Embora muita gente torça o nariz, diga não assistir “Big Brother Brasil” e critique quem vê, é inegável que o programa da maior emissora de TV do Brasil influencia o comportamento das pessoas que estão fora da casa cenográfica. Mais do que isso: as posturas dos participantes do reality-show evidenciam também atitudes muito comuns em pessoas de nosso dia a dia. A prova mais recente foi a postura da rapper Karol Conká (até então tida como referência da defesa de minorias), que sistematicamente praticou contra o ator Lucas Penteado o que os especialistas classificam como violência psicológica. Cuidado! Pode haver um torturador emocional ao seu lado! Ou, pior, você pode ser a Karol Koncá de alguém…
Tortura sistemática
Caracterizada por maus tratos mentais e emocionais (humilhações, xingamentos), a violência psicológica é praticada em uma relação onde o agressor tem uma posição simbolicamente superior: o chefe, o pai de família, o namorado… No BBB, o que lastreava o comportamento da rapper era sua popularidade fora do programa.
Assim, o torturador se sente no direito de praticar a violência, que muitas vezes é avalizada pelos demais integrantes daquele grupo social.
Assim como acontece nos crimes de estupro, na grande maioria dos casos a violência psicológica é praticada por alguém muito próximo à vítima e ela, por esta razão, muitas vezes tem dificuldade de identificar o comportamento tóxico (desqualificar, humilhar, ignorar, proibir etc).
Cultura do cancelamento vira trem sem freio
O comportamento de Karol Conká trouxe a ela consequências extremamente negativas fora da “casa mais vigiada do Brasil”. As exibições de seu show no festival Rock The Montain e um programa no canal GNT foram canceladas e ela perdeu um terço de seus seguidores no Instagram (ou seja, 500 mil pessoas). Foram demonstrações da “cultura do cancelamento”.
Esta prática surgiu nas redes sociais em 2018. Trata-se de uma estratégia de mobilizar as pessoas pelas redes sociais para boicotar empresas ou pessoas, em represália a um comportamento reprovável –racismo, homofobia, degradação ambiental, maus tratos a animais…
Apesar dos nobres objetivos iniciais, a situação perdeu completamente o controle. A “cultura do cancelamento” se disseminou de tal modo que foi eleita em 2019 como a expressão do ano pelo Dicionário Macquarie, que seleciona as palavras e termos que melhor traduzem o comportamento em cada ano.
Porém, a sua prática indiscriminada acabou se tornando manifestação pura e simples de intolerância, uma estratégia de perseguir pessoas pelo simples fato de pensarem diferente, a ponto de um grupo de 150 escritores e intelectuais assinarem uma carta aberta denunciando o que consideram uma verdadeira caça às bruxas.
Um problema sério
Não é mi-mi-mi. A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem uma definição muito clara para violência psicológica: “Qualquer conduta que cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento, ou que vise degradar ou controlar ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”.
Canceladores e cancelados
Pesquisa realizada Hibou, empresa de monitoramento de consumo, revela que 86% dos telespectadores do Big Brother Brasil 21 sentiram emoções negativas ao verem o programa, como raiva, tristeza, preconceito, indignação, nojo e repúdio.
Para 44% dos entrevistados, 44% “cancelar” não é algo novo, mas ganhou força com as redes sociais; 50,7% das pessoas já ocuparam o papel de “cancelador” contra uma marca ou empresa; 52,7% com artistas ou páginas nas redes sociais e 48,6% com pessoas da sua relação direta. Por outro lado, 38% dos ouvidos afirmaram já ter sofrido algum tipo de cancelamento na vida.
Uma hora, pedra; na outra, vidraça. Um trem desgovernado.