Umberto Eco, filósofo e semiólogo italiano de Alexandria, deixou-nos em 2016. Não sou homem de contas, tampouco de estatísticas ou espiritualidades. Nunca poderia saber quantos homens e mulheres tiveram passagem a valer a pena neste mundo. Mas podemos dizer, sem medo de errar, que Eco, à sua maneira, mudou o mundo para melhor.
Há escritores que não se limitam a bolar romances mirabolantes. José Saramago fez de sua literatura um monumento à lucidez e ao humanismo, Amós Oz dedicou suas tintas aos temas sérios de seu povo, Jorge Amado insinuou as belezas da cultura baiana em seus livros. Umberto Eco, por seu turno, foi um escritor erudito: um homem que falava muito bem sobre tudo. O livro hoje proposto traz 178 crônicas agrupadas em 14 capítulos que tratam de assuntos elementares do mundo contemporâneo: retrocessos civilizatórios, superexposição, velhos e jovens, conspirações, mídia, política, religião, Estado, racismo, feminismo, internet, celulares, estupidez etc. Crônicas que iluminam os recantos pouco pensados de nossos universos cotidianos particulares.
Perceba a riqueza espetacular daquilo que você pode ter em mãos: Pape Satàn Aleppe é um livro de crônicas sobre as trivialidades do mundo moderno escrito por um gênio dos livros e das ciências. É como ter Umberto Eco, esse monstro das inteligências humanas, sentado no sofá da sua casa para um bate papo despretensioso sobre os fatos comuns da vida.
Dê a você mesmo esse luxo e divirta-se.
Motivos para ler:
1 – Umberto Eco é brutalmente inteligente. Entrar em contato com a genialidade humana só faz bem. Você vai se interessando e acaba se tornando uma pessoa mais interessante;
2 – Se você não está habituado a ler crônicas, eis aqui um belo começo. Uma vantagem das crônicas é a leitura sem pressa, já que cada texto, sempre curto (uma ou duas páginas), encerra-se em si mesmo. Não se perde, portanto, o fio da meada e a leitura pode ser espaçada sem prejuízos;
3 – Há algumas crônicas hilárias. Em minha preferida, Eco elegantemente lamenta a presidência de Bush (2012) e elenca uma série de frases “confusas” do estadunidense: “Já é tempo de a raça humana entrar no Sistema Solar”; “O sistema de educação pública é fundamental, é onde as crianças aprendem a tirar vantagem da nossa extraordinária sociedade oportunista”; “Sei que os seres humanos e os peixes podem coexistir em paz”. E uma tragicômica pergunta feita ao FHC, nosso presidente àquela época: “Vocês também têm negros?”