Digital Jazz

Leny Andrade – Alma Mia

08/06/2015
Ela é uma das minhas cantoras preferidas. Muitos anos atrás, li algo que me marcou para sempre. Em um dos “flyers” de divulgação de seu show em São Paulo, realizado no Hotel Maksoud Plaza, no mítico “150 Night Club”, que, pelo que me lembro, dizia: “Existem artistas estrelas e estrelas artistas. Leny Andrade é uma constelação de emoções”. Definição perfeita para esta cantora excepcional que tem a honra e o privilégio de levar a Bossa Nova e a língua portuguesa para todos os cantos do planeta. Ela somente se apresenta por aqui e pelos palcos do mundo cantando em português. As exceções ocorrem quando ela interpreta alguns de seus boleros inseparáveis. E por muitos é considerada como a melhor cantora de Jazz do Brasil. Assino embaixo.
 
Sua vitoriosa carreira foi retratada recentemente de forma muito justa, num dos livros da Série Aplauso (que tem vários outros lançamentos), denominado “Alma Mía”, mesmo nome do seu último disco, escrito pela jornalista Regina Ribas e editado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo.
 
Curiosamente, narrada pela própria Leny na primeira pessoa, a biografia vai mostrar muitas facetas de sua personalidade rica e interessante. Segundo a autora, o livro vai “revelar uma mulher verdadeira, intensa, independente e sem papas na língua, tal qual Leny é na vida real e nos palcos”. E, mais, “ela vai se revelando, mostrando a sua trajetória como intérprete, bem como sua evolução como ser humano”. E acrescenta a biógrafa: “Leny é sedutora, como ninguém. É assertiva também. Ela fala de um jeito especial, com aquela voz com que canta. Encantadora!”. Realmente a voz de Leny Andrade é um assunto muito sério. Que voz iluminada que ela tem, sem falar na sua interpretação, sempre muito envolvente e sentida. Pura emoção.
 
Então, vários são os motivos que nos levam a ler todas as cento e vinte e quatro páginas do livro, que nos revelam que os 12 anos de piano clássico, que ela teve quando mais nova, foram fundamentais para a sua formação musical. Talvez por isso, precocemente, aos quinze anos, ela já cantava nos bailes da vida. E chegar ao famoso “Beco das Garrafas”, podendo cantar nas casas mais famosas e musicais no auge da Bossa Nova, foi uma questão de pouco tempo. E depois vieram os shows nos melhores teatros e casas noturnas do Brasil e por todo o mundo.
 
Inclusive, Leny Andrade também previu que iria cantar pelo mundo inteiro. E não foi por acaso o grande sucesso e prestígio que alcançou nos Estados Unidos e no México, países onde ela morou por vários anos. E em vários dos seus shows estiveram na plateia aplaudindo de pé o seu raro talento, os cantores Tony Bennett e Liza Minelli (sua grande amiga) entre tantos outros nomes famosos. Não é preciso dizer mais nada.
 
Outro ponto que merece destaque, no livro, são as fotos que ilustram a obra, todas do seu acervo pessoal, revelando verdadeiras preciosidades. Fotos raras que enriqueceram demasiadamente o livro. E ali você vai poder encontrar vários dos momentos importantes vividos por ela em mais de cinquenta anos de carreira. E você chegará à conclusão de que Leny Andrade é um verdadeiro patrimônio genuinamente nacional, que merece todo a nossa reverência e admiração. Justíssima homenagem a uma de nossas maiores cantoras. Grande e única Leny !
 
 
“Banda Guanabara”
 
 
Ir ao Rio de Janeiro e não visitar no Bairro de Ipanema, a loja de CDs e livros “Toca do Vinícius” do meu querido amigo Carlos Alberto Afonso (grande conhecedor da Bossa Nova), é como ir a Roma e não ir ao Vaticano para ver o Papa. E conversar com ele, ouvindo suas muitas histórias, é algo simplesmente imperdível. Sempre que vou até a Cidade Maravilhosa (sempre maravilhosa), reservo algumas horas para esta visita muito agradável, que considero como o verdadeiro “Templo da Bossa Nova”.
 
Por lá, sempre consigo garimpar algumas raridades.
 
A primeira delas é o CD da Banda Guanabara, formada por Nema Antunes no contrabaixo, Marco Britto nos teclados, Léo Amuedo na guitarra, Teo Lima na bateria e Marcelo Martins nos saxofones.
 
Banda incrível e muito afinada, que tem como padrinho, nada mais nada menos, do que o genial Ivan Lins, que inclusive participou em 2 faixas do disco.
 
E esta turma de feras costuma acompanhá-lo em diversos shows pelo Brasil e pelo mundo afora.
 
Em 2011, eles lançaram o trabalho independente, que leva o nome da banda e que trouxe, no repertório, somente as composições de Ivan Lins e de seus principais parceiros. Grande sacada.
 
Destaco os temas conhecidos “Novo Tempo”, “Velas Içadas”, “Bilhete”, a lindíssima “Setembro” e “Dinorah, Dinorah”. E mais as surpreendentes e desconhecidas “Missing Miles” e “4 X 3”, todas interpretadas com absoluto talento e requinte.
 
A obra musical de Ivan Lins, depois de Tom Jobim, é para mim, uma das mais ricas e inspiradas de todos os tempos. E a releitura de suas músicas, interpretadas por estes músicos de altíssima qualidade (grandes amigos e cúmplices do Ivan), é a mistura certa para um grande disco. Não teve erro. Somente música instrumental da melhor qualidade.
 
 
No Olho da Rua – “Sacopenapã”
 
 
A outra novidade que trouxe da Toca foi definida de forma bem inteligente pelo jornalista e escritor Ruy Castro no seu livro “Rio Bossa Nova”, que assim escreveu: “o nome do conjunto já diz tudo: a rua como palco e o povo, como plateia – mas sendo esse palco o Rio, mais precisamente Ipanema, o prazer está garantido, até para os músicos”. E este grupo carioca, um afinado quarteto de música instrumental, se apresenta, desde o ano de 1997, na beira da praia e por diversos bairros da cidade do Rio de Janeiro, levando a boa música literalmente para o olho da rua.
 
No repertório, composições próprias e as releituras dos grandes temas que vão de Jobim a Villa-Lobos, interpretados com a alma carioca e com a flagrante e deliciosa levada do samba-jazz.
 
Em 2004, lançaram “Sacopenapã” (nome dado pelos indígenas a Lagoa Rodrigo de Freitas) pelo selo independente Ethos Brasil, o terceiro trabalho do grupo, que contou com a presença de Paulo Rego no saxofone, Roberto Alves nos piano e teclados, Xandy Rocha no contrabaixo e Theomar Ferreira na bateria.
 
Merecem ser ouvidas com muito carinho as clássicas e eternas “O Morro Não Tem Vez”, “Insensatez” e “Brigas Nunca Mais” e as composições autorais, “Manhosa”, “Samba No Prato”, “Na Calçada” e “Boudrioua”.
 
Escutei o disco surpreso e, ao final da audição, fiquei maravilhado com o som desta afinada e ativa rapaziada.