Crônica

Tributo a Luiz Alca de Sant’anna

12/04/2024
Tributo a Luiz Alca de Sant’anna | Jornal da Orla

Quem acompanhou o Luiz cronista e colunista sabe da inteligência e da cultura superlativas dele. Quem frequentou as aulas de dinâmica de grupo sabe do calor humano e da capacidade de transmitir reflexão e conhecimento. Quem trabalhou com ele em instituições sabe do imenso potencial de doação e acolhimento. E quem conviveu pessoalmente sabe do carisma, da coragem e da educação requintada, que se materializava em impressionante simplicidade.

A coragem se mostrou já no início da vida adulta. Formado em Direito, filho de delegado, Luiz tinha uma carreira clássica desenhada. Um caminho seguro. No lugar dele, optou, no começo dos anos 70, por estudar a dinâmica de grupo de Ortega y Gasset e de Henry Bergson e desbravar uma área que até hoje, 50 anos depois, é difícil de definir: comportamentalismo. Enfrentou a turbulência política e o preconceito contra atividades não-tradicionais.

O carisma se traduziu no sucesso não só da dinâmica de grupo mas também na comunicação. Como um rei Midas da evolução pessoal e do autoconhecimento, tudo aquilo em que o Luiz tocava se transformava em ouro: palavras, temas, aulas, textos…   

Conheci o Luiz no começo dos anos 80. Ele montava, junto com o crítico de cinema Rubens Ewald, uma equipe de universitários para representar o Clube XV, de Santos, num torneio de conhecimento da Rede Cultura de Televisão, em Sâo Paulo: o Quem Sabe, Sabe. Tive o privilégio de participar daquela equipe de universitários junto com o ballet do clube. O XV arrasou e ganhou o torneio estadual daquele ano.

Na convivência, passei a admirar esse ser humano extraordinário. Aprendi muito com o Luiz. Assimilei conhecimentos que me ajudaram muito na vida e que até hoje, compartilho em palestras, textos e conversas.

Lembro de uma palestra do Luiz sobre Inteligência Emocional, na época do lançamento desse conceito por Daniel Goleman. Nunca mais esqueci da linha do hábito e da zona de conforto. Acima delas o interesse e a motivação, que abrem espaço, nessa ordem, para o entusiasmo, o envolvimento e a paixão. Abaixo, o desinteresse e a desmotivação que vão levar ao tédio, à apatia e, por fim, à depressão.

Também está na tela da minha memória um texto em que ele descreve o caminho para a felicidade dos vedas, um povo da antiguidade. As definições que o Luiz dá para os quatro pilares dessa filosofia estão impregnadas de clareza e brilho. A integridade: concentração para se colocar por inteiro em tudo o que se faz. A simplicidade: não se achar mais do que ninguém. A sinceridade: não trair nunca a confiança depositada em você. E a afetividade: saber demonstrar o afeto..  

Luiz publicou as crônicas e colunas aqui no Jornal da Orla por 15 anos, de 85 a 2000. E depois mais 15 anos no jornal A Tribuna, de 2000 a 2015. Neste começo de abril, a Maria José, aluna do Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita, da Casa do Caminho, levou pra mim um livro do Luiz para me mostrar uma crônica em que ele cita uma frase minha.

O livro é o Quem Quiser que Conte Outra. A crônica é O Morto que Voltou. O verso meu que ele diz que gostaria que estivesse escrito numa fita num falso sepultamento dele é:

“Pois a ausência não contém em si o drama

Que a cinza implica ter havido a chama”

Não sabia dessa citação. Fiquei emocionado e bateu em mim uma saudade infinita do Luiz, uma lembrança instantânea da grandeza dele. Tenho certeza que essa mesma saudade e essa mesma lembrança bateram em você que leu esse texto atraído pelo nome do Luiz no título.