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O amante

06/03/2024
O amante | Jornal da Orla

O talento autobiográfico de Marguerite Duras 

A francesa Annie Ernaux, Nobel de Literatura de 2022, foi possivelmente a laureada que mais chamou a atenção do público nos últimos dez anos. Sem demérito algum aos Nobéis da última década – dentre eles gigantes como Modiano, Ishiguro, Svetlana Alexievich e Olga Tokarczuk -, Ernaux atingiu com profundidade os corações de leitores do mundo inteiro com um estilo muito próprio: gerou universalidade abordando temas autobiográficos.

Essa forma de construir literatura, entretanto, não é nova. Em seu livro O amante, Marguerite Duras narra a sua adolescência na Indochina francesa (atual Vietnã). Aclamada pela crítica por sua prosa e cinema, foi com o lançamento de O amante que Marguerite, já com 70 anos, arrebatou o grande público. Sua terrível tragicidade choca o leitor: uma mãe tresloucada, um pai ausente, um irmão cruel e o outro frágil, a desgraça financeira e a relação perturbadora com um rico chinês formam o tecido de um livro triste, catastrófico e magnificamente bem escrito.

Eis um digno bestseller, todo trabalhado na dolorosa memória de uma multitalentosa mulher que extraiu um esplendor literário inigualável de sua história pessoal.

 

Motivos para ler:

1- Marguerite Duras (1914-1996), nascida na antiga Indochina e radicada na França, notabilizou-se na escrita, no teatro e no cinema. É dela o roteiro do famosíssimo Hiroshima, meu amor. Sua prosa foi apreciada por Lacan e Barthes; seu cinema, por Godart. Conhecida da cena artística, alcançou o público geral com O amante, com o qual ganhou o cobiçado Prêmio Goncourt;

2- O amante começa e termina em primeira pessoa, com Duras – já idosa, consagrada e alcoólatra – introduzindo o leitor no sombrio espaço de sua adolescência para depois fechar o livro com considerações perturbadoras. Uma mulher brilhante e dotada de uma invulgar sensibilidade para dar palavras ao seu profundo inconsciente;

3- O livro se inicia com uma metáfora do rosto da escritora. Dirá ela que aos 18 anos seu rosto já estava destruído, anunciando ao leitor a desventura que virá. Pessoas próximas relatam que Duras, na fase final da vida, se transformou num ser enigmático, entre o real e a ficção. Talvez esse tenha sido o modo que ela conseguiu viver – quem sabe em paz – seus últimos anos.

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