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Polícia Federal abre a tampa do bueiro das fake news

30/05/2020 Da Redação
Polícia Federal abre a tampa do bueiro das fake news | Jornal da Orla

A operação da Polícia Federal deflagrada na quarta-feira (28) assemelhou-se à retirada da tampa de um bueiro, de onde saem dezenas de baratas. Após meses de investigação, os agentes (profissionais de carreira) coletaram vasto material que indica uma organizada e ampla rede de produção e difusão de mentiras e ameaças pela internet.

A propagação de boatos, mentiras e ataques à honra (crimes tipificados no Código Penal, que data de 1940), principalmente na política, não é novidade de nossos tempos. Antes, eram os famigerados panfletos apócrifos (anônimos) que destruíam reputações às vésperas de eleições, sem dar chance ou tempo da vítima se explicar e revelar a verdade. 

Com a internet, o poder de difusão de mentiras ganhou alcance e velocidade assustadores. Caso emblemático foi o ocorrido na campanha presidencial de 2014, quando a então candidata Marina Silva aparecia nas pesquisas em ascensão e sofreu uma implacável ataque capitaneado pelo marqueteiro petista João Santana. 

Nos anos mais recentes, a situação se agravou com o uso de sofisticadas tecnologias e o agravamento do conteúdo das mensagens de ódio e mentiras. 

 

Os 29 mandados de busca e apreensão no âmbito do inquérito 4.781 do Supremo Tribunal Federal  (STF) visam dar prosseguimento a investigações da Polícia Federal que reforçam indícios apurados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Fake News, instalada em setembro do ano passado: uma ampla rede de divulgação de informações falsas e apologia ao ódio e à violência, financiada por um grupo de empresários e operada em empresas privadas e até mesmo de dentro de gabinetes parlamentares. 

Entre os investigados estão os empresários Luciano Hang (dono da rede de lojas Havan) e Edgar Corona (dono das academias Smart Fit), e parlamentares como Bia Kicis, Carla Zambeli e Luiz Phillipe de Orleans e Bragança (todos do PSL). 

Os empresários são suspeitos de financiar o funcionamento de um sistema de disparo automático de mensagens, por intermédio de perfis falsos, robôs (bots), capazes de enviar milhões de mensagens pelo WhatsApp e realizar postagens nas redes sociais. 

O conteúdo das imagens são idênticos, mas postados por centenas de “pessoas” diferentes, ao mesmo tempo. 


No inquérito, a Polícia Federal identificou o vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, como um dos articuladores do esquema criminoso de fake News. 

 

Fake News não é liberdade de expressão
O principal argumento utilizado pelos acusados de integrar esta rede de disseminação de informações falsas é o de estariam exercendo o direito de liberdade de expressão. No entanto, trata-se de uma alegação que não se sustenta, pois nenhuma mensagem pode infringir a lei (injúria, difamação, calúnia, ameaça, incitação ao crime etc).

 

Como droga
Mas por que notícias falsas acabam sendo aceitas como verdadeiras por tanta gente? Segundo o psiquiatra, Claudio Martins, diretor da Associação Brasileira de Psiquiatria, a pessoa que compartilha fake News se comporta como um usuário de drogas. "Quando ela recebe uma notícia que a agrada, são estimulados os mecanismos de recompensa imediata do cérebro e dão uma sensação de prazer instantâneo, assim como as drogas. Ocorre uma descarga emocional e gera uma satisfação imediata. Isso impulsiona a pessoa a transmitir compulsivamente a mesma informação para que seu círculo de amizades sinta o mesmo. Por isso, há os encaminhadores compulsivos", explica o psiquiatra.

Segundo ele, a sensação de euforia causada pelas notícias falsas impede o desenvolvimento de um senso crítico em quem as recebe, que não desconfia e muito menos checa a veracidade da informação.

Contra-ataque às fake News
Após um período de perplexidade, começaram a surgir iniciativas para combater a difusão de mentiras pela internet. 

DETECÇÃO DE ROBÔS
Criado pelo americano Christopher Bouzy, o Bot Sentinel é uma plataforma que rastreia as redes sociais e consegue identificar perfil falsos. Utiliza inteligência artificial para analisar as características do perfil que posta as mensagens, os termos utilizados em seu conteúdo e a quantidade de vezes que este mesmo conteúdo é publicado, entre outros fatores. Para saber se uma mensagem foi disparada por um robô, acesse botsentinel.com e pesquise o perfil

 

CHECAGEM DE FATOS
Diversos sites se dedicam a pesquisar e identificar informações falsas. Os principais são aosfatos.org, boatos.org, e-farsas.com, Uol Confere, Estadão Verifica e Agência Lupa. 

 

CORTE NA PUBLICIDADE
Diversos sites que disseminam notícias falsas se beneficiam de mecanismos automáticos de publicação de anúncios: as agências de publicidade direcionam as mensagens de seus clientes levando em conta apenas a audiência do site, sem se preocupar se eles divulgar conteúdo criminoso. Um sucesso nos Estados Unidos, o movimento Sleeping Giants vem ganhando forla no Brasil. Trata-se de uma estratégia para denunciar à empresa anunciante que sua publicidade está sendo veiculada em sites divulgadores de Fake News ou mensagens de ódio. No entanto, parte do anunciante decidir se proíbe a veiculação de sua marca no site ou não. Caso não considere isso um problema, pode ter um maior: sofrer o boicote de clientes que não concordam com esta postura.