Clara Monforte

Olhos nos olhos com Anderson Fernandes e Débora Kaoru

27/06/2015
Olhos nos olhos com Anderson Fernandes e Débora Kaoru | Jornal da Orla
A polêmica está lançada: está em franca discussão no Congresso Nacional e, principalmente, no Brasil, a possibilidade da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Uns se mostram contrários, outros totalmente a favor. Para os jornalistas Anderson Fernandes e Debora Kaoru, a literatura pode ajudar na discussão de temas complexos como este. Ano passado, época das manifestações, eles lançaram o livro “Entre Quatro Poderes”, que tinha a política como pano de fundo. Agora, neste segundo semestre, o romance “Nocaute”, que trata de um menor infrator, vem para debater a maioridade penal como um dos temas centrais do livro.
 
O que pensa da polêmica sobre a maioridade penal? 
Anderson Fernandes: O grande problema não são os jovens, e sim a ineficiência de políticas públicas para este público. Podemos afirmar que temos uma legislação de primeiro mundo, porém, aplicada em um país de terceiro mundo, já que muitas diretrizes do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) não são aplicadas.
 
De que maneira o Estatuto poderia ser mais eficiente?
Anderson: Hoje o jovem que infraciona vai para uma unidade de internação e, quando sai, não tem acompanhamento. Isso acontece porque o Poder Público não se preparou para oferecer uma continuidade nesse acompanhamento e não oferece isso, esse é um dos problemas. Para os que não infracionam, as opções de formação educacional, cultural, esportiva, também são mínimas. Hoje não se oferece nem o básico para os nossos jovens, esse é um dos fatores que têm levado milhares deles para o crime.
 
O que levou a escreverem um livro com essa temática?
Debora Kaoru: Apesar de trazer a discussão da maioridade penal, nosso livro aborda diversos outros assuntos e acredito que um dos principais seja como buscar a superação frente aos problemas cotidianos. O principal desafio foi tentar transmitir a mensagem de que as pessoas devem se manter fiéis ao que realmente acreditam.
 
Uma espécie de fidelidade, para se manter longe da criminalidade?
Debora: Sempre surgem atalhos e caminhos tentadores que podem trazer recompensas, mas que não, necessariamente, estão alinhados ao que você quer ser. Desta maneira, as pessoas devem buscar encontrar a verdade dentro de si. Quando você faz algo verdadeiro e com o coração, não tem como dar errado. Essa é a grande mensagem do nosso livro.
 
Você considera que um jovem infrator é vítima das circunstâncias… ou é questão de caráter?
Anderson: Acreditamos que, em essência, as pessoas são boas. Talvez falte em alguns casos a oportunidade, um “empurrão”. Porém, cada pessoa tem o seu tempo e é preciso estar amadurecido com um olhar, um pensamento de mudança. O que queremos dizer é que as razões são múltiplas.
 
Mas nem por isso as pessoas saem por aí cometendo crimes…
Anderson: Sim, hoje encontramos pessoas que moram em locais muito pobres, que não oferecem perspectiva de vida. Porém, alguns lutam por melhorias, enquanto outras se acomodam e se revoltam. Acham injusta a situação e simplesmente metem um revólver na cintura e se acham no direito de cometer crimes.
 
Por que, quando se fala em criminalidade, as pessoas apresentam comportamentos diferentes? 
Anderson: Certamente é por causa do amadurecimento que cada uma tem como ser humano. A pessoa mais amadurecida é menos infantil, enfrenta a realidade, busca mudanças e melhorias. Enfim, faz acontecer.
 
Quais os caminhos para regenerar um jovem?
Debora: Existem duas fases na vida de uma pessoa: antes da educação e depois dela. Quer transformar o mundo? Melhore o sistema educacional! Hoje a escola é fraca, o professor não tem o reconhecimento que merece. E resultado em educação não acontece do dia para a noite. Se tivermos um grande investimento hoje, resultados práticos só daqui a 20 anos. Não adianta pensar num programa de quatro anos. O brasileiro tem muita força de vontade, muita criatividade, porém, não é estimulado.
 
O que o governo e a sociedade podem colaborar para melhorar efetivamente essa questão?
Anderson: Só vemos um caminho: o governo realmente investir na melhoria do sistema educacional.