Em vida, Humberto de Campos desenvolveu uma carreira brilhante como escritor. Tão brilhante que tem uma de suas crônicas incluída entre as cem melhores da Literatura Brasileira. Está nessa coletânea ao lado de gênios como Machado de Assis, Nelson Rodrigues e Rubem Braga.
O texto escolhido é simplesmente delicioso. Nele o escritor tenta dissuadir publicamente um padre amigo dele da ideia de se casar com uma freira.
Depois de morto, Humberto de Campos continuou escrevendo. Como assim, Paulo? Depois de morto?
Sim. É isso mesmo. Os textos passaram a ser psicografados pelo médium Chico Xavier e têm qualidade equivalente aos produzidos em vida. Houve até uma polêmica inédita. A família de Humberto de Campos tentou receber direitos autorais por esses textos pós-morte. A justiça julgou o pedido improcedente. Abriria mesmo um precedente perigoso. País, mães e avós poderiam continuar sendo explorados até depois da morte por certos herdeiros preguiçosos.
Num dos textos psicografados por Chico Xavier, Humberto de Campos conta um episódio interessantíssimo que teria envolvido Jesus e o apóstolo Tadeu. Entre as ações de Jesus, as que mais impressionavam os contemporâneos dele, incluindo os discípulos, eram os exorcismos. O Mestre expulsava demônios instalados em seres humanos com facilidade. E exorcismos são mesmo, até hoje, assombrosos.
Um dia, Cristo ausente, Tadeu foi requisitado a expulsar um demônio do corpo de uma mulher e e tentativa foi um fracasso. No dia seguinte, Jesus realiza o exorcismo e então Tadeu pergunta por que ele não reunia, de uma tacada só, todos os espíritos malfazejos e os convertia ao bem. O discípulo entendia que o Mestre tinha poder para isso.
Depois de um tempo pensativo, Jesus pergunta a Tadeu qual o objetivo da vida dele. Tadeu responde que é construir o reino de Deus dentro do coração. Jesus, então, diz a Tadeu que se a meta era esse aprimoramento pessoal, por que então ele se mostrava mais preocupado com os outros, os espíritos malfazejos, do que com ele mesmo. A questão, inclusive, é central na pregação de Cristo. Em outra ocasião, ele chegou a dizer que é mais fácil ver um cisco no olho do outro do que uma trave no próprio olho.
Percebe-se por aí que é bem mais fácil escrever depois da morte, com a consciência espiritual expandida, desbloqueada dos limites do corpo. Em vida, o escritor se aventurou a orientar publicamente um padre contra o casamento. Pinta a vida matrimonial com tintas sombrias, cinzentas. Ele era casado. E a vida conjugal dele, pela mensagem ao padre, devia ser horrorosa. Ele chega a dizer que não há vingança pior do que a da mulher desiludida pelo casamento.
Nessa época, ainda vivo, com certeza não conhecia esse diálogo entre Jesus e Tadeu que ele mesmo conta, só que depois de morto. Se conhecesse, certamente teria a inspiração de cuidar do próprio casamento com Dona Catarina antes de se intrometer no projeto de casamento do outro.
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