Política

Projeto lembra lugares em Santos usados pela ditadura

15/02/2025 Marco Santana
Projeto lembra lugares em Santos usados pela ditadura | Jornal da Orla

Um dos momentos mais emblemáticos do filme “Ainda estou aqui” é a cena mostrando Rubens Paiva sendo levado de sua casa para prestar depoimento, diante do olhar sereno da esposa, Eunice. A personagem interpretada por Fernanda Torres acredita que aquilo era uma coisa banal e o marido voltaria para casa em breve.

Não só não voltou como o corpo desapareceu.

Essa mesma situação foi vivida por milhares de famílias durante a ditadura que castigou o país entre 1964 e 1985. Havia militantes de oposição ao regime ditatorial, sim, mas também pessoas comuns, que foram presas, interrogadas, agredidas, torturadas e mortas.

O ex-deputado federal Gastone Righi, que faleceu em 2019, sustentava que Santos foi a cidade com o maior número de prisõe, cassações políticas e perseguições. Apenas no navio Raul Soares, por exemplo, ficaram confinadas ao menos 263 pessoas, em situações desumanas.

Santos era um alvo preferencial da ditadura devido à quantidade de sindicatos de trabalhadores extremamente articulados. O mais impressionante é que este passado nefasto é ignorado pelos mais velhos, contemporâneos da época de brutalidade, e os mais jovens, que não têm a menor noção do que aconteceu.

E é justamente com o propósito de resgatar esse momento maldito que tramita na Câmara de Santos a criação do “Caminho da Memória, da Verdade e da Justiça”, um roteiro que nada tem de turístico, relacionando lugares que sediaram episódios de covardia que até hoje provocam ódio e nojo.

O projeto foi proposto pela então vereadora Telma de Souza (PT) e agora foi assumido pelo colega de partido Chico Nogueira.
“A memória é escolha e identidade, e quando selecionamos aquilo que queremos que permaneça na memória acabamos por escolher o tipo de sociedade que se quer. O desconhecimento é incompatível com o direito à verdade”, argumenta.

 

Alguns dos locais do Caminho da Verdade

O projeto de Telma relaciona 20 lugares onde aconteceram episódios marcantes e sugere a colocação de placas explicativas. Além de repartições onde ocorreram interrogatórios, prisões e assassinatos, o roteiro inclui também locais que sediaram manifestações contra a ditadura e a favor da retomada da autonomia política de Santos.

 

Casarão na avenida Conselheiro Nébias, 584
Foi sede do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS). Durante anos, abrigou a Ciretran (órgão estadual que cuida do trânsito) e hoje está completamente abandonado.

Palácio da Polícia
Localizado na Rua São Francisco, 136, abrigou interrogatórios, torturas e detenções ilegais.

 


Cadeia Velha, na Praça dos Andradas
Foi usada para prender, interrogar e torturar dissidentes. Entre eles, o pai do ex-prefeito de Santos David Capistrano Filho.

Armazém 8 do Porto
Local onde embarcavam os presos políticos para ficarem confinados no navio-prisão Raul Soares.

Casarão na avenida Presidente Wilson, 14
O imóvel em frente à praia do Gonzaga era a residência da família de Rubens Paiva, tema central do filme “Ainda estou aqui”.