito dinheiro (depois do SBT, trabalhou na Rede Record e agora na Band), fiz muitos amigos, abri muitos horizontes e duas empresas que me dão um superprazer na vida. Então, é seguir a sua vida, o seu caminho, o meu era esse.
 
É preciso coragem para ser feliz?
Precisa de coragem para fazer mudanças na vida. Não tenho nenhuma vocação para a infelicidade, eu sou feliz e eu vou ser sempre feliz. Sou uma bem-humorada, sou animada, sou uma feliz e, para ser feliz, você compra coisas difíceis, você enfrenta coisas.