Significados do Judaísmo

Jamaica: seus judeus, Cristóvão Colombo e piratas

14/06/2023
Jamaica: seus judeus, Cristóvão Colombo e piratas | Jornal da Orla

Os judeus da Jamaica formam uma comunidade religiosa pequena, mas vibrante, centrada hoje na capital de Kingston. Enquanto o núcleo da comunidade traça sua ascendência na Península Ibérica e o êxodo judaico que começou no final do século 15, os judeus jamaicanos hoje vêm da Polônia, França, Itália, África, Israel, Turquia e muitos outros lugares.

A expulsão de 1492 da Espanha e de Portugal em 1497 e as adversidades que se seguiram, para os que ficaram na Espanha e Portugal, foram as principais razões da chegada destes primeiros judeus sefarditas ao Novo Mundo.

A Jamaica foi descoberta, pela primeira vez, por Cristóvão Colombo, um homem de origens ambíguas. Alguns afirmam que ele era italiano, alguns, basco, e outros afirmam que ele era um judeu marrano. Colombo havia conquistado o direito de governar todas as terras que reivindicou para a Espanha no Novo Mundo, e as leis da Inquisição não foram incluídas em seus territórios. Infelizmente, surgiram disputas com a coroa, desafiando os termos de sua propriedade. A Jamaica acabou sendo adquirida pelo filho de Colombo.

Durante o século XVI, o medo da Inquisição e o desejo de liberdade religiosa levaram muitos dos criptojudeus (convertidos forçados que continuam a agarrar-se secretamente à sua fé) a fugir da Espanha e Portugal para o Norte de África, Holanda, Império Otomano e o Novo Mundo.

Para ocultar suas identidades, eles se referiam a si mesmos como “portugueses” ou “espanhóis” e praticavam sua religião secretamente. Quando da conquista britânica da ilha, em 1655, o general Robert Venables registou a presença de muitos “portugueses” na Jamaica.

Depois que os britânicos colonizaram a Jamaica, outra onda de imigrantes judeus chegou. Sob os britânicos, tornou-se legal praticar o judaísmo, o que por sua vez levou ao estabelecimento da primeira sinagoga da ilha, em Port Royal, um movimentado centro comercial conhecido como base para piratas. Pouco se sabe sobre esta sinagoga, que foi destruída junto com grande parte da cidade em um terremoto e tsunami em 1692.

As oportunidades econômicas também eram abundantes, especialmente no comércio de açúcar, baunilha, tabaco, rum e ouro. A comunidade prosperou e cresceu em relativa liberdade.

Port Royal tornou-se um local atraente também para o comércio de mercadorias como ouro, prata, porcelana, bordados e seda. Os judeus também participaram, particularmente no comércio de prata e ouro, e na troca de dinheiro.

Este sucesso, no entanto, levou a uma reação. Comerciantes ingleses acusaram os judeus de cortar moedas, um método de raspar o metal precioso do dinheiro e colocá-lo de volta em circulação pelo valor de face. As acusações dos mercadores ingleses ocorreram muitas vezes. Esse ressentimento levou à coalizão de um Conselho Legislativo que representava comerciantes e fazendeiros ingleses que, em 1691, desempenhavam um grande papel na economia de Port Royal. Por exemplo, o Conselho fez uma petição ao Governo Real de que os judeus estavam sonegando impostos.

A expansão da população judaica no século 17 ajudou a transformar a Jamaica em um próspero centro comercial no Caribe, mas também criou um importante ponto de partida para ataques contra navios espanhóis e portugueses. Judeus como Abraham Blauvelt trabalhavam como corsários (legalmente sancionados pelo governo britânico para invadir navios inimigos como parte da guerra marítima), enquanto outros judeus, como Moses Cohen Enrique, eram verdadeiros piratas.

A extensão exata da atividade pirata judaica é muito debatida e provavelmente exagerada, mas certamente teria sido uma doce vingança para os judeus da Jamaica, cujos ancestrais foram tão abusados na Península Ibérica no século XV. No Cemitério de Hunt’s Bay (existem 22 cemitérios judaicos conhecidos na Jamaica), existem sete lápides com caveiras e ossos cruzados.

Em 1693, os funcionários da ilha impuseram um imposto especial à comunidade judaica e, na virada do século, eles eram considerados cidadãos de segunda classe devido ao seu status de “judeus”. Foram proibidos de usar servos cristãos, obrigados a trabalhar no sábado e, posteriormente, proibidos de ocupar cargos públicos.

Em 1815, um incêndio quase destruiu toda Port Royal. Muitos judeus deixaram a cidade, instalando-se na cidade jamaicana chamada Kingston, onde uma nova economia estava florescendo com sucesso comercial.

Judeus Ashkenazi começaram a chegar à Jamaica no início do século 18 e em 1710 aproximadamente 20% da população de Kingston, a maior cidade e hoje a capital, era judia. A população judaica atingiu seu pico na década de 1880, quando 22.000 dos 580.000 habitantes da ilha eram judeus.

Os judeus em Kingston forneceram quatro prefeitos, muitos juízes de paz, membros do parlamento e inúmeros construtores, dentistas, médicos, professores, advogados e atores.

A Jamaica conquistou a independência da Grã-Bretanha em 1962 e seu primeiro embaixador nos Estados Unidos, Neville Ashenheim, era judeu.

A instabilidade política na década de 1970 levou a um êxodo em massa de judeus da ilha e hoje apenas entre 300 a 500 judeus permanecem. Além de uma Chabad House, a única sinagoga aberta é Shaare Shalom em Kingston, construída em 1885.

Uma conexão fascinante entre os judeus e a Jamaica é o Rastafarianismo – uma religião e movimento social que apareceu na Jamaica na década de 1930 e foi popularizado pelo músico de reggae Bob Marley. Embora os judeus não tenham nada a ver com a fundação do rastafarianismo, não há dúvida de que o judaísmo e os temas e conceitos bíblicos, como a narrativa do Êxodo, desempenharam um papel significativo na formação do rastafarianismo. A música de Bob Marley está repleta de referências bíblicas e até citações diretas da Torá.

Embora a comunidade judaica hoje seja apenas uma fração de seu tamanho anterior, seu impacto na Jamaica perdura.

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