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“A casa da paixão”, corajoso romance transgressor da brilhante Nélida Piñon

01/09/2022
“A casa da paixão”, corajoso romance transgressor da brilhante Nélida Piñon | Jornal da Orla

Um romance de transgressão: assim se define A casa da paixão, lançado nos sombrios tempos de chumbo (1972). Nélida Piñon corajosamente transgrediu a ordem político-cultural vigente daquela época ao publicar um livro dedicado à liberdade sexual da mulher, com fortes personagens apoderadas de seus próprios corpos e vidas. Uma postura bastante audaciosa para tempos de latente conservadorismo político-social que encarava o prazer feminino como verdadeiro tabu.

Com poucas personagens, o livro é centrado nas relações estabelecidas entre Marta e aqueles que a volteiam: o pai, a empregada da casa e o pretendente. Nesta estória, Marta, fonte de desejo de todos os homens, enfrenta uma jornada pela emancipação e afirmação de seus próprios desejos. A prosa muito lírica de Nélida conduz o leitor por meandros provocantes e também perturbadores.

Numa linguagem que vai do cru ao poético, o livro insere Marta na galeria das fortes personagens femininas literárias em luta eterna pela liberdade.

Motivos para ler:
1- O currículo de Nélida Piñon é um show à parte. Doutora honoris causa de renomadas universidades mundo afora, recebeu conceituados prêmios literários nacionais e internacionais. Foi empossada como imortal pela Academia Brasileira de Letras (1990), convertendo-se na primeira mulher a presidir a casa (1996). Mulher extraordinária;

2- A casa da paixão é um livro que desafiou a visão patriarcal da época. De lá para cá houve avanços, mas esta triste matriz da nossa cultura ainda viceja. A força política “conservadora nos costumes” da extrema-direita brasileira representa um severo ataque aos direitos já conquistados pelas mulheres. O Presidente da República chegou a dizer que se sua própria filha sofresse um estupro, ele seria contra o aborto em caso de concepção. Note o horror. E o horror, senhores e senhoras, está sempre à espreita;

3- Toni Morrison, renomada escritora estadunidense vencedora do Prêmio Nobel, leu A casa da paixão e considerou o romance revolucionário no tratar da sexualidade das mulheres. Um feedback deste calibre é só para quem merece.

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