No dia 2 de agosto de 1962, Tom Jobim e Vinícius de Moraes apresentaram ao público, no Restaurante Au Bon Gourmet, em Copacabana, pela primeira vez, a música “Garota de Ipanema”, que se tornou uma das mais gravadas e executadas de todos os tempos.
Naquela noite memorável, se apresentaram, além de Tom e Vinícius, João Gilberto e Os Cariocas, interpretando várias músicas inéditas: “Só Danço Samba”, “Samba de Uma Nota Só”, “Corcovado”, “Samba da Bênção”, “Amor em Paz”, “Samba do Avião”, “O Astronauta”, “Samba da Minha Terra” e “Insensatez”. Foi a primeira e a última vez que esse time se reuniu. E, este encontro marcou uma página muito importante da história da Bossa Nova. Não faltou inspiração a esta dupla especial. E curiosamente, antes de ter a letra, a melodia, que Tom tinha feito, recebeu o nome de “Menina que Passa”.
A inspiração para a composição da música virou lenda e ganhou inúmeras versões. A mais conhecida dizia que Tom e Vinícius sempre se reuniam para conversar e compor numa mesa de bar, no Bairro de Ipanema, no antigo Bar Veloso, hoje Bar Garota de Ipanema, na esquina da Rua Montenegro, hoje Rua Vinícius de Moraes, e por ali sempre passava uma moça muito bonita, de olhos verdes, cabelos longos, 1,73 metro de altura, indo sempre em direção à praia, encantando a todos. Seu nome, Helô Pinheiro, cheia de vida, charme, beleza e vitalidade.
A tal mesa de bar existe de verdade e está lá até hoje e você pode visitar o local e ter o grande prazer de se sentar nela, assim como eles sempre faziam. Ao fundo, na parede, a partitura original ampliada e assinada pela dupla, criando todo o clima. Eu já experimentei fazer isso e posso garantir que vale muito a pena. E não se esqueça de brindar, degustando um chope bem gelado. O ritual, seguido desta forma, fica perfeito e homenageia seus criadores e a sua bela homenageada.
O primeiro cantor que a gravou foi o Pery Ribeiro, no ano de 1963, no disco “Pery é Todo Bossa”, mas foi a gravação feita em 1964, no disco “Getz/ Gilberto”, do saxofonista Stan Getz e do violonista João Gilberto, e por puro acaso, teve a voz de Astrud Gilberto, sua mulher na época, que nunca havia gravado até então, produção de Creed Taylor para o selo Verve, que a música ganhou o mundo, definitivamente.
Na bagagem, esta histórica gravação recebeu 4 prêmios Grammy. Depois, vieram as gravações de Frank Sinatra, Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan, Diana Krall e mais de 200 versões. Simplesmente a segunda música mais tocada em todo mundo, perdendo apenas para “Yesterday”, dos Beatles.
O compositor Tom Jobim e o poeta Vinícius de Moraes nunca imaginaram que esta música ganharia tanta notoriedade. Virou um hino que retratou o que de melhor aconteceu na fase áurea de Bossa Nova, atravessando décadas, mostrando a todos nós como uma música pode ser jovem e atual, depois de passados tantos anos, de inúmeras regravações e versões nas mais diversas línguas.
A tal música “Garota de Ipanema” nos foi apresentada 54 anos atrás e, somente ela, continua aquela menina que vem e que passa, linda, inspiradora, eterna e a caminho do mar.
“Kenny Barron & The Brazilian Knights”
Se você quer escutar um CD repleto de lirismo e ternura, executado pelas mãos de um dos maiores pianistas da história do Jazz, ainda em plena atividade, recomendo este lançamento de 2013 do selo Sunnyside. E, mais, com a mágica mistura entre o Jazz e a Bossa Nova, numa sinergia surpreendente. Como é prazeroso ouvir a levada do “Samba Jazz”.
Kenny Barron já havia experimentado algo semelhante no ano de 1963 e por algumas outras vezes na carreira e sempre teve a referência da sonoridade da música brasileira no seu repertório. Na sua carreira acompanhou os maiores nomes do Jazz, como Dizzy Gillespie, Stan Getz, Ron Carter, Ella Fitzgerald, Freddie Hubbard, Elvin Jones entre outros.
Duas curiosidades importantes: o disco foi gravado integralmente no Rio de Janeiro no mês de junho de 2012, quando da última visita do pianista ao nosso país e trouxe, no repertório, composições próprias, de Johnny Alf, Maurício Einhorn, Tom Jobim, Baden Powell e Alberto Chimelli. Na oportunidade, ele comemorou no estúdio os seus 69 anos de idade. E ganhou um belo presente musical.
Ao seu lado, um verdadeiro time de “Cavaleiros Brasileiros”, como ele definiu, formado por Cláudio Roditi no trompete, Idris Boudrioua no sax alto, Lula Galvão na guitarra, Maurício Einhorn na harmônica, Sérgio Barrozo no contrabaixo, Rafael Barata na bateria e Alberto Chimelli nos teclados.
Destaque para “Rapaz de Bem”, “Ilusão a Toa”, “Nós”, “Curta Metragem”, “Triste”, “Tristeza de Nós Dois” e “Sônia Braga”.
É impressionante ver a identificação musical de todos os músicos participantes com o repertório escolhido, de uma forma intensa e muito especial.
O estilo de tocar do Professor Kenny Barron (desde 2001 na famosa Juilliard School Of Music de NY) é emocionante. E o produtor do disco, Jacques Mayall, com absoluta felicidade, recomenda que o CD seja degustado sem nenhuma moderação.
Arismar do Espírito Santo & Leonardo Amuedo – “Essa Maré – 11 temas de Ivan Lins”
Você vai se surpreender ao ouvir as composições de Ivan Lins, interpretadas pela dupla formada pelo multi-instrumentista Arismar do Espírito Santo, nos violões, contrabaixo e guitarra, e pelo guitarrista uruguaio Leonardo Amuedo.
O CD lançado no ano de 2008, pelo selo Rob Digital, foi idealizado numa canja casual que ambos deram num show no Rio de Janeiro, do genial trompetista Paulinho Trompete.
Desse encontro espontâneo, repleto de improvisos, nasceu uma afinidade musical imediata e inexplicável, que motivou a dupla a levar para o estúdio, alguns dias depois, o clima daquela apresentação.
A atmosfera positiva criada no estúdio foi absurda, pois ambos se superaram a cada faixa do disco.
Gravaram as 11 faixas instrumentais em apenas quatro dias e você vai poder conferir as gravações num clima bem jazzístico. Algo bastante inovador.
Destaque para “Daquilo Que Eu Sei”, “Dinorah, Dinorah”, “Setembro” (originalmente composta para “Antonio e Fernanda”), “Somos Todos Iguais Esta Noite”, “Aos Nossos Filhos”, num timbre inspirado e emocional extraído da guitarra portuguesa de Leonardo Amuedo, a desconhecida faixa título “Essa Maré”, além das também conhecidas “Bilhete” e “Desesperar Jamais”.
O maestro, arranjador, pianista e produtor Gilson Peranzzetta assina a contracapa do CD e sintetiza: “O repertório é lindo, composições do grande Ivan Lins e seus parceiros, músicas com as quais convivi por mais de dez anos e que agora ouço como novas possibilidades harmônicas e rítmicas”.
O resultado do CD é a prova de que a música sempre nos propicia novos caminhos e novas experiências.