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Ela faz o bem, vê a quem e se apoia no empreendedorismo social para sobreviver

08/03/2025 Addriana Cutino
Ela faz o bem, vê a quem e se apoia no empreendedorismo social para sobreviver | Jornal da Orla

No final dos anos 90, eu conheci uma mulher de olhar carinhoso quando fui repórter de uma tv corporativa do pólo industrial de Cubatão – a TV Cosipa. Na época, início da minha carreira como jornalista, ela me fez acreditar o quanto há pessoas boas no mundo e me ensinou o significado da maternidade além do ventre, ao cuidar de meninas e meninos que não gerou mas recebia com os braços abertos pra doar AMOR.

Elizabeth Rovai, a quem eu chamo de Bethinha, é uma ex-cosipana apaixonada por crianças. Há quase meio século, ela recebe na Casa Vó Benedita menores vítimas de violência doméstica, maus tratos e abandono. Milhares já passaram pelo abrigo que surgiu numa casa simples de uma senhorinha que deu nome à instituição. Beth conheceu quando a visitou com uma prima no final da década de 70. “A vó cuidava de crianças de mães que trabalhavam à noite. Mas algumas não voltavam pra pegar seus filhos e a crianças acabavam ficando na casa. O abrigo começou assim. Na época não havia o ECA, o Estatuto da Criança e do Adolescente.”, ela conta. Dona Benedita de Oliveira faleceu em 1984. Mas sabe como a instituição foi oficializada e por que esta história tem tudo a ver com o empreendedorismo?

Casa Vó Benedita
Beth Rovai foi contratada pela siderúrgica em agosto de 1973 como técnica de processamento de compras. Quatro anos depois, ela decidiu convidar amigos do trabalho para uma ação social. O objetivo era organizar uma festa de Natal para as crianças que vó Benedita cuidava. A partir dali, Beth passou a ser voluntária e nunca mais largou o trabalho social. Com a morte de dona Benedita, Bethinha se juntou à amigos.

“Havia um médico chamado dr. Azevedo. Ele cuidava da saúde das crianças, fez uma reunião e perguntou o que a gente achava de fazer a Vó Benedita existir oficialmente e não oficiosamente. Eu, meu marido e amigos do trabalho decidimos cuidar de toda a papelada e assim surgiu a instituição.”

Empreendedorismo social
Foram milhares de histórias tristes e cruéis. Beth, aos 73 anos, desdobra-se pra levar comida, saúde, moradia, vestimenta e dignidade à dezenas de crianças mensalmente. “Eu costumo dizer que a minha vida se divide em duas vertentes: minha família e a Casa Vó Benedita com suas crianças, que me completa. A gente troca amor. Só quem passa e é voluntário da casa sabe disto. Fazemos tudo por estas crianças como se fossem nossos filhos.”

Vó Benedita morava numa casa na Rua Bittencourt. Depois do falecimento, Beth e amigos começaram a procurar outro imóvel. Com a ajude de cinco casais, após um empréstimo bancário, adquiriram o imóvel da Rua Carlos Caldeira,686, no bairro Santa Maria, na Zona Noroeste.

“A gente foi fazendo reformas. A casa chegou a ter 75 crianças. Elas chegavam com marcas de cigarro. Os pais apagavam na própria pele dos filhos. Os conselheiros levavam de madrugada e finais de semana. Eram tantas que o mesmo berço era compartilhado por até três crianças. A gente espalhava colchões no chão porque não tinha cama pra todo mundo. Mas eram todas tratadas com dignidade, limpas, alimentadas.”, lembra Beth.

Para manter a casa, Bethinha aposta no Empreendedorismo Social. “Desde que estou lá a sobrevivência e sustentabilidade são nosso foco. A vida inteira foi de dificuldades. Em muitas portas eu bati. Já houve épocas que eu tinha apenas cinco quilos de arroz numa despensa. Por isso, realizamos um evento por mês, temos o bazar permanente na Rua Conselheiro Nébias, 126, além do Feirão na Zona Noroeste.”

No próximo dia 16, a Casa Vó Benedita realiza o Bazar Beneficente, com roupas em ótimo estado e a preços acessíveis, no Salão de Mármore do Santos Futebol Clube. “Os eventos são nosso meio de sobrevivência. A gente recebe as doações e vende as peças doadas. Muita gente acha que a Prefeitura sustenta a casa, mas não. Apenas temos um convênio através de um Termo de Cooperação, insuficiente pra nós.”, explica.

A Casa Vó Benedita tem quarenta voluntários, duas unidades na Zona Noroeste, além da creche noturna na Rua Uruguai,11, que ajuda muitas mães que precisam estudar ou trabalhar à noite. “Se esta casa existe, eu agradeço à Deus e a Vó Benedita, que também deve estar olhando por nós.”, desabafa Beth. No Dia Internacional da Mulher ela merece muitos aplausos. Sou sua fã, Beth Rovai. Obrigada por cuidar na nossa infância.