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Entre quatro paredes

11/09/2024
Entre quatro paredes | Jornal da Orla

O inferno de Sartre

Costuma-se atribuir a Dante Alighieri a concepção mais ou menos universal do inferno. É na Divina Comédia – sua obra-prima – que o inferno recebe as notas que habitam o imaginário de quase todo o mundo: um lugar quente, cheio de dor e lamentação, comandado por Lúcifer e povoado por pessoas que morreram em pecado. Esse mítico lugar, com todo o seu apelo e terror, é explorado pelos mais diversos canais culturais humanos: nas religiões, nas pinturas (o quadro de Botticelli, que ilustra esta coluna, é um exemplo), nas músicas (da ópera ao heavy metal), também em produções cinematográficas e, claro, na literatura.

Jean-Paul Sartre deu sua riquíssima contribuição para o temário infernal. Sua cultuada peça Entre quatro paredes, construída em um único ato, traz o inferno moderno de Sartre: um obscuro criado conduz, através de sombrios corredores, três pessoas mortas em pecado. Elas são alojadas num quarto. Não há quase nada nele, senão três camas e alguns objetos. Não podem dormir – sequer piscar é possível-, não há livros, não há janelas. Somente a companhia de estranhos e da própria consciência. Para sempre.

O leitor possivelmente concluirá que o inferno de Sartre é um dos modelos mais terríveis já imaginados.

Motivos para ler:

1- Jean-Paul Sartre (1905-1980), filósofo existencialista e escritor francês, é considerado um dos grandes pensadores do século XX. Serviu nas fileiras do exército francês na 2ª Guerra e chegou a ser preso e enviado a um campo de concentração, do qual escapou. Coerente com sua posição filosófica, recusou o Prêmio Nobel de Literatura de 1964 por menosprezar distinções oficiais;

2- Nada de enxofre, fornalhas, torturas físicas, demônios ou qualquer coisa que o valha. O inferno de Sartre é um labirinto de corredores que desembocam em quartos habitados por poucas pessoas que lá ficarão para a eternidade. O inferno será a lucidez infinita, sem qualquer pausa. Original e desesperador;

3- É nesta peça que o leitor encontrará, devidamente contextualizada, uma das mais populares expressões da literatura: “o inferno são os Outros”.

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