Retratos da Várzea

Itararé Praia Clube completa 100 anos

03/05/2025 Eduardo Silva
Arquivo Pessoal

O futebol raiz desafia o tempo. Não importa as batalhas que os jogadores varzeanos precisaram enfrentar. De chuteiras com travas ou descalços. Em campos bem cuidados ou esburacados. Em dias de sol, ou debaixo de chuva e muita lama. O espírito do amadorismo toma conta do ambiente e faz de cada partida um encontro digno de uma final no Maracanã. Só quem jogou, viu ou conviveu nos tempos de ouro do futebol de várzea é capaz de entender essa paixão. Não existiria outra forma de começar uma reportagem que vai contar a história de um clube centenário de São Vicente: o Itararé Praia Clube. Tudo começou quando os trabalhadores das pedreiras se encontravam para “bater uma bolinha” logo depois da jornada de trabalho na encosta do Morro do Itararé, no chamado canto do Bufo.

Aos domingos já realizavam partidas de futebol contra equipes de Santos, Praia Grande e Cubatão. Nos dias de chuva eles se reuniam para jogos de carteado num estabelecimento na esquina da Avenida Floriano Peixoto com a Rua Rangel Pestana, ao lado da “linha do trem”. Numa dessas tardes de jogos de azar,  que eram proibidos naquela época, foram surpreendidos pela policia que levou todo mundo para a delegacia. Explicaram para o delegado que eram trabalhadores das pedreiras e mostraram, como prova,  as mãos calejadas pelo duro trabalho de quebrar pedras. Foi aí que próprio delegado dispensou a todos e sugeriu que fundassem um clube para não serem mais importunados em suas atividades recreativas. A fundação aconteceu no dia 1 de abril de 1925, com as cores preto e vermelho, que para os pioneiros representavam sangue e luta.

O primeiro presidente foi o senhor Antonio Vidal. Embora o clube tenha sido oficialmente fundado no dia 1º de abril, suas comemorações de aniversário sempre foram celebradas no dia 1º de maio, em homenagem ao dia do trabalho, por tratar-se de um clube composto exclusivamente por trabalhadores das pedreiras. O campo de futebol foi construído na praia do Itararé, na década de 1930, autorizado pela Capitania dos Portos do Estado de São Paulo e Prefeitura Municipal de São Vicente. A posição foi alterada algumas vezes. A última alteração foi aprovada em audiência publica realizada em 2010 e passou a se chamar “Praça de Esportes Itararé Praia Clube – Arlindo Satyro da Silva”. Personalidades do esporte e da política prestigiaram o clube como Athié Jorge Coury, Esmeraldo Tarquínio, Luis Beneditino Ferreira, Jonas Rodrigues, Lincoln Feliciano entre outros.

O Itararé Praia Clube começou a disputar os campeonatos oficiais da “Liga Vicentina de Futebol Amador, em 1937, revelou vários jogadores e ganhou títulos de 1973, 1974, 1982. Na Liga de Futebol Amador de Santos, o Itararé também conquistou em 1970 o título de campão juvenil.

O Clube também participou de várias campanhas sociais, como a do agasalho, ou para arrecadar fundos para recuperação do Hospital São José.

APAIXONADOS PELO ITARARÉ

O atual presidente é Sérgio Ruiz, o Serginho, tem 59 anos de idade e que entrou no clube para jogar futebol a convite de amigos. Como tinha experiência na área social, por ocupar cargos importantes da Associação Atlética Portuguesa durante 10 anos, acabou sendo convidado para ser diretor social do Itararé. E pouco tempo depois assumiu a presidência do clube. “Estou no meu segundo mandato e nesse domingo vamos homenagear vários esportistas importante da agremiação. O Itararé é um celeiro de craques da nossa várzea e muitos profissionais começaram lá. É difícil um clube amador chegar aos 100 anos”.

Outro abnegado do Itararé Walter dos Santos Júnior, de 63 anos, tem 23 no clube. Ele já foi tesoureiro, diretor social, vice-presidente e hoje está no Conselho de administração do clube.

“Fui para lá em 2004, cheguei para jogar futebol e ajudar o ex-presidente Darci e logo comecei a ajudar a cobrar os recibos, como tesoureiro. Fui para outros cargos e continuo ajudando até hoje com a divulgação nas redes sociais. Waltinho lembra de um slogan do clube.  Itararé Praia Clube, igual talvez, melhor, jamais. “É um clube que eu amo de paixão, de montão e de coração”.

Waldir Dias

Quem começou a jogar no Itararé Praia Clube foi o ex-centroavante Waldir Dias que frequentou o clube desde garoto. “Desde moleque, com 10 anos, eu sou Itararé. Eu acompanhava meus irmãos, que já tinham 14 ou 15 anos de idade. Iniciei no segundo quadro a disputar os campeonatos vicentinos. Subi para o primeiro quadro e me firmei aos 18 anos”. Waldir Dias guarda boas lembranças da equipe que tinha um ataque bem familiar para ele. “Todos meus irmãos eram atacantes. Virgilino e Wanderley jogavam na ponta-direita, o Wanderley acabou deslocado para a meia. O Waldemir era ponta-esquerda e o único doido para jogar de centroavante era eu”. O time vicentino foi fundamental para a ida de Waldir Dias ao futebol profissional. “Num amistoso do Itararé com a Associação Atlética dos Portuários fui observado pelos senhores Claudino e Batista e convidado para uma avaliação no Jabaquara Atlético Clube. Fui para o juvenil e acabei assinando no profissional.

Waldir Dias também jogou na Portuguesa Santista, Marília, Francana, Santo André, Rio Branco de Americana, Itumbiara, Anápolis, Atlético Goianiense, Blumenau, Marcílio Dias, Tubarão, Londrina, Remo do Pará, CSA de Alagoas, e ainda passou pelo futebol de Alagoas, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais e Paraiba. Hoje, aposentado, aos 67 anos, Waldir tem boas recordações e apesar de ter feito muitos gols pelo Brasil nunca esqueceu do time que o revelou. “Itararé Praia Clube foi a minha base no futebol. Fui direto para o profissional do Jabaquara Atlético Clube e ali aprendi a jogar e ser respeitado”.