Os estudantes brasileiros, principalmente do ensino fundamental, estão vivendo uma experiência desigual na história, por causa da pandemia da Covid-19. O Brasil foi o país que mais tempo ficou sem aulas presenciais no ensinos infantil e fundamental, com base em estudos feitos pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), entidade que reúne 35 países membros, com as economias mais avançadas do mundo, que se dedicam a promover o desenvolvimento econômico e o bem-estar social.
Uma pesquisa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em outubro de 2021, mostra que os impactos no desenvolvimento e bem-estar das crianças na pré-escola, por exemplo, registraram perdas equivalentes a quatro meses nos filhos de famílias com maior poder econômico, enquanto os mais pobres chegaram a seis meses. Nesse trabalho foram comparadas as rotinas das crianças em 2019 e em 2020.
Ainda não há dados oficiais sobre as consequências do fechamento prolongado das escolas ou da percepção do ensino remoto, mas conforme os estudos – como os da Fundação Getúlio Vargas para a Fundação Lemann – que vem sendo divulgados nos meios de comunicação com credibilidade, o desafio nacional ficou ainda maior: enquanto no mundo a média do atraso na educação é estimada de três a nove meses, no Brasil pode ser de até 4 anos.
Em nosso país, historicamente desigual, constatação que para muitos é apenas um discurso político, esse cenário de desigualdade se tornou ainda mais grave com a pandemia. Nas pesquisas realizadas, por exemplo, indicam que 11,2% dos estudantes que diziam estar frequentando a escola em 2020 não haviam recebido nenhuma atividade escolar e não estavam em férias.
Assim, os dados comprovam que o mesmo perfil de estudantes que já sofriam com a cultura do fracasso escolar não conseguiu se manter aprendendo com as escolas fechadas, reforçando a necessidade desse enfrentamento por parte dos responsáveis pela Educação. Com a volta às aulas presenciais, seguindo os protocolos de segurança, como máscaras, uso de álcool e a necessidade da apresentação do comprovante da vacinação contra a Covid-19, é impossível desconsiderar o espírito de recomeço, inclusive com a mesma realidade vivida antes da interrupção das aulas.
Para pensar e empreender nessa reação, por um plano de recuperação do aprendizado, é preciso ter em mente alguns fatores que fizeram avançar o financiamento da Educação pública, desde a obrigação dos governos (municipais, estaduais e federal) investirem 25% dos seus orçamentos em Educação (Constituição de 1988) e a criação do FUNDEF (agora FUNDEB) em 1997.
Mas o Ministério da Educação – MEC não cumpriu o seu papel nesse período, como coordenador nacional de políticas públicas para o setor, deixando que Estados e Municípios atuassem por conta própria desde a suspensão das aulas presenciais no início da pandemia. Esperava-se do MEC ações mais rápidas e mitigadoras, principalmente em relação aos municípios menores, que dispõem de recursos também muito ínfimos para o atendimento aos seus estudantes.
Sem falar nas questões que ficaram ainda mais evidentes com a experiência do ensino remoto, dada a falta de uma política nacional de conectividade e do veto presidencial ao projeto de lei que previa internet gratuita para os estudantes e professores da rede pública em todo o país, em março de 2021. No mês de junho o veto foi derrubado pelo Congresso Nacional, mas o governo federal tentou suspender os efeitos no Supremo Tribunal Federal – STF, colaborando para o atraso maior do atendimento dessa necessidade para a Educação.
E até o momento o Ministério da Educação não apresentou ações ou políticas públicas para tentar minimizar os impactos da ausência de escola na vida de nossas crianças. Mas, no início da semana, o mesmo ministério não pensou duas vezes em anunciar o reajuste do piso salarial dos professores, passando de R$ 2.886,24 para R$ 3.845,63, como uma medida generosa do governo que não é responsável pelo pagamento desses salários, que cabem mais uma vez aos Estados e Municípios.
Também cabe ao Poder Público garantir que as instalações das escolas estejam em condições de receber os alunos nessa volta às aulas presenciais, sem riscos gerais, como se observam em muitas delas nos últimos tempos: janelas quebradas, ladrilhos e pisos rachados, iluminação e telhados deficientes, vazamentos nos bebedouros, pias e banheiros etc. Contudo, o retrato em muitas dessas unidades é desolador: sem uma política de manutenção e conservação dos prédios e das suas instalações, muitas prefeituras não conseguem agora responder a essas necessidades cruciais.
Há sempre muita controvérsia quando se busca no Brasil as razões e as soluções para reverter o atraso em sua política educacional. Não podemos esquecer que lidamos com vários brasis dentro de um país desigual, cuja dívida social se torna impagável também pela descontinuidade de políticas públicas bem sucedidas. Creio que hoje temos um desafio bem maior, materializado pela paralisia na Educação, que já condenou milhares de crianças, adolescentes e jovens à ignorância: um pacto nacional pela recuperação educacional do Brasil!
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