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O avesso da pele

03/04/2024
O avesso da pele | Jornal da Orla

A necessária literatura de resistência  

O secular autoritarismo brasileiro, com suas raízes fincadas no colonialismo escravocrata, ainda se expressa sob diversas formas: ora pelo mandonismo e pelo patrimonialismo; também pela violência, pela corrupção e pelo racismo. Uma das causas da perpetuação dessa miríade autoritária é o falso mito da “democracia racial”, segundo o qual não haveria preconceitos na “acolhedora” sociedade brasileira. Esse discurso, que comodamente quer mascarar o problema, só aprofundou os preconceitos.

Não há como resolver ou amenizar um problema social se ele não for reconhecido de frente. A literatura, como potência intelectual e questionadora que é, sempre fez a sua parte. É com muita seriedade e talento que o romance O avesso da pele trabalha essas realidades por meio de um narrador que refaz toda a trajetória de seus pais, num belíssimo e original exercício narrativo.

Sem ser panfletário, o escritor Tenório atingiu o âmago de questões cruciais que atravessam tantas vidas em nosso tempo. Todas as dificuldades, as alegrias e tristezas, a desgraça também, de tanta gente dessituada num país que nunca foi de todos. Oxalá os novos tempos desfaçam tanta desigualdade e injustiça.

 

Motivos para ler:

1- Jeferson Tenório, carioca radicado em Porto Alegre, integra o rico movimento da nova ficção literária brasileira. O avesso da pele venceu com honras o prestigiado prêmio Jabuti na categoria melhor romance;

2- O livro foi censurado (pasme!) por dirigentes de algumas escolas do Rio Grande do Sul, Goiás e Paraná. A História lembra: de proibir a queimar livros é um pulo. Mas veio a reação espontânea: o livro, pós-censura, aumentou as vendas em 1.400% e passou a integrar a lista obrigatória de importantes vestibulares do país. Em verdade, o extremismo político de algumas tristes figuras não oferece grande perigo: esse movimento reacionário é simplesmente burro demais;

3- Estar no mundo exige compreendê-lo. Para tanto, nossa parca experiência individual é quase irrelevante: não enxergamos grandes problemas sociais pela visão estreita de nossas vidas. Tomar contato com o mundo requer mais. Levar a vida a sério é trabalhoso. Aprender com bons livros e viver dentro da linguagem humana é uma das chaves para abrir as dimensões do mundo e começar a entendê-lo melhor.

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