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Dica da semana: Pieces of a Woman

09/01/2021
Dica da semana: Pieces of a Woman | Jornal da Orla

Como lidar com o luto? De qualquer forma que seja vivida, seja internalizando a dor ou por vezes explodindo, praticamente todos sucumbem a ela. Na história do cinema, há diversos filmes que abordam a perda de um filho sob o olhar dos pais, mas poucos se aventuraram ao observar o ato de uma tragédia sem precedentes combinando a magia de um momento único com o impacto e espanto dessa perda. Pieces of a Woman faz exatamente isso, transportando o público para uma jornada emocionante que lida com questões delicadas como amor, maternidade, tristeza e luto.

Pieces of a Woman é a jornada emocional de uma mãe que acaba de perder seu bebê. Diante dessa perda, ela terá que lidar com as conseqüências que seu luto tem nas relações com o marido e a mãe, lutando para que seu mundo não desabe por completo. O filme é dirigido pelo húngaro Kornél Mundruczó, que trabalha com a câmera de uma forma que faz com que o espectador esteja junto com os personagens de um modo tão íntimo, que às vezes se torna desconfortável (no bom sentido da palavra). A primeira meia hora desse filme é um soco no estômago do público e somos levados pelo diretor para talvez a cena de parto mais visceral da história do cinema. Em um longo plano sequencia de quase 30 minutos, testemunhamos literalmente todas as dores de um parto, com a câmera navegando por entre os cômodos da casa colocando a audiência como parte daquele ambiente e mergulhando de modo profundo, para as emoções sentidas especialmente pela mãe: surpresa, medo, dor, ansiedade e calmaria. 

O roteiro, escrito por Kata Wéber, mostra com uma voracidade desconcertante, como nossa vida pode mudar em uma fração de segundos por consequência de atitudes mal pensadas. O texto consegue desenvolver bem a química e dinâmica de seu casal de protagonistas, que após a tragédia torna-se cada vez mais degradante diante da ausência de empatia por parte do parceiro. O roteiro também retrata Martha sofrendo boa parte do tempo em silêncio, como se a personagem se apagasse diante das pessoas a sua volta, culminando na ótima cena na sala de estar de sua mãe. Tudo é muito bem construído e de forma genuína, seja expondo o vazio que fica em um corpo que não teve a mínima idéia de se preparar para ficar sozinho ou na possibilidade de obter justiça pelo que aconteceu. O roteiro acaba dando uma escorregada na figura da promotora do caso, que possui um arco raso e desnecessário à trama e pelo seu final apressado, que não chega aos pés do majestoso primeiro ato do filme.

O filme tem em seus atores sua maior força, conseguindo combinar de forma hipnotizante, dois atores totalmente distintos mas que se completam de forma maestral. Shia LaBeouf mais uma vez comprova seu brilhantismo na frente das câmeras com um personagem explosivo e inconsequente ao passo que Ellen Burstyn tem um dos melhores monólogos do filme como a mãe protetora e com boas intenções, mas sem saber demonstrar da melhor forma. Mas o filme pertence a atriz Vanessa Kirby, que está incrível no papel sendo a força que conduz a trama e a história. Sem a sua presença, talvez o filme fosse outra coisa e que aqui faz toda a diferença sendo uma das prováveis candidatas ao Oscar de melhor atriz.

Pieces Of a Woman é uma intensa e insustentável avalanche de sensações do começo ao fim. É um filme forte mas ao tempo bonito e singelo que vai mexer com os sentimentos do público, seja pelas fortes atuações do elenco como também do olhar de cada espectador para o filme e para a própria vida.

 

Curiosidades: Festival de Veneza 2020: premiado como Melhor Filme (Arca CinemaGiovani) e Atriz (Copa Volpi para Vanessa Kirby);