Datas Comemorativas

Treze retratos

23/01/2015
Treze retratos | Jornal da Orla
Listas são sempre injustas, subjetivas e insuficientes. Eleger personalidades que evidenciam a diversidade, o talento e as particularidades da alma santista é uma tarefa ainda mais árdua -para não dizer impossível. Ainda assim, destacamos personagens que ajudam a explicar o que faz de Santos um lugar tão particular.

Piloto do porto (foto acima)

Nestes 46 anos em que trabalha no maior porto do hemisfério sul, o prático Fábio Melo Fontes, o mais antigo em atividade em Santos, acompanhou as profundas mudanças no complexo portuário e na própria cidade. Ele comandou quase 27 mil manobras, levando e trazendo gigantes de milhares de toneladas para o cais. “O porto modernizou-se profundamente, os navios se modernizaram em sua arquitetura, a cidade foi muito mais bem urbanizada, a profundidade do porto aumentou muito, a tonelagem movimentada anualmente também cresceu enormemente”, constata. 
 
Os números do gigante santista falam por si. No ano passado, foram movimentadas 111,1 milhões de toneladas de carga. O Porto de Santos foi responsável por 25,3% da balança comercial brasileira (US$ 116,1 bilhões, do total de US$ 419,44 bilhões).
 
E o horizonte é promissor. A tendência é aumento constante no volume de contêineres, nos quais são transportadas cargas com maior valor agregado. Em 2014, foram 3,6 milhões de TEU (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés). “O futuro do porto de Santos é certo, brilhante, consistente, promissor. Não tenho dúvida de que, por muitos séculos, o Brasil vai precisar dos serviços deste porto. Ele é muito importante”, completa Fontes.
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Imperador do coco
O sergipano veio para Santos na década de 80 com o sonho de oferecer uma vida mais confortável para sua mãe. De água de coco ele nunca tinha ouvido falar, mas apostou na fruta como atalho para chegar ao seu objetivo. No início, José vendia pouco mais de 50 cocos por dia nas praias da cidade. “As pessoas não estavam acostumadas a tomar água de coco e, sim, refrigerante. Por isso, o coco era pouco divulgado”.
 
Com perseverança e muito trabalho, conseguiu o primeiro quiosque e o reconhecimento entre os colegas de profissão. Assim, quando se fala em quiosques da orla de Santos, logo se vem à mente: Zé do Coco. “Eu viajo pelo Brasil e posso dizer que nossos quiosques estão entre os melhores do país. Eles têm um clima familiar”. 
 
Hoje, Zé vende mais de 4 mil cocos por dia, mas garante que as cocadas criadas por sua ex-companheira de trabalho e de vida, Rosemeire, fazem mais sucesso do que a própria água de coco. “A gente recebe mais santistas do que turistas aqui no quiosque. Eu amo essa cidade. Tudo o que tenho, consegui aqui”. E o sonho? Está mais do que realizado. “Minha mãezinha está lá em Sergipe. Mas gosta de vir a Santos para passear”.
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Pioneiro da prancha
Francisco Alfredo Alegre Araña é uma lenda viva do surfe santista. O currículo extenso (afinal, são 50 anos no esporte), inclui o título de primeiro surfista profissional do estado de São Paulo e fundador da primeira escola pública de surfe do Brasil. A trajetória da modalidade em Santos se confunde com a da carreira de Cisco. E, por trás dos olhos verdes e do sorriso sereno, há muita, muita história. “Aqui, onde hoje é a Escola de Surfe, funcionava um posto da Polícia Militar. Nossas pranchas eram apreendidas pelos policiais, porque não podíamos praticar o surfe nas praias de Santos”, relembra.
 
Eram outros tempos. Hoje, o surfe é um dos símbolos da cidade. A Escola Radical, criada em 1991 por Araña, é referência para outros estados brasileiros e, além de formar muitos atletas, tem, entre suas propostas, a inclusão social. “Nós temos alunos de 5 a 80 anos. Fomos os primeiros a ter prancha adaptada para cegos e, agora, temos equipamento para atender os deficientes físicos. Espero que a Escola perdure por mais 30 anos”. 
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Ginga, elegância e sabedoria
Ele nasceu Roberto Teles de Oliveira, em Santa Rosa de Lima, Sergipe. Mas foi em Santos que se tornou Mestre Sombra. Sua colaboração para a difusão da capoeira e militância à frente do movimento negro o consagraram como uma das principais personalidades da cidade e, mais do que isso, posicionaram Santos em local de destaque no cenário nacional da capoeira.  Ao longo de carreira, ensinou a história, conceitos e passos do esporte a cerca de sete mil alunos. Entre as suas contribuições, também está a criação do Conselho Municipal da Comunidade Negra. 
 
A história de amor entre a cidade e Mestre Sombra vem de longe. “Quando pequeno, ouvia os jogos de futebol em um rádio que meu pai tinha. Era um sonho conhecer a terra que consagrou Pelé”, relembra Sombra, que, assim como o rei do futebol, leva o nome da cidade por todos os países que visita, como Estados Unidos, França, Alemanha, Inglaterra, Grécia, entre outros. “Os gringos amam futebol, mas, ao enfrentar a seleção brasileira, eles querem vencer. Na capoeira, não há competição, há equilíbrio e harmonia. Assim, eles não querem vencer e, sim, apenas pertencer. A capoeira une as pessoas”, diz, com maestria.
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O jardineiro fiel
O nome, Voluciano dos Santos, é próprio e sugere a figura de um senhor já avançado no tempo, mas o jardineiro mais antigo em atividade na praia de Santos é ainda um cinquentão (56). A aposentadoria já foi solicitada e, nos planos do experiente jardineiro, está a compra de um sítio no litoral sul, onde pretende plantar e aplicar os conhecimentos adquiridos em 37 anos de serviços, a maioria deles plantando, regando, podando e recriando o jardim de praia mais extenso do mundo.
 
O jardim de Santos, por sinal, é a paixão de Voluciano, hoje encarregado da equipe que faz a manutenção do trecho entre o canal 1 e a Divisa. Ele garante que sabe identificar quase todas as centenas de espécies plantadas no jardim e mostra com orgulho os recentes canteiros floridos que criou com suas mãos.  Voluciano é de Sergipe, chegou a Santos aos 18 anos e depois de trabalhar em uma empreiteira na Cosipa entrou na Prodesan como ajudante de serviços gerais. Em 1991 foi efetivado no funcionalismo municipal.
 
Difícil, o trabalho não é, ele garante, mas é preciso estar sempre atento, principalmente em um jardim exposto ao sol, vento, salinidade. Nos últimos dias, sua preocupação tem sido o excessivo calor. “As plantas sentem. Fico com dó delas”, diz, com o carinho de um pai zeloso – ou, talvez, de um avô.
 
Uma raquete ímpar
O tamboréu veio da Itália, em 1937, diretamente para as areias de Santos. Aqui, passou por adaptações até se tornar um símbolo da cidade. “Era um frescobol sem rede e a bola parecia uma peteca. Os santistas agregaram elementos do tênis, como o tamanho da quadra e a rede”, explica o diretor da Associação Nacional de Tamboréu, o santista Edemir Ribeiro.
 
Nika (como é conhecido entre os adeptos da modalidade) pratica o esporte há mais de 20 anos e é um dos poucos santistas que fabricam raquetes de forma artesanal. “Não existem restrições para praticar o tamboréu. Com mais idosos procurando o esporte, nós criamos uma raquete específica para eles, mais leve, feita com madeira e rede de tênis”.
 
Para ele, Santos tem vocação nata para os esportes e, por isso, o tamboréu se adaptou tão bem na cidade. “Hoje, o tamboréu é praticado em São Paulo, Campinas e até Brasília. Mas ele é cara de Santos. É um esporte de praia, genuinamente santista”. 
 
Grupo Macuco, um gigante na construção
Tudo começou há 34 anos, com a primeira obra na cidade: duas casas sobrepostas, na Rua Santos Dumont, 5 e 5A, no bairro do Macuco. Desde então, outros dois mil imóveis, entre casas, apartamentos e conjuntos comerciais, fazem parte da história do Grupo Macuco, que em 2014 registrou seu melhor ano financeiro e já projeta um grande 2015: começa o ano com 13 terrenos e projetos em aprovação ou já aprovados.
 
À frente dos negócios está o engenheiro José da Costa Teixeira, diretor-presidente do grupo, que se orgulha de ter nascido no bairro. Antes de abrir a empresa em Santos, em 1981, ele atuou em Mogi das Cruzes, Salesópolis, Guararema e Suzano com a construção de casas, instalações siderúrgicas e outros empreendimentos. De volta à cidade, ele trabalhou na antiga Cosipa ao mesmo tempo em que iniciava construções na Baixada Santista.
 
O grupo, formado por três construtoras/incorporadoras e duas empresas de participação, tem hoje 350 funcionários. Em 2001, a empresa obteve a certificação ISO 9000 e estabeleceu uma política de qualidade que é hoje uma das garantias do sucesso junto ao público.
 
 
A beleza da arte
Se o Balé da Cidade de Santos é reconhecido mundialmente, o mérito é, principalmente, dela. Filha da bailarina América Ribeiro, Renata Pacheco é um exemplo do vigor da produção cultural santista, com sua criatividade, originalidade, profissionalismo e, como toda santista nata, charme. 
 
A consagrada trajetória de 18 anos de carreira elevou a cidade a um alto patamar no quesito dança. São mais de 1.500 títulos conquistados por Renata e equipe, incluindo o Youth American Gran Prix, uma das mais importantes competições de balé do mundo, conquistada em 2006, em Nova York. Para a bailarina, Santos respira cultura. “A cidade é um celeiro para grandes artistas, seja na música, dança e no teatro. Acredito que ainda faltam espaços e oportunidades para atores e atrizes, por exemplo. Em Santos, há muita gente boa e competente”, explica.
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Mestre das telonas 
A história de amor entre a cidade de Santos e a sétima arte vem de longe. A primeira referência do cinema em terras santistas é de 1897. O município já teve o maior número de cinemas por habitante do Brasil, época em que o Gonzaga era conhecido como Cinelândia. E, após um período de decadência, com o fim de casas tradicionais, a cidade retomou sua vocação para as telonas e o volume de produções cinematográficas feitas por aqui é tão grande, que uma edição anual do Curta Santos – Festival de Curtas-Metragens, já não é suficiente. 
 
Se alguém deve ser “culpado” por esse movimento, o nome dele é Toninho Campos. O empresário é reconhecido e premiado por incentivar a cultura na Baixada Santista, cedendo espaço do seu Cine Roxy para festivais, projetos teatrais, estreias de documentários, curtas, entre outras produções locais. 
 
Sua principal façanha foi a reinvenção do octogenário empreendimento, com os investimentos em tecnologias de som e imagem, que fez com que os santistas voltassem a frequentar as salas de cinema, reacendendo a velha paixão.
 
Wikipédia do samba
O jornalista, historiador e pesquisador José Muniz Jr. é uma lenda viva do samba e do Carnaval santista. Desde que debutou no carnaval de 1940, na Praça Mauá, até ostentar o merecido título de Marechal do Samba, Muniz atua para que os registros históricos da cultura de Santos não sejam perdidos. 
 
Dos antigos carnavais, lembra com emoção: “Eram diferentes de hoje. Para ser considerado um bamba do samba, era preciso passar por provas de fogo. Os instrumentos eram feitos artesanalmente, alguns com couro de gato, e as fantasias, de chitão. A música era cadenciada e era possível escutar a voz dos puxadores de samba há dois quarteirões. E eles cantavam sem microfone!”, ressalta. 
 
Santos sempre foi uma cidade “batuqueira e carnavalesca por excelência”, como ele gosta de falar. “Na nossa cidade havia blocos, ranchos, cordões, chorões e tribos carnavalescas, além de carnaval de salão e escolas de samba”, explica.
 
O jornalista é dono de dezenas de artigos e livros sobre o carnaval santista. “Eu escrevo para preservar a memória do samba. Hoje, os mais antigos não são respeitados pelos sambistas mais jovens. O carnaval se tornou um espetáculo hollywoodiano”, lamenta. 
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Grãos de ouro verde
Engenheiro químico por formação, o corretor de café Eduardo Carvalhaes, 63 anos, está à frente de um dos mais antigos escritórios de corretagem de Santos, aberto em 1918. Para ele, Santos e o café têm tudo a ver, afinal a necessidade de escoar o produto plantado no interior motivou a implantação da ferrovia, a construção do porto, criou empregos, fez brotar o dinheiro para a abertura dos canais de drenagem e construiu fortunas. Ou seja, transformou e modernizou a cidade.
 
“Quase 80% da exportação do café passam pelo Porto de Santos, que continua o maior porto exportador do produto no mundo. A diferença é que hoje o café chega a Santos praticamente pronto para embarcar, tanto que a cidade tem um único armazém. Muitos empregos foram para outros lugares, mas Santos prossegue como a principal praça de negócios de café”, conta o corretor.

Carvalhaes lembra que o café continua sendo importante na balança comercial brasileira, mas perdeu postos para outros produtos de exportação, como soja, carne, madeira e açúcar. “Até 1960, mais de 50% da receita cambial do Brasil vinham da exportação de café. De lá para cá, a economia se diversificou, o que não significa que diminuiu a produção do café. Em 2014 foi registrado o recorde histórico em volume exportado: foram 36 milhões de sacas, 79% embarcadas no Porto de Santos”. 
 

 
Projetista da cidade
Poucas cidades mudaram seus espaços públicos tanto em tão pouco tempo. Remodelação da avenida Ana Costa, ciclovia na orla, revitalizações do Teatro Guarany, da Concha Acústica, do boulevard na rua Othon Feliciano. 
 
Por trás destes projetos está o arquiteto e urbanista Carlos Prates, o mais antigo em atividade na Prodesan. No entanto, ele revela especial entusiasmo com um outro grande projeto que mudou radicalmente a história da cidade: os canais concebidos por Saturnino de Brito. Para Prates, o sanitarista era um homem à frente de seu tempo. “Quando projetou os canais, Saturnino trouxe um grande benefício à mobilidade urbana. Eles definem o zoneamento da cidade, facilitando a fluidez do tráfego entre o centro e a orla”, explica. 
 
O arquiteto acredita que os canais devem ser conservados, assim como as simbólicas muretas. “Entendo que as passarelas de pedestres poderiam ser mais largas, não só para a passagem, como também para um simples descanso ocasional ou apreciação do canal e suas garças”. 
 
Prates destaca a beleza dos canais. “Alguns deles são poéticos, como o canal 3, com frondosas árvores, e o canal da avenida Barão de Penedo, que se caracteriza como uma alameda charmosa “.
 
 
Um garçom bem diferente
O biólogo marinho Mateus Goes, 22 anos, é um dos responsáveis por alimentar a maior atração do Aquário de Santos: o leão-marinho Abaré-Inti, que consome cerca de 12 kg de pescado por dia, nos quatro horários fixos de refeição: 9h30, 11h30, 14h30 e 16h30. Neste verão, o esperto “garoto” de 9 anos e 320 kg, nascido no Zoológico de São Paulo, está tendo algumas regalias para suportar o intenso calor: sorvete de sardinha, blocos de gelo e até um chuveirinho no deck onde fica quando sai da água, para diminuir a temperatura no piso.
 
A hora da boia de Abaré-Inti é também o momento mais divertido para o público e para os tratadores. “É minha felicidade. Os visitantes adoram e a gente também se diverte. De vez em quando ele me dá um banho, uma espirrada”, conta Mateus, que cuida dele e de outros animais do Aquário de Santos, o segundo parque turístico mais visitado do estado de São Paulo.  
 
Inaugurado em 1945, é o primeiro aquário do país e expõe centenas de espécies raras e curiosas da fauna aquática de diversas partes do mundo. São milhares de animais, de águas doce e salgada, de pequenos invertebrados até mamíferos marinhos, que vivem em ambientes naturais reconstituídos, entre eles tubarões, raias e pinguins. O parque também realiza pesquisas científicas, resgates e recuperação de animais marinhos.
 
 
Depoimentos a Bárbara Camargo, Isabela Haiek e Mírian Ribeiro  Fotos: Leandro Amaral