O nome do livro não poderia ser mais criativo. E foi inspirado no slogan do programa de rádio que ele apresentou por onze anos, chamado “Programa do Zuza”, veiculado na Rádio Jovem Pan de São Paulo e que dizia “ele tem música nas veias”.
Falo do jornalista, radialista, escritor, pesquisador, produtor e músico Zuza Homem de Mello, uma destas pessoas especiais que encontramos na vida e que conhecem muito do universo fascinante da música brasileira e americana.
Em 2007, ele lançou, pela Editora 34, um livro de memórias e ensaios chamado “Música nas Veias”, que conta histórias deliciosas, revelando os segredos dos bastidores de quem viveu verdadeiramente grandes e marcantes momentos musicais.
Resolvi resumir uma destas histórias com a intenção de deixar você com vontade de devorar o livro inteiro. Para mim ela foi, reveladora, afinal, descobri que Zuza foi
na juventude, um esforçado contrabaixista que teve a honra e o privilégio de, quando morou nos Estados Unidos no ano de 1957, conhecer, ter aulas e desenvolver uma
grande amizade com o seu maior ídolo, o incrível contrabaixista Ray Brown, que simplesmente foi um dos maiores músicos da história do Jazz. E que, segundo o próprio Zuza, foi um grande “gentelman” e seu grande mestre.
E o primeiro conselho que Ray Brown lhe deu na sua primeira aula na School Of Jazz de Lenox, Massachussets, foi o seguinte: “Para aprender o que é swing, você tem que ouvir os discos da orquestra de Count Basie dos anos 30 e 40”.
Ele conta no livro que Ray Brown saiu de Pitstsburgh e foi para Nova York e logo na primeira noite na cidade, na famosa Rua 52, pode assistir aos pianistas Errol Garner e Art Tatum, à cantora Billie Holiday, ao saxofonista Coleman Hawkins e seu amigo pianista Hank Jones. E nesta mesma noite recebeu um convite que mudaria o destino da sua vida, quando o trompetista Dizzy Gillespie o convidou para um trabalho, sem nunca tê-lo visto tocar. Ele simplesmente tocaria com a nata do Bebop. Além de Dizzy, Bud Powell no piano, Max Roach na bateria e Charlie Parker no saxofone. Ou seja, no segundo dia em Nova York, com apenas 19 anos de idade, ele não podia reclamar da sorte. E que sorte ele teve, diga-se de passagem.
Foi casado com Ella Fitzgerald, tocou com o pianista Oscar Peterson, Quncy Jones, Duke Ellington e simplesmente participou de mais de duas mil gravações em sua vida.
Zuza tocou até meados de 1959 e seu contrabaixo foi vendido para outro grande músico, o saudoso contrabaixista Luiz Chaves, que durante muitos anos foi o coração do Zimbo Trio no Brasil e no exterior.
Tive a honra de estar com o Zuza algumas vezes e pude desfrutar de toda a sua sabedoria e simplicidade. Um homem, que, assim como eu, tem música nas veias.
Ana Caram – “Hollywood Rio”
A cantora Ana Caram, em sua carreira, lançou no exterior, pelo selo Chesky Records, uma gravadora novaiorquina, cujo dono David Chesky era um apaixonado pela música do Brasil, vários discos de grande qualidade no mercado. Com muita Bossa Nova e MPB.
Sempre gostei do seu estilo de cantar e da sua personalidade forte, definidos desde o seu primeiro trabalho internacional lançado em 1989 e que contou com a bênção especial de Tom Jobim, um padrinho de peso.
Recentemente, o tema “Leve-me Pra Lua”, uma versão brasileira de “Fly Me To The Moon”, faixa do seu trabalho “Blue Bossa” (2001), tocou na abertura da novela das seis da Rede Globo, “Amor Eterno Amor”, trazendo grande repercussão.
Em 2004, lançou “Hollywood Rio”, último disco comercial da sua carreira, pois, em 2005, assumiu sua religiosidade, se convertendo como Adventista do 7º. dia e atualmente Ana Caram somente se apresenta em eventos religiosos e nas igrejas, interpretando apenas o repertório gospel.
Neste trabalho destaco os temas clássicos, cantados em português, italiano e inglês, numa levada moderna e inspirada. São eles: “Estate”, “The Summer Knows”, “The Shadow Of Your Smile”, “Smile” e “As Time Goes By”, entre outros.
Além de Ana Caram nos vocais e violão, merecem destaque os músicos Michel Freidenson nos pianos, teclados e arranjos e o saxofonista e flautista Lawrence Feldman, que deram ao disco um jeitinho bem brasileiro.
João Donato – “O Piano de João Donato”
Ouvir João Donato no formato piano solo é bem raro e extremamente prazeroso. Em 2007, pelo selo Deckdisc, ele lançou “O Piano de João Donato”, uma reunião de seus temas favoritos, que ele ouvia desde a adolescência, incluindo composições autorais, de uma forma bem intimista.
Considero como um disco de memórias musicais e curiosamente foi feito sem ensaios e todos os “takes” foram gravados de uma só vez, sem retoques para corrigir as interpretações. Nem seria preciso, pois as gravações ficaram perfeitas.
Você poderá conferir, nas interpretações leves do disco, as várias influências deste genial pianista acreano, que foi para o Rio de Janeiro ainda jovem e que se tornou um dos grandes expoentes da nossa música. Esteve na Bossa Nova, foi desbravador nos Estados Unidos e, quando retornou ao Brasil, permaneceu ativo e muito criativo. Até os dias de hoje.
Sua figura é carismática e, por onde passa, apesar de um jeito tímido, conta histórias sempre muito interessantes e engraçadas.
Os temas “Outra Vez”, “Brisa do Mar”, “Manhã de Carnaval”, “A Paz” e os clássicos “Invitation”, Speak Low” e “Repetition” ficaram muito inspirados e especiais e podemos escutar por várias vezes sem cansar.
Se você quer ser levado a um lugar incomum, ouça atentamente o disco e se surpreenda.