Porto

Hora de discutir a relação

27/01/2023
Divulgação/Santos Port Authority

O Porto de Santos completa 131 anos de existência na quinta-feira (2) em um momento mais do que oportuno para discutir a relação do maior complexo portuário do Brasil com as cidades que o abriga.

Do ponto de vista econômico, o Porto de Santos, vai muito bem, obrigado. Responsável por 28,8% da balança comercial do Brasil, ele vem batendo recordes sucessivos. Em 2022 foram movimentadas 162,4 milhões de toneladas, 10,5% a mais que o resultado de em 2021 e 22% superior em relação a 2018, quando foram movimentadas 133,2 milhões de toneladas.

Foram exportadas 118,7 milhões de toneladas e importadas 43,7 milhões de toneladas. Em 2022, foram 5202 atracações de navios, crescimento de 7,1% em relação a 2021. Em 2018, foram 4.853 cargueiros.

A força do agro
Mais uma vez, o Porto de Santos refletiu a força do agronegócio brasileiro, com uma vigorosa exportação de commodities — soja, milho, celulose, sucos cítricos e carnes.

Cargas com valor agregado

A movimentação de contêineres bateu recorde histórico — mais um. Foram 5 milhões de TEU (unidade equivalente a 1 contêiner de 20 pés) no ano, o que significa aumento de 3,2% em relação a 2021 e 21% em quatro anos (quando foram 4,12 TEUs).

A Santos Port Authority comemora os resultados mas adverte que o complexo portuário está chegando perto perto de sua capacidade máxima para movimentação de contêineres, que é de 5,3 milhões de TEUs/ano. Por isso, aposta em novos projetos, entre eles o novo terminal de contêineres, STS 10, que aumentará a capacidade para esta carga em 2,3 milhões TEU/ano.

DR com as cidades

Ao mesmo tempo em que a atividade econômica experimenta um círculo virtuoso, representantes de outros segmentos importantes demonstram descontentamento como acontece o processo decisório do Porto de Santos —que invariavelmente impacta as cidades que o abrigam. Há dois exemplos notáveis: a proposta de desestatização da autoridade portuária e o Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) do complexo portuário.

Desestatização a sete palmos

Desenvolvido com velocidade e muito entusiasmo na gestão anterior do governo federal, o processo de privatização da SPA (ex-Codesp) foi definitivamente enterrado pelo ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França. Ela pondera que é possível realizar a concessão de serviços como a dragagem mas é inconcebível transferir uma função de estado para ‘a iniciativa privada. “Seria como abrir uma concorrência e entregar a autoridade da Policia Federal ou da PM ao poder privado”, argumentou.

Chama a atenção o rumo que o processo vinha tomando, inclusive a pressão de parlamentares e veículos de comunicação, que sustentavam que a construção de um túnel sob o canal do estuário ligando Santos a Guarujá depende da desestatização.

Uma coisa não tem nada a ver com a outra.

A chamada ligação seca é uma obra urbana, de caráter metropolitano, não é uma prioridade logística para o Porto de Santos. Além disso, pode ser viabilizada com recursos públicos. O próprio ministro Márcio França aventou esta possibilidade em visita a Santos na semana passada.

Em entrevista ao OrlaPlay, o deputado federal eleito Paulo Alexandre Barbosa argumentou que a obra pode ser custeada com recursos da própria autoridade portuária, já que tem registrado sucessivos recordes. Ele lembrou que os projetos executivos e ambiental do empreendimento, orçado em cerca de R$ 3 bilhões, já foram aprovados.

Plano sem diálogo

Aprovado em julho de 2020, o Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) vem tendo vários pontos questionados. A principal reclamação é a de que foi elaborado sem uma consulta real da comunidade portuária (empresas, sindicatos e poderes públicos locais), o que resultou na elaboração de projetos que podem trazer impactos negativos.

Um deles é o STS-53, que prevê a instalação de um terminal de fertilizantes para movimentar 5,6 milhões de toneladas por ano. Os críticos ao projeto indicam que ele traria riscos de segurança, por movimentar carga inflamável (até explosiva) e também inviabilizaria a operação do Terminal de Passageiros.

O prefeito de Santos, Rogério Santos, manifestou publicamente sua discordância com a dinâmica deste processo. Ele apontou preocupação com o funcionamento do terminal de passageiros, a garantia de empregos e da atuação de pequenos operadores nos cais públicos.

Novo governo, nova mentalidade

Com a derrota de Jair Bolsonaro, os critérios de tomada de decisões no novo governo devem mudar. A expectativa é haver mais diálogo entre os atores do segmento portuário, buscando estabelecer uma relação harmônica entre a atividade portuária, as zonas urbanas e outros setores econômicos da região.

Um dos temas já em discussão é a remodelação do Conselho de Autoridade Portuária (CAP), para que representantes das prefeituras, trabalhadores e empresários tenham participação deliberativa, e não mais consultiva (ou “decorativa”, como classificam alguns players hoje excluídos do processo de decisão).

Os próximos desafios

É consenso entre os diversos atores do porto que é preciso agilizar processos para facilitar os investimentos necessários para a expansão da atividade econômica — públicos ou privados. Entre eles, melhorias nas vias de acesso: rodoviárias, ferroviárias e aquáticas, em especial esta última, com as dragagens de manutenção e aprofundamento do canal do estuário.

As novas concorrências públicas devem aliar velocidade, transparência e segurança jurídica, sob pena de ao invés de avanços, o porto sofrer com retrocessos.