A automedicação é uma prática corriqueira e perigosa, já que todo medicamento tem um risco, mesmo aqueles que parecem inofensivos e não exigem prescrição médica para a compra. É comum as pessoas terem em casa uma “farmacinha” particular: a famosa caixinha de remédios, à qual recorrem quando surge uma dor qualquer. Apesar de não ser exclusividade brasileira, a falta de fiscalização e de esclarecimento da população faz do país um dos primeiros na lista do consumo exagerado.
Um dos riscos da automedicação é o mascaramento do quadro clínico e o consequente diagnóstico equivocado ou tardio. Em ambos os casos, há retardo no tratamento correto, o que pode desencadear uma série de complicações. Outros problemas são interação medicamentosa, alergias e dosagem e administração inadequadas – tanto em quantidades baixas, que podem promover a resistência bacteriana, por exemplo, quanto em quantidades altas, que acarretam efeitos colaterais.
“São inúmeras doenças diferentes com tratamentos ainda mais diversos. Assim como a febre, a dor serve como um aviso. Ao tomar o remédio sem ter o diagnóstico correto, pode-se perder um tempo precioso, por vezes fatal”, explica Paulo Pêgo Fernandes, diretor da Associação Paulista de Medicina (APM).
Dor de cabeça, a campeã
Entre os casos de automedicação, a dor de cabeça é a campeã. Por outro lado, a ingestão de analgésicos é o exemplo mais citado quando se fala de problemas. Os relatos envolvem desde o mascaramento de sintomas até o aparecimento de úlceras e hemorragias. A cefaleia pode ser consequência de tensão, jejum, hipoglicemia, hipertensão, aneurisma cerebral, início de meningite ou uma tendência à enxaqueca, entre várias outras.
Há alguns anos, a semelhança dos sintomas da dengue e da gripe comum trouxe à tona o risco de tomar remédio sem orientação médica. Isso porque o ácido acetilsalicílico, presente na maior parte dos antigripais, reduz a agregação das plaquetas. Quando tomado em quantidades de moderadas a grandes, o AAS pode provocar hemorragias, mesmo em pessoas saudáveis. No quadro da dengue, a ingestão do medicamento acelera a perda sanguínea.
Um antigo diretor da Sociedade Brasileira de Toxicologia, Ernani Pinto, lembra a periculosidade de medicamentos de tarja preta ou vermelha, que, “apesar de lícitos, podem causar dependências ou graves efeitos colaterais, levando até mesmo à morte”. Ele cita o risco de interações, como aconteceu com o cantor Michael Jackson.
Até substâncias fitoterápicas, se usadas de forma errada, podem ser prejudiciais. É o caso do Hipérico, base da Erva de São João. Segundo o médico Anthony Wong, do Hospital das Clínicas, embora seja um ótimo antidepressivo natural, diminui os efeitos de anticoncepcionais e anti-HIV, além de cortar em até 60% a atuação de drogas para diminuição da rejeição de órgãos.
Idosos e alérgicos são mais vulneráveis
Isso ocorre por conta da alta quantidade de remédios que já usam normalmente, facilitando a interação medicamentosa, e do estado debilitado do organismo. “A ingestão de um comprimido com alta dose de AAS por alguém que toma remédio para se recuperar de uma cirurgia cardíaca pode causar uma úlcera gástrica, que não coagula por causa do medicamento; isso é bastante comum em idosos que têm dores nas articulações”, descreve Anthony Wong. Também é frequente o uso de antigripal associado a spray para o nariz. Os dois remédios são vasoconstritores. Em uma pessoa de idade, que apresenta deficiência de fluxo sanguíneo no cérebro, pode desencadear um AVC.
Alergia a algum dos princípios ativos reforça o rol de perigos. Existem antibióticos que têm como base a penicilina. Uma pessoa alérgica, ao tomar um desses remédios, pode morrer vítima de choque anafilático. Até a dipirona, princípio ativo da novalgina, um dos analgésicos mais utilizados, pode causar choque em quem é alérgico ao produto.
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