Sala de Ideias

Birkin x Gainsbourg

18/07/2023
Reprodução

Adilson Luiz Gonçalves

Jane Birkin, a mais francesa de todas as inglesas, faleceu em 16 de julho de 2023.

Ela interpretou, junto com seu, então, companheiro, Serge Gainsbourg, no final dos anos de 1960, a música “Je t’aime… Moi, non plus”, uma conversação erótica com fundo musical, que foi sucesso mundial.

Birkin e Gainsbourg eram de certa forma, extremos opostos. Ela, de uma beleza estonteante. Ele, um tipo desleixado, fumante e alcoólatra compulsivo. Porém, antes de conhecer Serge, Jane já tinha seu lado polêmico, pois, protagonizara um nu frontal no filme “Blow-Up” (1966). Repetiu a cena em outro filme, com Serge, numa banheira.

Há que se reconhecer que essa aparência e postura, dele, e a beleza e ousadia, dela, contribuíram para que ambos se tornassem ícones, na França. Juntos, tiveram Charlotte.

Morei na França entre 1985 e 1986, e lembrava de duas músicas de Serge, ambas cantadas por Jane, mas não tinha ideia de sua relevância no ambiente artístico francês. Ele chegou a ser homenageado pela Legião Estrangeira!

Ele era presença constante em todas as cerimônias de premiação artística, sempre com aparência deprimente, fumando um cigarro depois de outro. Quando morreu, em 1991, um amigo explicou sua causa mortis: “Ele bebeu cigarros demais!”.

Apesar disso, ele amou algumas das mulheres mais belas de seu tempo. Além de Jane, ele teve relacionamentos com Brigitte Bardot, Catherine Deneuve e Juliette Gréco.

Compositor tão profuso quanto inovador, suas músicas foram cantadas por elas e outras beldades, como: Françoise Hardy, France Gall, Catherine Deneuve, Anna Karina, Isabelle Adjani, Vanessa Paradis e Charlotte.

Algumas músicas que ouvira, na infância, soube que também eram dele: “Bonnie & Clyde” (com Bardot), “Comment te dire adieux” (com Hardy, uma preciosidade!). Recentemente, assistindo “A forma da água” (2017), ouvi “La Javanaise”.

O “début” artístico de Charlotte, aos 12 anos, como não poderia deixar de ser, foi mais uma polêmica de Serge. Juntos, cantaram “Inceste de citron” num vídeo em que insinuam um relacionamento amoroso entre pai e filha. Um escândalo!

Pouco tempo depois, ela foi premiada numa edição do César (o “Oscar” francês). Ao receber o prêmio, passou a chorar compulsivamente, estática. Imediatamente, Serge subiu ao palco para ampará-la, fazendo um discurso de pai carinhoso e protetor. Nesse dia, ele não acendeu nenhum cigarro e pareceu extremamente sóbrio. O escândalo tinha um quê de midiático…

No universo artístico francês, que sempre primou mais pela arte do que pelas aparências, sobretudo no caso de homens, Serge esteve à altura de outros “feios” famosos, como Jean Paul Belmondo, Jean Gabin e Gérard Depardieu. Aparentemente, o talento está acima de qualquer estereótipo, na França.

E foi com Eddy Mitchell, ator e cantor que mais parecia um jogador de rugby, que Serge gravou “Vieille Canaille”, música em que trocam ofensas impagáveis, em ritmo de “big band”.

Jane, depois do fim do relacionamento com Serge, seguiu carreira artística sem maiores polêmicas. O fato de ter feito a maior parte de sua carreira na França criou algum ressentimento em seu país de origem, Inglaterra.

A reconciliação veio no filme com “Leave all Fair” (1985), contracenando com John Gielgud.

Jane e Serge tiveram uma história, juntos e individualmente, que marcou o cenário musical e cinematográfico francês e, em certa medida, mundial. Mas, nada é eterno.

“C’est la vie”.

*Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro e pesquisador universitário e membro da Academia Santista de Letras.

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