TV em Transe

Justiceira das mil e uma noites

12/02/2014Christian Moreno
Justiceira das mil e uma noites | Jornal da Orla
Quem acompanha este espaço sabe que há tempos venho chamando a atenção para as intervenções da jornalista Rachel Sheherazade no “Jornal do SBT”. Pois finalmente ela conseguiu repercussão para seus comentários, que não raro denotam desinformação, populismo e preconceito.
 
Sua posição foi “compreensível” aos justiceiros que atuam no Rio, após um numeroso grupo espancar e deixar um menor infrator de 15 anos preso a um poste, completamente nu. Ele, que vive num abrigo da prefeitura do Rio, tem três passagens pela polícia por furto. 
 
Rachel, com seu costumeiro ar superior de quem emite verdades absolutas, definiu a ação dos “vingadores” contra o “marginalzinho” de “legítima defesa coletiva”. E lançou uma campanha àqueles que desaprovaram o ato: “Faça um favor ao Brasil: adote um bandido”.
 
As reações negativas ao comentário – inclusive com nota oficial do Sindicato dos Jornalistas do Rio – fez com que ela passasse pelo constrangimento de ter de se explicar no mesmo “Jornal do SBT”. “Sou uma pessoa do bem… Jamais defenderia a violência”, alegou. “Isso tá na lei, todo cidadão tem o direito de prender um meliante flagrado em delito”.

O que não diz respeito ao caso em questão, pois no momento da abordagem o menor não cometia crime algum. Foi “escolhido” pelos “justiceiros” (jovens de classe média da zona sul, como mostrou o “Fantástico” de domingo passado) e ponto.
 

Em entrevistas posteriores, Sheherazade também baseou sua defesa invocando a “liberdade de expressão”, como se tivesse o direito de falar o que bem entende em rede nacional sem se importar com as consequências e responsabilidade fosse um item dispensável em sua função. 
 
A jornalista se diz uma pessoa “da paz”, mas seu comentário acirrou ânimos e disseminou ódio. A ponto de a professora universitária Cilene Victor da Silva ter sofrido ataques em redes sociais e ameaças por telefone simplesmente por ter criticado a âncora do SBT durante uma participação no “Jornal da Cultura”. 
 
Pois é, Rachel Sheherazade, torço para que um dia você aprenda a diferença entre liberdade e libertinagem.

Debate pobre – Na internet, as reações positivas e negativas aos comentários da jornalista mostram como o debate anda pobre e limitado. Hoje em dia, seja qual for o assunto, parece que tudo tem que pender para  um polarizado embate ideológico. Temos os “reaças da direita raivosa” contra os “petralhas comunas”. Não há meio termo. Posições divergentes são vitais pra enriquecer um debate, mas não é o que vemos aqui. Discussões são raras, pois os dois lados preferem partir para a ofensa e a desqualificação. Às vezes, chegam a extremos, como na questão das ameaças contra a professora Cilene Victor.
 
Violência – E extremos levam a que lugar? Normalmente, só conduzem a caminhos perigosos, como o da violência. O extremismo irresponsável de um manifestante com um morteiro matou o cinegrafista Santiago Andrade, da Band. Manifestações que também fizeram vítimas ano passado, incluindo outro jornalista, Sérgio Andrade Silva. Fotógrafo da Folha de S. Paulo, ele ficou cego de um olho após ser atingido por uma bala de borracha. Na ocasião, o comandante da PM paulista, Benedito Roberto, classificou o ocorrido como “riscos da profissão”.  Curiosamente, foi incrível o esforço da parte da mídia, em especial da Rede Globo, para provar que a polícia do Rio não teve ligação com a morte do cinegrafista. De fato, não teve. Mas como diz o ditado, “quem faz a fama…”. Falando nisso, cadê o Amarildo?