Em entrevista ao programa Jornal da Orla na TV, o advogado, ex-deputado federal e escritor Vicente Cascione fez uma análise do atual momento político e comparou a situação da presidente Dilma Rousseff (PT) com a de Fernando Collor, que foi afastado do poder pelo Congresso Nacional em 1992. Embora seja contra o processo de impeachment de Dilma, ele tem dúvidas de que a presidente termine o seu mandato. Para Cascione, todos os partidos são iguais, mas nunca uma legenda teve sua nudez tão escancarada quanto o PT. “Em um país sério, esse partido não teria condições de eleger ninguém e os que estivessem eleitos, evidentemente, estariam fora do poder”. Na avaliação do escritor, Dilma caminha para o abismo. Veja, abaixo, os principais trechos da entrevista:
O Brasil vive uma situação dramática e estranha. Nos EUA, um presidente em final de mandato, com baixa popularidade, é chamado de pato manco. No Brasil, nós temos uma pata manca, mas em início de segundo mandato. Mais quatro anos pela frente e com a popularidade desabando. E o que é pior: a pesquisa (Datafolha) mostra que milhões de brasileiros consideram a presidente falsa, mentirosa ou desonesta. Fica uma situação muito difícil. Como conduzir o país nessa situação?
Vicente Cascione – Primeiro, no Brasil, os outros são os patos, mas quem paga o pato somos nós. Às vezes por culpa nossa. Porque somos o único país do mundo em que uma pessoa é reeleita para Presidência da República e cinco meses depois todos querem o impeachment dela. Não é normal que ela seja reeleita e depois já esteja na faixa de ser ejetada do poder. Se ela tivesse um Fiat Elba ou se morasse na casa da Dinda provavelmente já estaria fora. Não sei se chega até o final do mandato, e digo mais: não sei se chega na presidência até o final deste ano.
Nós temos dificuldades gigantescas pela frente, um período de ajuste violento com recessão, desemprego. Não seria necessário um estadista para conduzir o Brasil neste momento?
Cascione- Sem dúvida . O grande problema é que em um país sério, com todos os escândalos envolvendo o Partido dos Trabalhadores, com alguns de seus mais importantes personagens, eu não digo que o partido inteiro com todos os seus militantes seja diferente dos outros. Mas nenhum partido teve sua nudez tão escancarada quanto o PT. Em um país sério, esse partido não teria condições de eleger ninguém e os que estivessem eleitos, evidentemente, estariam fora do poder. Se a Dilma fosse a primeira-ministra do Brasil, e o regime fosse parlamentarista, ninguém tem dúvida de que ela estaria fora. E esse é o problema do presidencialismo: é porque as pessoas se agarram na caneta e no cofre, e, quando se penduram, dificilmente são tiradas. Acho que ela não é uma estadista, não tem demonstrado nenhuma habilidade para contornar as crises e para esvaziar a corrupção em um nível desejado. Eu quero dizer que se estivesse qualquer outro partido no poder não seria diferente, porque eu conheço aquilo por dentro. E eu digo há 30 anos: todos os partidos são iguais, porque são feitos de homens e mulheres que são iguais.
Do ponto de vista legal, o impeachment é uma situação drástica, é o limite. Há essa possibilidade do impeachment com base na perda da popularidade ou por que não está fazendo o que prometeu na campanha? Não é necessário algo mais grave para um processo de impeachment, como, por exemplo, o conhecimento e omissão diante da bandalheira?
Cascione – Teoricamente, claro que sim. O impeachment é uma medida extrema e drástica. Mas não é o caso do Brasil. No Brasil, o impeachment acontece até mesmo quando os casos não são graves. Um Fiat Elba e uma reforma no jardim da casa da Dinda tiraram o presidente da República (Collor), que depois foi absolvido pelo Supremo Tribunal Federal. O impeachment, na verdade, é uma forma de golpe que os políticos dão quando querem tirar do poder quem não tem sustentabilidade. Hoje, a fragilidade da presidente e do seu esquema de governo é tanta, que aqueles que querem derrubá-la se valem disso como pretexto. E o pretexto, no Brasil, às vezes é mais importante que o motivo.
Então, em sua opinião, não há motivo para impeachment?
Cascione – De jeito nenhum. Eu estou dizendo que o que deve e pode acontecer é o que aconteceu com o Collor. Se ele tivesse feito o jogo do Congresso Nacional e das forças que mandam no Brasil, ele não teria sido retirado. Ele brigou com a Rede Globo de televisão, com a Folha de S. Paulo, com a Anfavea, Fiesp e a Febraban. Só uma força dessas derruba um presidente, e ele brigou com cinco, então caiu. No Brasil, as pessoas não caem porque há um motivo, caem, porque há pretextos, e porque há muitas forças querendo derrubar aqueles que estão no poder e a Dilma está ajudando…
Com a sua incompetência política e também incompetência em gerir os grandes problemas nacionais…
Cascione – Evidente. Se alguém quer me empurrar para o abismo e eu me afasto do abismo, é mais difícil que me derrubem.
Mas parece que ela está correndo em direção ao abismo, não precisa nem empurrar…
Cascione – Porque é da índole dela, índole do escorpião que não muda a sua natureza. Ela é uma mulher que coloca acima de tudo os seus desejos íntimos, desde que a gente conhece a história da Dilma. E a prepotência e a arrogância são marcas dela, isso eu conheci de perto.
Pelas redes sociais se vêem convocações de manifestações para o impeachment. Qual é o quadro que o senhor vê para o Brasil nos próximos meses?
Cascione – Eu não estou otimista. Eu vejo com apreensão o que está acontecendo no país, não só na política, mas a forma que a sociedade está imersa em todas as crises. Crise de corrupção, crise de violência, crise financeira. Tudo isso está envolvendo a sociedade como um todo. E a sociedade, parte dela, é também grande culpada por tudo que está acontecendo. Porque não pensem que a índole de uma grande parte dos brasileiros não é uma índole absolutamente semelhante à índole daqueles políticos e empresários que todos criticam como corruptos. Há dentro da maneira de ser, de grande parte dos brasileiros, o hábito da corrupção, hábito de levar vantagem. É a Lei de Gerson “melhorada” e com emendas muito bem feitas. Então eu vejo com apreensão. A questão cultural do Brasil é trágica e é isso que me leva a ver com pessimismo o dia de amanhã. A cada dia você vê tudo piorar, pega o vício da violência, por exemplo. A violência, hoje, é uma epidemia fora de controle, por um vírus que ninguém conseguiu identificar, nem isolar.Portanto, não há vacina.
Mas o senhor tentou, quando era deputado, mudar a legislação penal…
Cascione – Mas todas as tentativas fracassaram, inclusive a minha. E a coisa foi em um ponto que o crime organizado (que é a única coisa organizada no Brasil) de um lado e de outro, a delinquência espontânea, aquela que nasce da natureza da sociedade, isto tudo somado leva a uma posição irrefreável do avanço da violência. A cada dia você tem cada vez mais fatos explodindo na nossa cara. E isso, evidentemente, faz com que a sociedade seja uma sociedade doente.
Na outra ponta, um governo incompetente que trata o empresário como se fosse inimigo. Outro dia estava vendo o Conta Corrente, na Globo News, e o jornalista perguntou ao pequeno empresário qual era o seu sonho, e ele respondeu que era vender a empresa e ir embora do Brasil.
Cascione – O número de pessoas que estão indo embora do Brasil hoje já representa o fenômeno de migração. É um fenômeno de migração como o que houve no começo do século XX, quando os estrangeiros vieram para cá. E agora é o contrário. Quando você vê uma grande parte da população, principalmente os jovens, querendo ir embora do país do futuro, é porque esse país não encontrou o seu futuro, e este país não tem o seu futuro. E é trágico que isso aconteça.