Significados do Judaísmo

O Sofrimento dos Judeus Portugueses e a Inquisição

23/12/2021
O Sofrimento dos Judeus Portugueses e a Inquisição | Jornal da Orla

A história dos judeus em Portugal é marcada por sucesso e tristeza.

Da Idade de Ouro dos Descobrimentos à Inquisição, os judeus portugueses foram das alturas da riqueza e do sucesso às profundezas da angústia e do desespero.

A história dos judeus em Portugal é como a de muitos outros lugares, onde o sucesso e a tristeza andam de mãos dadas.

Caminhando pelas ruas de Lisboa, restam vestígios da rica vida judaica de Portugal. Faíscas do passado de Portugal podem ser encontradas nas aldeias remotas nas montanhas, onde algumas das últimas comunidades marranas remanescentes ainda podem ser encontradas praticando rituais judaicos a portas fechadas, com medo de perseguição ainda iminente.

Os documentos escritos que mencionam a presença de comunidades judaicas na Península Ibérica acumulam-se desde o início do período visigótico: no século IV EC, as decisões do Concílio de Elvira, em particular a interdição de casamentos entre judeus e cristãos, confirmam a sua integração completa entre os ibéricos.

Os judeus viveram e permaneceram ativos na vida social e comercial da península durante os períodos visigodos e muçulmanos de ocupação dos séculos V-VIII EC.

Quando Portugal emergiu como uma entidade nacional distinta sob Affonso I, vários distritos inteiramente judeus existiam, incluindo comunidades em Lisboa, Porto, Santarém e Beja.

Affonso empregou como seu tesoureiro Yahia ben Yahi, iniciando assim o padrão de governantes portugueses recrutando talentos judeus na administração dos assuntos de estado.

Ben Yahi também se tornou o primeiro rabino-chefe da comunidade judaica portuguesa. Seu neto, Jose ben Yahi, foi nomeado Alto Administrador do Reino pelo sucessor de Henriques, o Rei Sancho I.

Até ao século XV, alguns judeus ocuparam lugares de destaque na vida política e económica portuguesa. Por exemplo, Isaac Abrabanel era o tesoureiro do rei Afonso V de Portugal. Muitos também tiveram um papel ativo na cultura portuguesa, mantendo a reputação de diplomatas e mercadores. Nessa época, Lisboa e Évora abrigavam importantes comunidades judaicas.

Os judeus foram, no entanto, pesadamente tributados, sendo o preço de permanecer sem serem molestados.
O antipático Afonso IV (1325–1357) reinstituiu a exigência de que os judeus usassem um distintivo amarelo de identificação e restringiu sua liberdade de emigrar. O clero, encorajado, acusou os judeus de espalhar a Peste Negra em 1350, incitando a população à ação.

Foi só na segunda metade do século XV, com a chegada de cada vez mais judeus e conversos refugiados da Espanha, que começaram a aparecer sinais de intolerância.

As circunstâncias em Portugal foram notavelmente cruéis, e o Rei João II deu-lhes a escolha de se converterem ou serem vendidos como escravos.

O monarca prendeu os filhos de judeus que se recusavam a se converter.

A morte de João em 1495 trouxe alívio temporário para a comunidade judaica em Portugal.

Porém, em 1497, sob a pressão da Espanha através do casamento de Isabel, Princesa das Astúrias, da Igreja e de alguns cristãos entre o povo português, o rei Manuel I de Portugal decretou que todos os judeus deviam se converter ao cristianismo ou deixar o país sem suas crianças. Manuel ordenou que os judeus só poderiam partir do porto de Lisboa, em um determinado dia de 1497. Quando os judeus chegaram a Lisboa no dia marcado, foram recebidos não com barcos, mas com padres que batizaram os judeus em massa.

Seguiram-se tempos difíceis para os judeus portugueses, com o massacre de 2.000 indivíduos em Lisboa em 1506, novas deportações e ainda mais relevante foi o estabelecimento da Inquisição portuguesa em 1536.

Como a Inquisição espanhola, Portugal concentrou seus esforços em expulsar convertidos (predominantemente judeus) que não aderiam às restrições da ortodoxia católica.

O primeiro auto da fé lusitano ocorreu em 26 de setembro de 1540. Os autos eram considerados a cerimonia máxima de representação do poder Inquisitorial.

Os condenados poderiam ser divididos entre reconciliados, ou seja, os que passariam por penitência e estariam reconciliados com a igreja, e os chamados “relaxados”, que eram entregues à justiça secular para execução.

Todos os condenados eram obrigados a usar “hábito penitencial”, também conhecido como sambenito. Essa roupa continha imagens de chamas de fogo cuja posição variava, sendo para cima no caso dos reconciliados e para baixo no caso dos relaxados.

Os condenados caminhavam em procissão até a praça onde se realizaria o Auto e então esperavam por sua vez de subir no cadafalso para ouvir a sentença que lhe seria proferida e também proclamar seu arrependimento e abjurar dos costumes heréticos.
O Santo Ofício utilizava por vezes a tortura – o strappado (uma forma de punição ou tortura em que a vítima era amarrada a uma corda e caída de uma altura quase até o chão antes de ser parada com um solavanco abrupto) e o potro (Aparelho composto por uma prancha sobre a qual era deitada a vítima. Apresentava orifícios pelos quais se passavam cordas de cânhamo que arrochavam o tórax, os antebraços, os braços, as coxas, as panturrilhas) como métodos para conseguir as confissões necessárias.

Os guardas que serviam à Inquisição também podiam depor contra os acusados: se enquanto preso um réu se recusasse a comer, por exemplo, essa ação poderia ser considerada um jejum, costume judaico.
Em diversos casos, era comum que falsas acusações fossem feitas aos cristãos-novos e dificilmente era comprovada a inocência do acusado.

Em maio de 1773, em Portugal, o Marquês de Pombal aboliu oficialmente todas as distinções legais entre Cristãos Velhos e Novos.

Medidas semelhantes não foram promulgadas na Espanha até 1860.

Muitas pessoas mantiveram algumas das práticas e costumes dos marranos sem saberem de sua ancestralidade judaica.

“Cripto-Judeu” ou Anussim tornaram-se agora os termos mais politicamente corretos, (ao contrário de Marrano) e refere-se a todos os judeus forçados a adotar uma certa religião e filosofia política enquanto mantinham as práticas judaicas em segredo.

Durante os séculos de pesadelo da Inquisição de Portugal, mais de 40.000 pessoas foram implicadas, das quais 30.000 foram condenadas em autos-de-fé.

Em 2013, os parlamentares portugueses aprovaram por unanimidade uma lei que permite aos judeus sefarditas requererem a nacionalidade portuguesa.

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