Em repetidas ocasiões, tenho afirmado que a atual lei portuária nacional (Lei 12.815/13) tem prestado um grande desserviço ao país. Ela é resultante de uma medida provisória gestada isoladamente pelos pretensos tecnocratas palacianos do governo anterior. Com seu DNA original distorcido, não poderia apresentar resultados adequados e coerentes para as necessidades do modelo portuário mundial atual. A ignorância da história e da verdade sobre o sistema portuário chegou a tal ponto que a anterior presidente da República, ao anunciar a Medida Provisória (MP-595), destacou que estaria realizando uma nova abertura dos portos e permitindo que a iniciativa privada pudesse, finalmente, investir em tal segmento.
Evidencia, no mínimo, o despreparo do governo federal (para não dizer má fé), pois todos sabem que, desde a Lei 8.630 de 1993, a verdadeira lei de modernização portuária, a iniciativa privada investe e opera as cargas, nos portos públicos e em terminais privativos. Na verdade, mesmo antes da lei modernizadora, já havia investimentos privados em várias instalações portuárias.
Pois bem. A atual lei 12.815/13 regrou duas possibilidades de exploração de atividades portuárias, pela iniciativa privada: em áreas arrendadas dentro dos portos organizados (portos públicos como o Porto de Santos) ou em áreas próprias, com a implantação de terminais privados, que devem estar fora dos limites dos portos organizados.
A nova lei e suas intermináveis regulamentações estabeleceram regramentos, para ambas as possibilidades de atuações da iniciativa privada, de maneira tão desequilibrada e com tantas burocracias e distorções que o caos institucional no sistema portuário está configurado. Os intervenientes são excessivos e atuam de forma distorcida, em muitas situações ocupando as funções que seriam de outras instituições.
Entre os problemas atuais do sistema portuário, encontra-se a falta de isonomia nos regramentos e condições para ambas as possibilidades de atuações no sistema portuário, talvez o mais desafiador.
Quem milita no segmento portuário sabe que há um grande desequilíbrio entre as condições que a iniciativa privada tem para atuar dentro dos portos públicos e as que pode utilizar quando faz sua opção pelos investimentos em terminais privados. No porto público, obrigações. Nos terminais privados, opções.
Estas distorções e a excessiva burocratização do sistema portuário atual têm levado todos os envolvidos nos temas, já há algum tempo, a pleitear a revisão do atual marco regulatório. Interessante que a anterior presidente da República também justificou a necessidade de uma nova lei portuária, alegando que a Lei 8.630/93 já tinha quase 30 anos, como se longevidade legal fosse sinônimo de inadequação. Sabemos que é justamente o contrário! Lei boa em geral é de longa data, lei perene.
A nova lei, com toda sua juventude, foi colocada “no paredão”, inclusive pelos que ardorosamente a defenderam, quando de sua implantação. O problema deste momento é debatermos para onde queremos direcionar o sistema portuário brasileiro. Novamente, destaco que temos dois regimes de exploração portuária. Porto Público e Porto Privado. Se não garantirmos equilíbrio e isonomia nos regramentos, certamente estaremos sacramentando, de forma definitiva, o fim anunciado dos portos públicos e a dependência do país dos portos privados.
Se realmente houver revisão no marco regulatório portuário atual, e precisa haver, precisamos corrigir as distorções quanto ao desequilíbrio de regramentos, entre os dois regimes de exploração. Este momento não pode ser desperdiçado. As comunidades das cidades portuárias não podem se omitir nos debates. É questão de sobrevivência dos portos e das cidades portuárias. Por isso, a primeira pergunta a ser respondida é: para onde vão navegar os investimentos no sistema portuário: para os portos públicos ou para os portos privados? Depende de como ambos os sistemas são regulados legalmente.