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Resenha da semana: Batman

04/03/2022
Resenha da semana: Batman | Jornal da Orla

Corajoso, impactante e difícil de digerir logo de cara, Batman entrega um épico noir que se inspira nos melhores filmes de detetive em uma abordagem totalmente diferente e empolgante de tudo que você já viu.

O que de fato é ser um herói? Possivelmente, podem existir diversas respostas para essa pergunta, mas em essência podemos dizer que um herói é um símbolo. É a pura representação de um ideal, uma figura de inspiração para mostrar as pessoas que bastam nossas ações e atitudes para tornar o mundo diferente.  E, embora seja um dos maiores ícones da cultura pop , o Cavaleiro das Trevas sempre foi na contramão dessa ideia por ser um personagem ambíguo e com atitudes pouco ortodoxas que por vezes, ultrapassam a linha da razão. Expor esse fator, é um dos diversos acertos dessa nova produção, que além de trazer uma versão mais crua e impactante ao icônico personagem,  explorando toda sua complexidade moral e psicológica (evidenciando que o herói é parte do problema que jurou combater) entrega um épico noir que se inspira nos melhores filmes de detetive em uma abordagem totalmente diferente e empolgante de tudo que você já viu.

Batman (The Batman, no original) segue o segundo ano de Bruce Wayne (Robert Pattinson) como o herói de Gotham, causando medo nos corações dos criminosos da sombria cidade. Com apenas alguns aliados de confiança – Alfred Pennyworth (Andy Serkis) e o tenente James Gordon (Jeffrey Wright) – entre a rede corrupta de funcionários e figuras importantes do distrito, o vigilante solitário se estabeleceu como a única personificação da vingança entre seus concidadãos. Durante uma de suas investigações, Bruce acaba envolvendo a si mesmo e Gordon em um jogo de gato e rato, ao investigar uma série de maquinações sádicas em uma trilha de pistas enigmáticas estabelecida pelo vilão Charada. Quando o trabalho acaba o levando a descobrir uma onda de corrupção que envolve o nome de sua família, pondo em risco a própria integridade e as memórias que tinha sobre seu pai, Thomas Wayne, as evidências começam a chegar mais perto de casa, precisando, Batman, forjar novos relacionamentos, para assim desmascarar o culpado e fazer justiça ao abuso de poder e à corrupção que há muito tempo assola Gotham City.

O filme é dirigido com paixão pelo diretor Matt Reeves (mesmo da Trilogia Planeta dos Macacos), que consegue prender o público desde a primeira cena com seus 20 minutos iniciais de cair o queixo: a narração em off bebendo da fonte de Taxi Driver, a explicação por trás do bat-sinal e a apresentação do Batman surgindo das sombras na cena do metrô são cenas memoráveis. Matt Reeves cria aqui uma história totalmente original, como se estivéssemos assistindo não um filme de super-herói, mas uma trama densa de investigação que remete diretamente à Seven: Os Sete Crimes Capitais de David Fincher. O diretor dosa muito bem todos os momentos do filme, se estendendo em takes específicos mas sem perder o ritmo. Mesmo com quase 3 horas de duração, não senti o tempo passar, pois o filme não deixa você respirar, com acontecimentos atrás de acontecimentos. Eu poderia assistir tranquilamente um corte de 5 horas deste filme. Apresentando uma Gotham como um pesadelo gótico, com ruas sujas, povoada por viciados em drogas, criminosos e uma chuva constante que criam uma atmosfera claustrofóbica, Matt Reeves aliado ao diretor de fotografia Greig Fraser, cria a Gotham mais escura já vista nos cinemas: raramente vemos uma cena ambientada durante o dia e as cenas noturnas são carregadas de sombras e luzes com alcance limitado. O diretor se sai bem também na concepção das cenas de ação, com os combates corpo a corpo sem cortes onde podemos sentir cada golpe desferido de forma seca e crua pelo Batman e na memorável cena de perseguição de carro, onde apresenta o batmóvel praticamente como uma criatura monstruosa saída de uma caverna.

O roteiro, escrito pelo diretor em parceria com Peter Craig, é profundamente pessoal para Bruce Wayne e definitivo para a pessoa que ele está a caminho de se tornar. No fim do seu arco, você enxerga a evolução do personagem e por tudo que ele passou para chegar ali. Outro ponto interessante abordado pelo roteiro, além do resultado da desigualdade econômico no mundo, é como a internet e as redes sociais propiciam o crescimento de homens inseguros e frustrados que acabam encontrando na violência, uma vingança contra aqueles que acreditam serem oprimidos.

Além disso, a trilha sonora é um capítulo à parte: tão pesada quanto o Homem-Morcego, ela dá o tom perfeito para aquela figura mascarada, sendo soturna, tensa e amedrontadora.

Para além de todos estes acertos do diretor, há o elenco. E aqui vale destacar o estupendo trabalho de direção e escolha dos atores, pois não há nenhum que não esteja fenomenal. Robert Pattinson talvez se torne o melhor Batman de todos os tempos: surgindo como um jovem pálido e que parece caminhar sempre encurvado, falando em voz baixa e mantendo um distanciamento emocional com todos ao seu redor, o ator encarna de forma perfeita Bruce Wayne/Batman com imponência e segurança quando está com seu traje. Nos demais, Zoe Kravitz faz você esquecer qualquer versão da Mulher-Gato anterior, equilibrando sensualidade com fisicalidade, Paul Dano como Charada cria um serial killer totalmente alucinado e psicótico ao passo que Jeffrey Wright como o Detetive Jim Gordon cria uma interessante parceria com Pattinson.

Batman é um filmaço! Corajoso, impactante e difícil de digerir logo de cara, o filme traz uma abordagem de investigação policial nunca antes vista nas telas aliado a uma impecável direção e atuações fantásticas. Com certeza, vai mexer com as estruturas dos filmes de heróis que virão a seguir.

Curiosidade: Matt Reeves afirmou que sua versão do Charada foi parcialmente inspirada no infame serial killer Zodíaco, que operou na Califórnia no final dos anos 1960.

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