A comunidade santista se mobilizou na quinta-feira (26) para comemorar o aniversário da cidade. A “data de aniversário” foi estabelecida por meio de uma solução criativa, que uniu o ano da fundação da Vila de Santos e o dia da elevação da vila à categoria de cidade.
Foi em 1996 que o então prefeito, David Capistrano Filho, percebeu que a história de Santos se iniciava muito antes e não seria correto comemorar apenas o 157º aniversário da cidade.
“Não se tem a data exata porque não há documentação. Mas estima-se, através de documentações de foro de sesmarias, que até novembro 1545 se usava Povoado de Engaguaçu. Depois, não se tem nenhum outro documento. Só em novembro de 1546 aparecem registros da Vila de Santos. Então, deduz-se que neste intervalo ocorreu a elevação à categoria de vila”, explica o diretor técnico da Fundação Arquivo e Memória de Santos, o jornalista e historiador Sérgio Willians.
A ocupação do espaço onde hoje é a cidade se Santos começou bem antes de 1545. Historiadores estimam que ocorreu por volta de 1502, dois anos após a esquadra de Pedro Álvares Cabral chegar ao litoral da Bahia, na região de Santa Cruz Cabrália -episódio que os livros de história classificam como Descobrimento do Brasil.
Cabral percebeu que a terra descoberta era bem mais que uma ilha e enviou uma das embarcações de volta a Portugal. Em seguida, seguiu em sua missão original, rumo a África e em seguida no Caminho para as Índias.
Em Portugal, ao receber o relato sobre a nova descoberta, o rei Dom Manuel imediatamente organizou uma expedição, sobre o comando de Gonçalo Coelho e com Américo Vespúcio, notável navegador cujo nome inspirou o batismo do continente.
Estima-se que Gonçalo Coelho chegou à costa brasileira em 1501 e foi instalando marcos de posse (espécies de poste com o brasão de Portugal, para avisar que aquela terra já tinha sido “descoberta” e, portanto, dono). O primeiro foi colocado na região hoje denominada, não por acaso, Praia do Marco, em São Miguel do Gostoso, Rio Grande do Norte -hoje, este marco de posse está no Forte dos Reis Magos, em Natal.
O explorador instalou outros dois marcos, um onde hoje é a Praia do Farol, em Salvador (BA) e outro na Ilha do Cardoso, em Cananeia (SP). Pelo caminho, Gonçalo Coelho foi deixando degradados, isto é, presos pela Corte Portuguesa cuja pena era ser deixado à própria sorte para morrer de fome ou devorado por índios canibais.
Personagem decisivo
Um destes presos era Cosme Fernandes, um judeu muito culto, graduado em faculdade e, por isso, chamado de bacharel. Há outra versão de que o termo é uma derivação de bachiller, que, no castelhado da época, significava “tagarela”, “hábil falastrão”, “alguém com o dom da oratória”.
Deixado em Cananeia, Cosme Fernandes fez, do limão, uma limonada. Não só não foi morto pelos índios tupiniquins que habitavam a região como se aliou a eles, ganhou sua confiança e estabeleceu no local um entreposto de abastecimento para embarcações. Diferente do que muitos imaginam, o tráfego de embarcações nas Américas era intenso, diante das notícias que haveria um Eldorado (cidades repletas de ouro) no Novo Continente. Eram, principalmente, naus espanholas, mas havia também barcos corsários a serviço da Inglaterra.
Em Cananeia, o Bacharel se fez rei. Extremamente violento, Cosme percebeu que o terror era o meio mais eficaz para subjugar os nativos. Possuía várias mulheres, mais de 200 escravos e milhares de guerreiros sob seu comando.
Por volta de 1510, diante das notícias de que havia um local mais apropriado para suas atividades, um pouco mais ao norte, invadiu e assumiu o controle da feitoria portuguesa de São Vicente. Ergueu um forte, construiu um estaleiro na região onde hoje é o Japuí (Porto das Naus) e instalou um porto, na Ponta da Praia.
Apesar de boa para abrigar um porto (águas calmas e profundas), a região da Ponta da Praia não era propícia para se morar. O Bacharel, então organizou um povoado no local onde hoje é São Vicente. Em 1516, o lugar tinha ruas organizadas, comércio variado, era bom fornecedor de escravos e suprimentos para os europeus que se dirigiam ao Rio da Prata.
Foi esta prosperidade que fez o rei de Portugal enviar uma esquadra comandada por Martim Afonso de Souza para acabar com o poder de Cosme Fernandes. O que de fato ocorreu: Cosme foi expulso e voltou a se refugiar em Cananeia.
Os domínios de Cosme foram divididos em sesmarias e entregues a empreendedores. Uma delas coube a Braz Cubas, que montou um engenho de cana-de-açúcar na chamada região do Engaguaçu, cortada por três rios: Itororó, São Jerônimo e Nossa Senhora do Desterro. O local, onde hoje é o Outeiro de Santa Catarina, passou a se desenvolver mais do que a Vila de São Vicente. Para completar, um maremoto arrasou São Vicente e seus moradores migraram para o Engaguaçu.
Braz Cubas transferiu o porto da Ponta da Praia para a região do centro e montou um pequeno hospital, batizando-o como Santa Casa de Misericórdia de Todos os Santos. O local se desenvolveu e, numa data imprecisa entre novembro de 1545 e o mesmo mês do ano seguinte, Braz Cubas criou a Vila de Santos. O resto é história.