Política

Revisão do Código de Posturas de Santos pode ser agilizada

03/02/2025Marcos.Augusto
Foto Prefeitura de Santos

A atualização do Código de Posturas de Santos, que começa a ser estudada pela administração municipal, pode ganhar tempo e agilidade se a comissão nomeada pelo prefeito Rogério Santos aproveitar os estudos realizados há dez anos.

“Fizemos cerca de 80% da lição de casa, mas não chegamos ao final porque, ao mesmo tempo, tivemos que lutar pela revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo na Área Insular, um grande tiroteio com o setor imobiliário”, afirma o arquiteto e urbanista José Marques Carriço. Servidor aposentado, Carriço coordenou, entre 2015 e 2016 (gestão Paulo Alexandre Barbosa), a comissão interna encarregada de revisar o Código de Posturas. “Na época, a questão mais polêmica era a do Plano de Paisagem Urbana, que deveria ser parte do Código, mas estava tramitando separadamente na Câmara. Nosso trabalho foi engavetado.”

O Código de Posturas é um conjunto de leis que ordenam o convívio nas cidades. O código vigente (lei 3.531) é de abril de 1968, sancionada pelo então prefeito interventor Silvio Fernandes Lopes, indicado pelos militares. A lei sofreu modificações – alguns dos 640 artigos foram revogados ou substituídos ao longo dos anos –, mas a base ainda é a mesma.

Há coisas como: “As leiterias deverão ter balcões com tampo de mármore, aço inoxidável ou material equivalente” (art. 82); Nos estabelecimentos ou locais em que se fabricam, preparam, beneficiam, acondicionam, distribuem ou vendem gêneros alimentícios, é proibido depositar ou vender substâncias que sirvam para falsificação destes gêneros (art. 85); Os campos esportivos deverão ser, obrigatoriamente, gramados ou ensaibrados, bem como adequadamente drenados (art. 128); Os clubes esportivos amadores são obrigados a cumprir o calendário esportivo anual organizado pela Comissão Central de Esportes, o regimento e as determinações dessa Comissão e as determinações do departamento estadual competente (art. 215); Nas praias, é proibido usar boias pneumáticas, instalar qualquer dispositivo fixo para abrigo ou para qualquer outro fim (art. 219).

A comissão constituída pelo prefeito (decreto publicado no Diário Oficial, em 14 de janeiro) reúne representantes de cinco secretarias municipais: Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Sustentabilidade, Obras e Edificações, Segurança, Prefeituras Regionais, Finanças e Gestão, além de representantes do Gabinete. Não há informações sobre cronograma de trabalho. Procurada, a assessoria de imprensa da Prefeitura respondeu que “não será possível a realização de entrevista com os técnicos da referida comissão”.

Carriço diz que a modernização é necessária e que essa primeira fase precisa, mesmo, ficar concentrada nos setores técnicos da administração. “É uma lei enorme e há uma parte do trabalho que é mais técnica e precisa ser feita internamente, por técnicos das diferentes áreas. Depois, a proposta vai para discussão pública, até ser analisada e votada pela Câmara, que conta, inclusive, com comissões permanentes para debater o assunto”.

Códigos ajudaram a ´oficializar` segregação racial

Por lei de 1828, as Câmaras eram consideradas órgãos administrativos, cuja elaboração das regras de posturas constituía-se na sua mais importante atribuição. Os Códigos de Posturas têm a função de garantir o ordenamento da vida nas cidades, mas podem, também, aprofundar desigualdades e exclusões.

Em Santos, o primeiro conjunto dessas normas é de 1847 e incluía normas que reforçavam para a segregação racial, mantidas em 1857, 1870 e em 1883, quando as proibições diminuíram, pois os movimentos abolicionistas haviam se intensificado.

Havia artigos, por exemplo, que proibiam “as casas de batuque, vulgarmente chamadas zungus, e bem assim os ajuntamentos de escravos nas ruas e praças da cidade” – os donos das casas e os escravos poderiam ser punidos com dois dias de prisão.

Outro que reforçava a proibição aos “ajuntamentos de grande número de escravos” nas ruas ou praças, atitude que só seria permitida nos dias festivos para negros e negras, “para o fim de dançarem, ou tocarem, conservando a devida decência e precedendo a respectiva licença do presidente da Câmara”.

Interessante, também, os artigos que determinavam que os moradores das ruas onde ocorressem incêndio, se possuíssem escravos ou criados teriam de mandá-los levar água às autoridades que estivessem conduzindo os trabalhos para extinção do fogo.

Em uma nota na edição da Revista Commercial, de 27 de julho de 1872, por exemplo, um colaborador anônimo reclamava do fato de diversas vendas na cidade estarem “consentindo reunião de escravos à noite, fazendo ainda extraordinária algazarra”. Para justificar a denúncia, citava o artigo 56 do Código de Posturas, que declarava que os “donos, ou caixeiros de armazém ou taverna, não consentirão que os escravos ali se demorem por mais tempo do que o necessário para as compras”. Para os infratores, estava previsto multa. Porém, o queixoso alegava que ninguém olhava para a questão: “A moralidade pública exige providencias e nós aguardamos o resultado delas”.