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Doutor, meu filho não come

26/12/2020
Doutor, meu filho não come | Jornal da Orla

Distúrbios do apetite: problemas da alimentação 

Fome – implica na conservação da vida (genética).

Deve ser satisfeita por ingestão adequada de alimentos que leva á saciedade.

Essa ingestão é regulada pelo apetite, mas enquanto a fome é a resposta natural (inata), o apetite
(também genético) é sujeito a treinamento e distorções.

O comportamento dos pais pode modelar o estilo alimentar dos filhos:

– Insistir, agradar, forçar para comer, pode ter efeito imediato para aceitação maior de
alimentos, mas em longo prazo leva à oposição, o que reduz a aceitação.

-“Termine o que está no prato” exigir que a criança coma mais do que necessita, acarreta:

– Perda do autocontrole
– Distorção da percepção de fome/saciedade.
Consequências:
– Não aceitar alimentos mesmo com fome.
– Aceitar mais do que necessita – caminho para obesidade.

Conceitos básicos:

Anorexia: aquilo que a criança come espontaneamente não é suficiente para o seu crescimento
normal. Pode ser de causa orgânica ou psíquica.

Pseudo-anorexia: a quantidade é suficiente, mas os pais acham pouco e querem que a criança
coma mais. Ocorre mais frequentemente em crianças de constituição miúda em fase de
crescimento lento em que o apetite é naturalmente reduzido e a atividade física é acentuada (2º
ano de vida, pré-escolar).

Anamnese: Faixa etária; atividade; doenças pregressas, humor, problemas de comportamento;
interação pais-criança quando à alimentação, inclusive negligência. História alimentar detalhada –
não aceitar relatos gerais nem apenas citações “do que não come” – perguntar horário, o que come
e quanto come, como é ministrado o alimento, o que come (“belisca”) nos intervalos; fazer lista do
que a criança come com prazer.

Exame físico: impressão geral, P/E, curva de crescimento, desnutrição.

Considere vermelho (ALARME!): diarreia crônica, vômitos frequentes, febres
repetidas, desenvolvimento anormal. Investigue. Considere D. celíaca (peça antitransglutaminase),
anemia (peça hemograma, ferritina), VHS (infecção/inflamação).

Fase crítica para recusa alimentar – as transições: 

 6 meses: passagem do leite de peito/mamadeira para papinha
Conduta: aumentar a fome.
-Reduzir o leite, aumentar o intervalo.
Insistir para criança provar e aumentar gradualmente.

 1 ano: passagem para alimentação da família.Meta: adotar a dieta da família sem seus defeitos.
Dificuldades naturais e suas consequências:
Fase de redução das necessidades alimentares redução do apetite.
Interesse crescente no ambiente preferência por brincar.
Atenção limitada a tempo curto interrompe precocemente a refeição.

 

 2 anos – “os terríveis 2”
Egocêntrica; independência (testa limites) x agarrada aos pais.
Dificuldades alimentares.

Conduta útil na criança que recusa comida habitualmente:

1 º) Com atitude calma e otimista, tentar dar comida por 3 min.
2 º) Descansar, retirar babador, tirar do cadeirão 3 min.
3 º) Reiniciar (babador, cadeirão) como se nada tivesse acontecido, 4 min.
4 º) Descansar 4 min.
5 º) Reiniciar 4 min.
6 º) Descansar 5 min.
7 º) Reiniciar 5 min. encerrar depois de 25min.

No caso de recusa alimentar inicial (neofobia alimentar):

– Não troque de imediato o alimento recusado.
– Insista para que a criança prove um pouquinho (pedacinho) do alimento novo. Aumente um
pouquinho a cada dia.
– Geralmente são necessárias 10 a 15 exposições ao alimento novo para que a criança passe
aceitá-lo.
– Alternativa – ministrar no mesmo prato um alimento que a criança goste e um pouquinho do
alimento novo; este vai ser aumentado progressivamente.

Criança com apetito limitado sem causa orgânica:

1) Criança normal que come pouco, o suficiente para seu bom estado nutricional e crescimento
adequado. Risco: a ansiedade dos pais levarem a contra producentes métodos coercitivos.
2) Crianças vigorosa com pouco interesse na comida; criança muito esperta e ativa, mais
interessada em suas atividades que na comida; satisfaz-se rapidamente e se distrai da comida.
3) Aceitação alimentar seletiva. Resiste a introdução de alimentos novos (neofobia alimentar
persistente); recusa determinados alimentos por causa de sua aparência, cor, textura, sabor,
cheiro.

Formas frequentes de apresentação da queixa materna (QM) seu respectivo
diagnóstico (D) após investigação:

1) QM: “meu filho não come nada”
D1: Dieta normal para faixa etária.
Conduta: explicar, mostrar a curva, tranquilizar, valorizar saúde e desenvolvimento.
D2: Dieta “quase normal” com déficit de Vit A, Vit C, Fe, Zn e calorias.
Conduta: Idem a anterior mais correção dos déficits.
2) QM: “meu filho só come porcarias/tranqueiras”
D1: dieta normal (calorias e nutrientes) embora não ortodoxa.
D2: Dieta deficiente em alguns nutrientes.
Conduta: semelhante ao caso 1, considerar suplemento nutricional.
3) QM: “Meu filho não come nada, nada, nada, nada”
D: Anorexia seletiva: dieta láctea e quase exclusiva.
Variante 1: distorção grave com dieta praticamente láctea exclusiva. Conduta: restrição de leite,
complemento de ferro e zinco.
Variante 2: caso moderado.
Conduta: complementação de vitaminas, Fe e Zn.
4) QM: “meu filho não come”.
D: Anorexia verdadeira
A criança está com o seu instinto de fome adormecido e perdeu a alegria de comer.

 

Conduta:

– Despertar o apetite (deixar passar a fome programada);
– Recuperar o prazer de comer – oferecer o que a criança gosta em ambiente agradável, com
estímulos e elogios.
Suspender a alimentação (mamadeiras) que a criança toma dormindo.
– Complemento dos nutrientes (Fe, Zn, A, acido fólico).
– Em todos os casos, considerar o uso de suplementos nutricionais (proteína + carboidratos +
gordura + sais e vitaminas).
Na presença de sinais de alarme, investigar a causa. Considere:
– Criança deprimida. Quase não sorri, não balbucia, não faz contato olho a olho.
– Doença orgânica – Não esquecer doença celíaca.
*Nutren-active, Pediasure, Fortini

 

Dr. Jayme Murahovschi

Professor Livre-docente em Pediatria Clínica
1 º Professor de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas de Santos
(1971-2006)
Autor do livro Pediatria: diagnóstico + tratamento. 7a. edição
Pediatra geral convicto e a atuante

 

Foto: Freepik 


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